A princesa de gelo, de Camilla Lackberg



Ficha técnica
TítuloA princesa de gelo
Autora – Camilla Lackberg
Editora – Oceanos (chancela do grupo LeYa)
Páginas – 400
Datas de leitura – 12 a 16 de junho de 2018

Opinião
Sou novata neste género de literatura. Em mais de trinta anos de leitora li menos de cinco livros policiais ou thrillers, embora se pudesse prever que quem devorou as coleções de Enid Blyton (papei tudinho d’Os Cinco, d’Os Sete, Mistério) e outras semelhantes como os da Patrícia, prosseguisse a sua senda de leitora admiradora de narrativas de mistério e aventuras e evoluísse, em adulta, para uma literatura que privilegiasse esse tipo de características. Porém, isso não sucedeu e apenas este ano, talvez influenciada pelos livros e correspondentes opiniões que vou vendo de booktubers que sigo, tenha posto a hipótese de intervalar leituras mais duras e densas (que são aquelas que habitam na minha estante) com outras mais leves e menos sofridas. Consequentemente já provei uma obra chicklit e decidi, após ter lido e gostado de O bibliotecário de Paris, de Mark Pryor e Marcada para morrer, de Peter James (obras que me foram gentilmente oferecidas pela Clube do Autor), ler algo do mesmo género ou um thriller. Fiz, por isso, uma pequena pesquisa online e, uns dias mais tarde, trouxe da biblioteca o primeiro volume de uma saga nórdica – A princesa de gelo, de Camilla Lackberg.
Erica Falk é uma escritora mediana (até ao momento apenas escreveu biografias) que regressa à sua terra natal após a morte súbita dos seus pais. Contudo, mal tem tempo para tratar da sua dor e luto, já que uma morte bastante misteriosa vem abalroar a pacatez invernal de Fjallbacka. Alex, a sua melhor amiga de infância, com quem Erica perdeu completamente o contacto uns anos mais tarde, é encontrada morta em casa, na sua banheira, com os pulsos cortados, facto este que parece apontar para um suicídio. Contudo, como quase sempre as aparências iludem, e aquilo que parecia ser uma morte que Alex havia provocado em si mesma é na verdade um homicídio com características sombrias e algo inquietantes.
Perante o desenrolar dos acontecimentos, Erica vê no assassinato da sua conhecida uma forma de dar um novo rumo à sua vida profissional e dessa forma pôr de lado as biografias e começar a escrever ficção – uma ficção baseada em factos verídicos, mas uma ficção. Assim sendo, põe um interesse muito evidente em tudo o que possa saber sobre o desenrolar da investigação à morte de Alex e terminará privando de muito perto com várias personagens diretamente ligadas ao caso, entre as quais o investigador da polícia e também amigo de infância Patrik Edstrom. E mais não digo nem quero dizer.
Foi uma leitura bastante agradável e que fluiu muito bem. Criei uma empatia imediata com os protagonistas e nunca perdi o interesse, isto é, fui acumulando informação e tentando a todo o custo desvendar o assassinato, descobrir quem, de facto, tinha estado por detrás do mesmo e porquê o havia levado a cabo. Não fui capaz de o fazer e isso, para mim, revelou-se a parte mais positiva da obra, pois a autora mostrou-se capaz de ir soltando pistas nos momentos certos, moldar uma narrativa atrativa que não se centra exclusivamente na morte de Alex e criar um desenlace bastante surpreendente e credível. Contudo, e aí vem à baila a minha inexperiência neste tipo de leituras, estava à espera de uma narrativa com um ritmo muito mais frenético, com uma carga mais densa e mais sombria, o que, segundo me foi explicado, abunda em thrillers e não tanto em policiais, género este onde se encaixa melhor esta obra de Camilla Lackberg, “a nova Agatha Christie que vem do frio”.
Para concluir ou quase concluir e retomando aquilo que referi no parágrafo anterior, é certo que esta obra tem um tom algo morno, sem o frenesim de que estava à espera e cuja falta me dececionou um pouquinho. Porém e para contrabalançar, está povoada de personagens bem construídas, com pinceladas de cliché, mas mesmo assim, bastante credíveis, a sua narrativa desenvolve-se com consistência e o seu desenlace é surpreendentemente bom. Por isso, não digo que não a uma próxima leitura desta autora nórdica. Sei que, sempre que quiser algo para intervalar e cortar leituras mais sofridas, posso dar uma saltada à biblioteca da terrinha e trazer um novo volume desta saga.
Termino pedindo a quem leia esta opinião e tenha mais conhecimento do que eu acerca de policiais e thrillers apetecíveis que deixe nos comentários sugestões! Agradeço desde já!

NOTA – 7,5/10

Sinopse
De regresso à cidadezinha onde nasceu depois da morte dos pais, a escritora Erica Falk encontra uma comunidade à beira da tragédia. A morte da sua amiga de infância, Alex, é só o princípio do que está para vir.
Com os pulsos cortados e o corpo mergulhado na água congelada da banheira, tudo leva a crer que Alex se suicidou. 
Quando começa a escrever uma evocação da carismática Alex, Erica, que não a via desde a infância, vê-se de repente no centro dos acontecimentos. Ao mesmo tempo, Patrik Hedström, que investiga o caso, começa a perceber que as coisas nem sempre são o que parecem. Mas só quando ambos começam a trabalhar juntos é que vem ao de cima a verdade sobre aquela cidadezinha com um passado profundamente perturbador…

Maratona literária - BookBingo - Leituras ao sol 2



Este ano vou finalmente participar pela primeira vez numa maratona literária – yeeeeee! Já havia visto esta maratona o ano passado, mas por uma ou por outra razão, não me “inscrevi” e agora quero redimir-me dessa falha imperdoável, tentar cumpri-la na íntegra e, sobretudo, feliz fazendo uma das coisas que me dá mais prazer!
Contudo, antes de partilhar convosco as minhas escolhas para cada categoria que compõe a maratona Bookbingo – Leituras ao sol 2, informo-vos das suas regras, pois quero muito contagiar-vos e, quiçá, levar-vos também a participar nela 😊 Esta maratona está a ser organizada pela minha querida Isa, do blogue e canal Jardim de mil histórias (cliquem no nome do blogue para assistirem ao vídeo explicativo da Isa) juntamente com a Patrícia, outra blogger e booktuber. Segundo elas, este desafio decorrerá entre o dia 21 de junho e o dia 23 de setembro e está composto de 16 categorias que preenchem o cartão de bingo que deixarei algures por aqui. Para cada categoria têm que ler pelo menos um livro e poderão fazê-lo em formato físico, e-book ou audiobook. Não poderão usar o mesmo livro para mais do que uma categoria e o objetivo final é completar o cartão, isto é, fazer bingo, mas poderão apenas completar uma linha na horizontal, na vertical ou na diagonal.

Eu, como sou ambiciosa q.b., pretendo completar o cartão e ler dezasseis livros em três meses. Cinco, seis livritos por mês não deverá ser difícil e ainda por cima com um mês de férias e um horário de trabalho que não implica trazer nada para fazer em casa!!! Bom, a primeira coisa que fiz foi anotar no meu caderninho as respetivas categorias e cuscar as minhas estantes em busca de títulos, autores, prémios e capas que se adequassem às mesmas. Não foi uma tarefa muito fácil, mas entre as prateleiras de casa e as da biblioteca, hoje consegui reunir todos os livros e colocá-los nesta pilha deliciosa e de deixar qualquer um de água na boca!
Como sabem, eu resisto – e muito – a abandonar a minha mania de ler os livros por ordem cronológica de chegada às estantes, mas as categorias desta maratona obrigaram-me a pô-la de lado, ou melhor, a não respeitá-la na íntegra… Sendo assim, partilho agora os livros que selecionei, o porquê dessa selecção e ainda acrescento em qual deles estou a dar facadinhas na minha faceta de maníaca cronológica J Bora lá!



1 – Livro que tenha sido lançado no ano em que nasceu
Ora, eu tenho a belíssima idade de 43 aninhos. Nasci em 1975 (ano maravilhoso!) e depois de uma pesquisa online decidi trazer da biblioteca Sem destino, de Imre Kertész, publicado no ano em que vim ao mundo.

2 – Livro cujo título tenha as letras que componham a palavra MAR
O ano passado, em junho, a minha querida colega e compincha blogger e livrólica, Ana Sofia, ofereceu-me vários livros que iria ler muito em breve porque a ordem cronológica ditou que chegasse a junho de 2017 em junho de 2018. Sendo assim, escolhi um dos livros que a Ana me ofereceu para esta categoria – A história de um casamento, de Andrew Sean Greer.

3 – Autor português
Também oferecido pela Ana Sofia. Vou estrear-me nas letras de Jacinto Lucas Pires, com Azul-turquesa.

4 – Livro de um autor cujo nome tenha as tuas iniciais
Nesta categoria, tive que aldrabar um pouquinho, porque não encontrei nas estantes nenhum autor cujo nome tivesse as iniciais “A” de Ana e “L” de Lopes. Como tal, pensei nas iniciais dos meus nomes próprios – Ana Carla – e trouxe da biblioteca O pintor debaixo do lava-loiças, de Afonso Cruz. Acho que posso fazer este “malabarismo”, não posso, Isa?

5 – Livro escrito por uma mulher
Como nos livros por ler de junho de 2017 não tenho nenhum livro escrito no feminino, selecionei para esta categoria o único livro que recebi em julho do ano passado – El invierno en tu rostro, da espanhola Carla Montero.

6 – Livro “silly”
Não abundam na minha estante livros humorísticos ou levezinhos. Tive que recorrer às estantes que têm livros da minha juventude e primeiros anos de adulta e pegar num chicklit (agora já sei o que isto significa – ehehehe). A escolha recaiu na obra O jovem da porta ao lado, de Josie Lloyd e Emilyn Rees, do qual não me lembro de nada, mas que sei ser uma comédia romântica, bem-humorada e “silly”.

7 – Livro com apenas uma palavra no título
Na pilha oferecida pela Ana Sofia vieram dois que encaixam na perfeição – Soledad, de Raffaello Bergonse e Siddhartha, de Herman Hesse. Ainda estou indecisa sobre qual dos dois vou ler, mas estejam à vontade para dar a vossa opinião e ajudar-me na escolha.

8 – Livro que leste quando eras jovem e gostaste muito
Mais uma escolha difícil, porque há dois ou três anos reli todos os livros das coleções de Enid Blyton – Os cinco, Os sete e Mistério – e outros de outras coletâneas juvenis. Voltei a olhar com olhos de lince para as minhas prateleiras juvenis e lá me decidi por um que pertence à biblioteca juvenil da Editorial Verbo (coleção ternurentamente deliciosa!) e que sei que adorei quando era adolescente – A terra de Léa, de Claire Graf.

9 – Livro que se passe no verão
Voltamos aos livros que entraram na estante no mês de junho de 2017. Segundo a sinopse, uma parte da narrativa de Corações de pedra, de Simon Scarrow, passa-se em 1938, na ilha grega de Lefkas, onde três jovens vivem um verão perfeito, isolados dos problemas políticos que fervilham na Europa. Lá vou eu ter que ler mais um livro sobre a Segunda Grande Guerra 😋

10 – Livro com um número no título
Esta é a maior facada que vou dar nas minhas leituras cronológicas! Sim, vou ler uma obra que entrou cá em casa em maio de 2018! Sim, vou ler Meridiano 28, de Joel Neto, um habitante recém, recém-chegadinho!

11 – Livro de não-ficção
Não tenho livros novos de não-ficção, por isso vou reler uma obra que quero muito reler – O diário de Anne Frank. Também pensei reler Eu, Christiane F., mas como este está em casa da minha mamã, devo ler o de Anne Frank a não ser que esteja “cansada” do tema Holocausto + 2GM. A ver vamos.

12 – Livro que compraste pela capa
Ora aqui está uma coisa que NUNCA faço. Nunca compro um livro exclusivamente pela capa. Faço-o pela narrativa, pelo autor, pelo tema, pelo género, pela escrita, mas nunca pela capa. Assim sendo, continuo a devastar a minha estante cronológica e decido-me pela última obra que comprei de Kate Morton – Amores secretos. Uma confissão (Isa, tu fazes de conta que não leste isto): mesmo que a capa fosse banal, eu teria escolhido esta obra porque já me arrasto de saudades de ler uma história como só Kate Morton sabe criar e entrelaçar!

13 – Prémio literário estrangeiro
Voltamos ao que dita a cronologia. Vou ler A biblioteca, de Zoran Zivkovic, que comprei na FLL do ano passado e que ganhou o World Fantasy Award.

14 – Livro escrito por uma celebridade
Outra categoria difícil, pois não é algo que faço e não estava com vontade nenhuma de ler obras escritas por Júlia Pinheiro ou Fátima Lopes (sem ofensa a quem o faça, mas não são histórias que me cativem). Contudo, tinha pensado em ler O pianista de hotel, de Rodrigo Guedes Carvalho e fiquei extremamente contente (e algo aliviada) quando vi o vídeo que a Isa fez com as suas escolhas e pude constatar que ela selecionou exatamente a mesma obra para esta categoria. Resultado – muito provavelmente iremos fazer a leitura em conjunto!

15 – Livro que tenha sido publicado há mais de dez anos
Esta é a categoria que trago atualmente em mãos. Estou a ler, desde o dia 23 deste mês, a obra Morrer sozinho em Berlim, de Hans Fallada e que foi publicada em 1946.

16 – Prémio literário português
Última categoria e última obra oferecida pela Ana Sofia. Falo-vos de Debaixo de algum céu, de Nuno Camarneiro, vencedor do Prémio LeYa de 2012.

São estas as minhas escolhas e espero que as mesmas me permitam completar o cartão e fazer bingo! Não as devo alterar, mas não as vou considerar completamente definitivas, já que se não estiver a gostar da leitura, partirei de imediato para outra, sem remorsos nem arrependimentos.
Para terminar, convido-vos a todos a participarem nesta maratona e sobretudo a divertirem-se e a saborearem-na numa esplanada, na praia, na piscina ou à sombra de uma árvore. Venham daí! Fico à espera dos vossos comentários sobre as obras que escolhi e sobre o que pretendem ler!

Segunda visita à Feira do Livro de Lisboa







Cumpri a promessa que me fiz a mim mesma o ano passado, quando me estreei na Feira do Livro de Lisboa. Regressei e desta vez com mais tempo 😋😋😋
O ano passado, como talvez se recordem (se não se recordam, podem fazê-lo aqui), estive no Parque Eduardo VII no dia 03 de junho e apenas por duas horas que se revelaram muito curtinhas para uma primeira visita à maior celebração do livro que se faz em terras lusas. Foi uma visita muito atribulada e que me deixou com uma vontade tremenda de repetir, mas em formato XL, ou seja, regressar a Lisboa, regressar à sua Feira do Livro com tempo suficiente para deambular devagarinho, sem sufocos de horários. Assim, ficou de imediato definido que em 2018 voltaríamos à capital de comboio, nos deslocaríamos de metro até ao Parque, mas que a correspondente estada seria de dois dias – um fim de semana inteirinho para lambuzar-me de delícias literárias e, quiçá, conhecer mais uns recantos da cidade.
Este ano os afazeres escolares do mais novo ditaram que iríamos à Feira nos dias 09 e 10 de junho. Partimos no sábado de manhã cedinho e, duas horas e meia mais tarde, o Intercidades deixou-nos na Gare do Oriente. Check-in no hotel feito e almoço comido, "zarpámos” para o Parque Eduardo VII e a primeira coisa que fizemos foi consultar o mapa da feira, esclarecer algumas dúvidas, sacar o caderninho da “wishlist” familiar e traçar o roteiro para uma tarde do mais puro e saboroso deleite!
Não foi muito fácil percorrer todas as bancas com calma e sossego. Primeiro, porque era sábado de tarde e muita gente deambulava por todos os cantinhos dos dois “corredores” da Feira. Segundo, porque não estava sozinha – o meu homem mais pequeno, depois de ter feito as compras dele, queria voltar a corredores subterrâneos e saborear todas as linhas, todas as estações e todas as carruagens do Metro da capital. Terceiro, porque a minha mummy também estava connosco e os livros pouco ou nada lhe dizem. Consequentemente, sentindo um pouco a pressão que filho e mãe, sem muita consciência disso, iam fazendo para que eu me despachasse, fui, mais uma vez, atraída para os espaços das editoras maiores e mais reputadas, pois era aí que sabia que iria encontrar a maior parte dos livros que tinha apontado no meu caderninho.
Para mim não comprei nada na primeira ronda que fiz pela Feira. Apenas comprámos livros para o mais novo que veio carregadinho com os volumes do Diário de um Banana que lhe faltavam e os números 2 e 3 da outra coleção que o está a deixar entusiasmadíssimo – a do Tom Gates. Essa primeira ronda serviu para que pudesse confirmar descontos e sessões de autógrafos. Na que se lhe seguiu já tinha tomado as minhas decisões e fui somente às bancas onde estavam aqueles livros que eu iria comprar e pedir o correspondente autógrafo ao autor ou autora. Comprei somente livros com 20% de desconto ou mais, mas insisti para que o maridinho fechasse os olhos ao escândalo de numa Feira do Livro venderem livros com APENAS 10% de desconto e comprasse a última obra de Rodrigo Guedes de Carvalho para que este a autografasse. Terminámos assim a tarde de sábado no espaço LEYA, com sacos recheadinhos de livros e uma satisfação tremenda no olhar. Faltou somente um pequeno pormenor para que tudo tivesse sido perfeito – que o Ondjaki não se tivesse ausentado da mesa de autógrafos quando lá cheguei com a sua obra Os da minha rua na mão. Ainda esperei e esperei, mas ele nunca mais regressou…
No dia seguinte, a visita foi mais curta e solitária. Regressei ao Parque com um único intuito – que João Reis me autografasse A avó e a neve russa. Consegui o desejado autógrafo, falei um pouquinho com o autor, mas a minha timidez não permitiu que fosse mais do que uma breve troca de palavras acanhada que, no entanto, encerrou da melhor forma possível um fim de semana que terá que ser repetido nos próximos anos!
Passadas duas semanas (que saudades!), os novos inquilinos já habitam a estante e todos eles esperam pacientemente a sua vez, já que aterraram numa casa onde tudo se lê de forma cronológica 😜 Não são muitos, são apenas 8 de literatura adulta e 5 de literatura juvenil, mas são suficiente para nos deixarem de sorriso “bobo” na cara e para me aguçarem o apetite para futuras visitas à FLL!
Para concluir, deixo-vos um resumidinho diário fotográfico destes dois dias inesquecíveis! Até 2019! Ah! E quero saber tudo o que vocês que, como eu, tiveram o privilégio de calcorrear os espaços da Feira, compraram e como se desgraçaram!






Os olhos de Tirésias, de Cristina Drios



Ficha técnica
TítuloOs olhos de Tirésias
Autora – Cristina Drios
Editora – Teorema
Páginas – 216
Datas de leitura – 05 a 11 de junho de 2018

Opinião
Faz praticamente um ano que fiz a minha estreia na Feira do Livro de Lisboa e, para assinalar esse momento histórico, comprometi-me a ler durante o mês de junho as obras que comprei há um ano atrás na Feira. Não sei se vou conseguir lê-las todas, mas vou tentar.
Dei início ao meu compromisso lendo uma (mais uma!) recomendação da Márcia Balsas e que comprei a muito bom preço o ano passado na FLL, pois era livro do dia. Os olhos de Tirésias foi finalista do Prémio LeYa em 2012 e está primorosamente bem escrito. Tropeçamos a cada passo com o cuidado e o mimo que a autora pôs nas palavras, na construção de frases e naquilo que as mesmas nos transmitem. Sentimo-nos embalados, as histórias e as personagens que se vão entrelaçando ao longo da narrativa têm um sabor muito próprio, conduzem-nos entre dois países, entre dois tempos, entre duas épocas muito distintas e acima de tudo embrenham-nos no seio de uma família portuguesa arrancada das fragas da serra da Lousã.
Mateus Mateus não se destaca apenas pela dobragem de nome. É um jovem de praticamente dois metros e que não é capaz de sentir emoção nenhuma, nem mesmo quando lhe morre o pai. Por ser assim, destituído da vontade de reagir à dor, à alegria, ao prazer, ao sofrimento, é-lhe renegado o direito de pertencer à família e acaba sendo criado pelo pároco da aldeia. Com dezassete anos, alista-se no Corpo Expedicionário Português e parte para a região de Flandres onde combaterá até ao final da Primeira Grande Guerra. Quase cem anos depois, a sua neta nada sabe sobre o gigante avô. Apenas possui uma fotografia sua e será esta o mote para uma decisão que mudará a sua vida – irá fazer tudo o que estiver ao seu alcance para descobrir quem foi Mateus Mateus, por que razão a sua vida sempre esteve envolta numa aura cerrada de mistério e, com essas descobertas, publicar um livro que o homenageie.
Da narradora também não sabemos muito. É casada, mas as brechas resultantes de interesses distintos e da súbita vontade de saber mais sobre os seus e sobre si própria e que a levará a outras paragens e a outros mundos provocam um distanciamento que parece não ter solução. Refugia-se inúmeras vezes no seu “nicho” profissional, um espaço diminuto num prédio dominado por escritórios de advogados e é nesses momentos de solidão que sentimos que esta narradora poderá, quiçá, ser um espelho da própria autora e das dificuldades inerentes à exigente tarefa de criar um romance.
Para além destas personagens fulcrais há outras não menos importantes e delas destaco o delicioso Émile, o menino órfão que deambula pelos cenários de guerra tirando da cartola momentos de magia, a belíssima Georgette que furará o círculo negro que sufoca Mateus e dois combatentes – Adolf que é, nada mais, nada menos, do que (creio eu) o jovem soldado austríaco que, anos depois, subirá ao poder, se transformará no chanceler alemão e desencadeará um novo conflito mundial e Erich Kramer ou Erich-Maria Remarque, o autor desse romance extraordinário – A oeste nada de novo – e que eu quero muito, mas muito reler! São exemplos do mimo e do cuidado que já referi e que tornam a leitura desta obra ainda mais rica e saborosa.
Sorrio. Tirésias, o vidente mais célebre de Atenas, era cego. Por ter visto algo que a nenhum mortal era concedido ver, a nudez de uma deusa, perdera a visão e ganhara, em troca, o dom da previsão. O avô Mateus, ao contrário, perdera a clarividência no meio da visão do horror. Adolf, ao contrário, tomado de cegueira histérica, viu o destino de uma nação com a luminescência de um louco. E eu, pensei, quantas vezes, como o comum dos mortais, não saberia ver para além do que olhava.” (pág. 210)
Toda a obra é um desbravar de auto-conhecimento que acompanhei deliciada. É realmente um romance lindíssimo, com passagens – como a que transcrevi – escritas com uma subtileza e uma assertividade que me conquistaram e que me fazem querer ler mais do que escreveu Cristina Drios. Criatividade, originalidade, personagens bem redondas, ambientes muito bem retratados e um estilo muito primoroso – ingredientes mais do que suculentos para que recomende vivamente a leitura de Os olhos de Tirésias.
(Uma pequena nota – escrevi quase todo este texto ao mesmo tempo que ia sofrendo com o jogo Portugal – Marrocos. Por isso, se o resultado final – como ficou o texto, quero dizer – ficou aquém das expetativas, perdoem-me! Lembrem-se que é uma obra mesmo muito boa!)

NOTA – 09/10

Sinopse
A descoberta de um retrato daquele avô cuja história a família sempre encobriu - Mateus Mateus, o gigante de olhar estranho que partiu, no contingente português, para a Flandres durante a Primeira Guerra Mundial - é o pretexto que a narradora encontra para, simultaneamente, escrever um romance e se afastar de um casamento que parece condenado ao fracasso. 

Elmet, de Fiona Mozley



Ficha técnica
TítuloElmet
Autora – Fiona Mozley
Editora – Clube do Autor
Páginas – 286
Datas de leitura – 01 a 04 de junho de 2018

Opinião
A primeira coisa que me apetece dizer é que Elmet é um livro estranho, enigmático. Durante toda a leitura tive que constantemente recordar-me de que a sua trama ocorre num passado muito recente e não há séculos atrás, pois as paisagens, o ambiente, os costumes e o modo de vida dos protagonistas parecem sair de um romance dos séculos XVIII ou XIX. Outro paralelismo que se me ocorreu prendeu-se com o facto de que tudo o que mencionei, ou seja, tudo o que compõe a narrativa parecer igualmente sair de uma fábula ou de um conto de fadas, com uma clara e preponderante dicotomia entre o bem e o mal e uma família de três protagonistas unida contra o mundo.
Us against the world – John, Cathy e Daniel são respetivamente pai e filhos e desde muito cedo que aprenderam a depender apenas uns dos outros. John é um homenzarrão, a quem ninguém consegue vencer numa luta física. Ganha o seu sustento com os punhos e, após a morte da avó materna dos seus filhos, decide construir uma casa num bosque que está num terreno que supostamente teria pertencido à sua mulher. Com a ajuda dos seus filhos adolescentes, pouco a pouco, tronco a tronco, vai erguendo as paredes da cabana que será o lar dos três, um lar que permitirá a John distanciar-se de um mundo que já não lhe diz nada e continuar a estreitar os laços que umbilicalmente o une ao que de mais precioso tem na vida – os seus filhos.
A relação entre John Cathy e Daniel é ao mesmo tempo estranha e mágica. Não falam muito entre si, mas as palavras são supérfluas quando existem um laço (a bound – uma das palavras de que mais gosto da língua inglesa) tão visceral entre os três. Poucas páginas depois de ter iniciado a leitura, compreendi algo que o resto da obra apenas veio confirmar – a rotina dos três estava matematicamente pré-estabelecida, cada um sabia ao mínimo pormenor o que teria de fazer e sobretudo o quanto os outros estariam ali para o que fosse preciso. Apesar do seu aspecto intimidante e sorumbático, John consegue, com raros gestos e ainda mais raras palavras, passar para o leitor o quanto ama os filhos e o quanto está disposto a fazer para protegê-los. Cathy é uma esquiva “gata selvagem”, uma autêntica maria-rapaz, sem noção da beleza que vai tomando conta dela à medida que cresce e com uma adoração ilimitada pelo pai. Já Daniel é mais frágil, mais inseguro, esquivo e simultaneamente carente. Juntos, os três compõem a parte mais bela, mágica, triste e dorida da obra e aquela que ficará comigo por muito tempo.
Poderia adiantar um pouco mais sobre a trama, mas prefiro não fazê-lo. Refiro apenas que a mesma se divide em partes escritas em letras diferentes, narradas em primeira pessoa por Daniel e que uma delas se passa num tempo posterior ao da outra e nos vai dando dicas do que poderá ter acontecido à família. Essa parte associada às prolepses coloca a semente da curiosidade e angústia no leitor ao mesmo tempo que o faz conhecer melhor Daniel e o seu apego àquilo que comanda os seus atos e a sua vida. Também confirma aquilo que se suspeita (pelo menos eu suspeitei) desde o início sobre o filho de John, mas, na minha opinião, é a única passagem desnecessária da obra, aquela que a autora poderia perfeitamente ter deixado na gaveta.
Não posso terminar esta opinião sem fazer referência ao título da obra e ao quanto este vai ao encontro da sensação que mencionei no início, isto é, de que, propositadamente ou não, Fiona Mozley escreveu o seu romance de estreia ambientado no presente/passado muito recente, mas utilizando uma panóplia de elementos que me fizeram recordar romances de séculos passados e inclusive fábulas e contos de fada. Elmet, segundo uma citação que abre a obra, foi o último reino celta independente em Inglaterra e, no século XVII, o território que lhe correspondia continuava a ser considerado as badlands, um refúgio para quem vivia à margem da lei. Ora, uma informação que, mal pegamos no livro, nos pode passar despercebida, encaixa direitinho, milimetricamente com tudo o que lemos ao longo da obra e com o seu teor, o seu tom e, por que não, com o estilo que denota muita maturidade da autora.
Creio que, por tudo o que fui dizendo, é evidente que esta leitura não é simples, nem muito menos corriqueira. É, como já afirmei, estranha, enigmática (a capa não engana e assim o confirma), poderá não ser para todo o género de leitor e poderá deixar-vos, como me deixou a mim, “coxos”, incompletos e incrédulos. Porém, é merecedora da vossa atenção e, sem dúvida, merecedora de estar entre os finalistas do Man Booker Prize. Arrisquem e digam depois se valeu a pena tomar esse risco.

Agradeço muito à editora Clube do Autor o envio desta obra em troca de uma opinião sincera.

NOTA – 09/10

Sinopse
Daniel está a ir para Norte e procura alguém. A vida simples que levava com a irmã Cathy e o pai desapareceu; tornou-se ameaçadora e sinistra. Viviam os três à margem da sociedade, numa casa que o pai construíra no bosque, caçando e procurando comida. O pai dissera-lhes que a pequena casa em Elmet era deles, mas afinal isso não era verdade. E alguns homens daquela terra, gananciosos e vorazes, começaram a vigiá-los de perto.
Esta é uma história sobre família, amor e violência; uma análise dura e implacável à sociedade contemporânea, ao indivíduo e à realidade, aos conceitos de classe e às discrepâncias entre quem somos e quem somos capazes de ser.

Balanço mensal - livros lidos e adquiridos/recebidos em maio



Estamos a meio de junho e só agora é que tive tempo (e ânimo) para sentar-me e fazer o balanço do mês de maio que já lá vai… Quero pedir desculpas a quem me segue assiduamente por esta ausência, mas quando o trabalho manda em todos os passos que dou, é impossível mimar e alimentar este cantinho que já é tão vosso como meu.
Agora que consigo, por fim, ver luz ao final do túnel quero tentar pôr em dia os textos que tenho em atraso e partilhar convosco tudo o que tenho andado a ler, a comprar e a acrescentar à minha wishlist.
Maio foi um mês de muito boas leituras. Mas também foi o mês em que desisti de duas que não fizeram clique nem me embalaram nos poucos minutos em que, diariamente, pegava no livro que estava na mesinha de cabeceira e tentava evadir-me da realidade.
 Em dois ou três dias devorei Deixa-me Odiar-te (gentilmente enviado pela editora Clube do Autor) e descobri, depois de tantos e tantos de leitora, o que é isso de um romance chicklit. Não é o meu tipo de obra favorito, mas, caramba, adorei a experiência, adorei a sua previsibilidade e a enxurrada de clichés que inundam a história de dois jovens que trabalham juntos, que se odeiam, mas que se prevê, desde a página inicial, que vão viver uma história de amor muito divertida, cheiinha de contratempos e com um inevitável final feliz. Lê-la foi uma lufada de ar fresco e, como tal, atribuí-lhe a nota de 09/10.
A obra que se lhe seguiu também foi lido num curtinho espaço de tempo. Voltei às letras de Possidónio Cachapa com Segura-te ao meu peito em chamas e admito que não gostei de todos os contos que compõem a obra. Contudo, há dois que são de uma beleza transcendental, que me tocaram e ainda estão comigo. São mais um exemplo do quão bem escreve este autor alentejano e do quanto vale a pena descobrirmos novos autores lusos. Possidónio Cachapa é, como já disse outras vezes, um nome a ter em conta. Eu pelo menos quero, e muito, ler mais dele. A esta colectânea dei 08/10 e aproveito para agradecer, uma vez mais, o empréstimo aos cunhadinhos.
Há muito tempo que queria ler O czar do amor e do tecno. Desde que li a correspondente opinião que a Márcia Balsas deixou no seu Planeta. Sabia de antemão que não seria uma leitura fácil, já que, nas palavras da Márcia, a narrativa se assemelhava a um comboio que parava em muitíssimas estações e que, enquanto leitores, nos veríamos obrigados a entrar e sair continuamente nessas estações. Embarquei repleta de expetativas e as mesmas não foram goradas. A escrita de Anthony Marra é primorosa, as personagens densas, imperfeitas e muito especiais e o tom mordaz, crítico, irónico e ao mesmo tempo emotivo e dorido. Foi assim uma viagem muito saborosa e à qual atribuí a classificação de 09/10.
Maio também me permitiu regressar a um conflito pelo qual tenho uma obsessão doentia. Li Rapariga em Guerra e Como se eu não existisse e voltei a sofrer horrores ao ler os horrores que se perpetraram na Guerra Civil Jugoslava. “Mordi-me” de repulsa e terror perante a história de uma menina que perde a infância numa estrada barrada por soldados/mercenários e perante a história de uma jovem mulher que, nas mãos de outros soldados/mercenários compreende de pior forma possível o que é ser vergada, humilhada e destituída da essência que nos torna humanos e únicos. Foram, como devem calcular, duas leituras poderosíssimas, que me deixaram extenuada, mas com a obsessão inabalável, ou seja, não devo demorar muito tempo em embrenhar-me noutra de cariz semelhante. A Rapariga em guerra atribuí, depois de alguma reflexão, a nota máxima e a Como se eu não existisse a nota imediatamente abaixo, ou seja, um 09.
Intervalei a leitura destas duas obras duras com outra vinda de terras que têm um sabor mágico, pelo menos para mim. Li Tão amigas que nós somos, da chilena Marcela Serrano e adorei o primeiro contacto com esta autora que já me piscava o olho há bastante tempo. A história de quatro amigas, muito diferentes entre si, mas unidas como só as verdadeiras amigas conseguem ser, embalou-me e aconchegou-me como poucas o fazem e, para além de ter ficado com o orgulho feminino ainda mais em alta, saboreei com um prazer muito especial o regresso a paragens sul-americanas e a uma escrita com textura e temperaturas muito próprias. Fiquei com água na boca e agora quero ler mais de Marcela Serrano. A este primeiro contacto com as suas letras dei 09/10.
Referi no início deste balanço que a estas seis obras lidas se juntam duas que não consegui terminar. Uma foi uma experiência falhada no mundo chicklit. Li mais de metade de Amores Proibidos, de Jill Mansell, mas a impressão pouco apelativa que fiquei desde as páginas iniciais nunca se desvaneceu e não criei nenhuma empatia com qualquer uma das personagens e só consigo recordar que todos pareciam ter amantes ou querer ter amantes… A outra experiência falhada foi com uma obra “mais séria” – Paisagem com mulher e mar ao fundo, de Teolinda Gersão. Li apenas 20 ou 25 páginas, mas não quis mais… Não duvido que a obra seja muito boa, mas não se encaixou num mês de muito trabalho e pouca concentração. Talvez lhe pegue mais tarde.

Entretanto, maio trouxe novos habitantes para a estante. No dia da mãe, os meus homens mimaram-me com dois livros que estavam na minha wishlist – O caderno do avô Heinrich, de Conceição Dinis Tomé e Debaixo da pele, de David Machado. Para além destes, outros três chegaram à estante porque não me controlei e pequei em promoções feitas pela WOOK. Comprei Sete minutos depois da meia-noite, de Patrick Ness, As últimas linhas destas mãos, de Susana Amaro Velho e o ansiadíssimo Meridiano 28, do maravilhoso Joel Neto. Cinco novos habitantes que ficarão à espera da sua vez e que sei que me irão maravilhar.

Concluindo, maio foi um mês mesmo muito proveitoso. Só espero que junho lhe siga as pisadas. Para já, está bem encarreirado.
E como foi o vosso mês de leituras e aquisições? Já leram alguma das obras que comprei/recebi? Se sim, por favor, digam o que acharam, sem revelar demasiado.

Termino deixando-vos, como é habitual, os links para acederem à opinião completa das obras lidas em maio:
§  Deixa-me odiar-te, de Anna Premoli
§  Segura-te ao meu peito em chamas, de Possidónio Cachapa
§  O czar do amor e do tecno, de Anthony Marra
§  Rapariga em guerra, de Sara Novic + Como se eu não existisse, de Slavenka Drakulic
§  Tão amigas que nós somos, de Marcela Serrano

Tão amigas que nós somos, de Marcela Serrano



Ficha técnica
TítuloTão amigas que nós somos
Autora – Marcela Serrano
Editora – Círculo de Leitores
Páginas – 312
Datas de leitura – 24 a 29 de maio de 2018

Opinião
No dia 18 deste mês (maio) participei num encontro onde se reuniu um número considerável de amantes de livros e de bibliotecas e foi ao ouvir uma das participantes que me recordei desses dias (que parecem estar lá longe, longe) nos quais me sentava ao computador e passava minutos infindáveis a cuscar as páginas oficiais de editoras espanholas em busca de novidades. Foi assim que descobri novos autores e obras que aqui em Portugal não se haviam publicado.
Retomando o que estava a dizer sobre o encontro, a palestrante fez uma exposição apaixonante acerca de livros, viagens e autores favoritos e mencionou Marcela Serrano, uma chilena que eu queria muito conhecer desde esses dias de cusquice nas páginas das editoras espanholas. Recordei de imediato um dos seus títulos – Nosotras que nos queremos tanto – e, já em casa, saltei de alegria quando constatei de que a biblioteca da minha terrinha tinha essa obra e em português!
Tão amigas que nós somos proporcionou-me uma leitura muito especial e que vai ficar comigo durante muito tempo. Tenho um fraquinho e um carinho por terras sul-americanas, pelos seus povos, pela sua História, pela sua geografia (que viagem de sonho seria calcorrear os seus cantinhos… menos aqueles onde pudesse ter encontros nada desejáveis com determinados bichos que já deveriam estar extintos…) e nunca irei esquecer o quanto me marcou o primeiro contacto que tive com as suas letras e os seus escritores. Cuando se fala em Chile, para mim fala-se de Isabel Allende e dos seus primórdios, de romances polvorizados de amores quentes, de famílias estranhas e adoráveis, de fábulas, de superstições e da tenacidade de um povo em querer a todo o custo ser livre. Fala-se igualmente de Pablo Neruda e da beleza magistral das suas palavras poéticas. E agora, após a leitura de Tão amigas que nós somos, fala-se ainda de Marcela Serrano.
Acho que o título diz muito do que se pode encontrar na narrativa deste livro. Privamos com quatro amigas, quatro mulheres de idades e proveniências distintas, mas que encontram no colo e no ombro de cada uma o porto de abrigo e de refúgio. Ana, a narradora, Maria, Sara e Isabel são mulheres que me conquistaram pela sua garra, pelos seus ideais feministas, pelas suas imperfeições e também pelas suas fraquezas e debilidades. A juventude ou os seus primeiros anos de adultas colidem com a ditadura de Pinochet e assim, ao mesmo tempo que fui conhecendo mais pormenorizadamente quem eram as quatro protagonistas, fui sorrindo e sentindo aquele gostinho tão saboroso ao comprovar a força e as estratégias bem femininas que todas elas foram pondo em prática para quebrar barreiras políticas, sociais, sexistas e domésticas. Nem sempre foram bem-sucedidas, choraram, sentiram-se sós, amaldiçoaram-se, sofreram e caíram inclusive em depressão. Mas, mesmo nestes momentos, mostraram-se mulheres e eu amei-as ainda mais.
Após uma leitura tão dura como Rapariga em guerra e perspetivando que essa dureza iria continuar com a leitura que se lhe seguiria, Tão amigas que nós somos cumpriu com o seu objetivo. Deixou-me aconchegadinha, com o orgulho de ser mulher nos píncaros e com a cabeça a borbulhar de sonhos e vontades de transpor distâncias geográficas e ir até ao outro lado do mundo, onde as estações estão viradas do avesso e a os espaços de um país entrincheirado por um oceano e uma cordilheira atraem-me como poucos. Por isso, só me resta recomendar vivamente a leitura desta obra de mais uma chilena que me conquistou. Não sei se será fácil encontrarem esta obra, mas vale a pena fazer o esforço de procurá-la em bibliotecas ou alfarrabistas.

NOTA – 9,5/10 (porque queria mais, talvez da narradora, que se esconde um pouco atrás do que nos conta sobre as suas amigas)
Sinopse
Quatro mulheres à beira da maturidade falam apaixonadamente e sem inibições das suas histórias pessoais (...) Retrato de um sector urbano e cosmopolita da sociedade chilena e das suas vicissitudes nos últimos 30 anos, confronta-nos antes de mais e sem concessões com os claros-escuros da condição feminina....