A herdeira dos olhos tristes, de Karen Swan



Ficha técnica
TítuloA herdeira dos olhos tristes
Autora – Karen Swan
Editora – Clube do Autor
Páginas – 460
Datas de leitura – de 15 a 18 de março de 2018

Opinião
Em quatro dias engoli e devorei esta obra que me foi gentilmente oferecida pela editora Clube do Autor. Numa altura em que o trabalho domina os meus dias e quase não me deixa respirar, é extremamente saboroso aproveitar as migalhinhas de tempo que me sobram para mergulhar numa leitura fácil, que nos prende e que nos obriga a “papá-la” com sofreguidão. Foi o que aconteceu com este romance de Karen Swan, uma autora que até agora desconhecia.
A narrativa, partida entre presente e passado e entre duas protagonistas de idades muito diferentes, entrelaça tão bem tempos e as histórias das duas mulheres que, sem que me desse conta, me levou a ler páginas atrás de páginas, absorvida nas vidas de Cesca e Elena e desejosa de saber que segredos escondiam, que reviravoltas o presente lhes reservava e sobretudo qual o verdeiro motivo que havia levado Elena a contratar Cesca para que esta escrevesse as suas memórias de menina milionária e de mulher detentora de um título aristocrático.
A ação centra-se, como é óbvio, nestas duas mulheres e nas suas vidas tão díspares. As duas conhecem-se em Roma, cidade milenar e carregada de perfumes fortes e inesquecíveis. Cesca é uma jovem inglesa que decidiu refugiar-se na capital italiana após ter deixado para trás uma vida de advogada de sucesso. Vive a poucos metros do palácio sumptuoso de Elena Damiani e o acaso permite que as duas travem conhecimento e uma acabe trabalhando para a outra. Enquanto Cesca se debruça sobre uma pilha interminável de fotos que retratam a vida de Elena, nós, leitores, vamos saltitando do presente para o passado e percebendo que há muito mais por detrás da vida glamorosa de Elena do que as referidas fotos contam. Vamos percebendo igualmente que há algo no passado de Cesca que não lhe permite relaxar e viver a vida que tem pela frente. Tudo isto nos chega através de uma narrativa fresca, cativante e com todos os ingredientes para querermos devorar o mais rápido possível os seus capítulos curtinhos e bem enredados entre si.
Admito que esta obra nada tem de espetacular nem é dona de nenhuma fórmula inovadora. Mas isso não é motivo para que a não recomende, sobretudo àqueles que queiram mergulhar numa leitura mais leve, entusiasmante e que lhes sairá das mãos em pouco tempo, tal será a vontade de avançarem na sua narrativa e chegarem ao seu desenlace satisfeitos e saciados. Por isso, se andarem à procura de uma leitura deste género, arrisquem com este romance, pois as vossas expectativas não sairão defraudadas.
Termino fazendo referência à única coisa que verdadeiramente me desagradou. Falo da tradução e/ou adaptação do título ao português, pois acho um disparate completo darem o título de Herdeira dos olhos tristes a uma obra protagonizada por alguém como Elena. É certo que ela não teve uma vida fácil, mas herdou um título e uma vida aristocráticas que não se podem reduzir e caracterizar como apenas “tristes”. Elena é uma personagem complexa, contraditória e que não ganha facilmente a simpatia da parte dos leitores. Viveu uma existência pautada por desamores, alguma violência e perdas, mas conseguiu sempre superar tudo isso, muitas vezes de formas pouco ortodoxas e corretas. Como tal, considero que é muito redutor aquilo que se retira do título e que este não espelha nem se ajusta àquilo que que foi e é Elena Damiani. Mas, e digo-o com alguma frustração, este não é nem será o último exemplo de um título traduzido/adaptado de forma completamente despropositada.
Agradeço, uma vez mais, à editora Clube do Autor que me enviou esta obra em troca de uma opinião sincera.

NOTA – 08/10

Sinopse
1974. Elena Damiani é uma herdeira rica e bela, com tudo para ser feliz. Contudo, aos vinte e seis anos já vai no terceiro casamento e uma juventude repleta de cicatrizes. Quando conhece o homem que parece ser o seu par perfeito, percebe que ele é precisamente o único homem que ela não pode ter, e nem todo o dinheiro do mundo é capaz de mudar essa circunstância.
Mais de 40 anos depois, a jovem Francesca vive la dolce vita. Antiga advogada, foi para Roma em busca de uma nova vida. Um acaso fortuito leva-a ao Palazzo Mirandola, onde conhece a famosa Viscondessa Elena dei Damiani. A empatia entre ambas é imediata e Francesca fica fascinada pelo mundo de Elena, pelo seu passada e pelas suas incríveis histórias.
Quando a Viscondessa a incumbe de narrar a sua extraordinária vida, Francesca entra num mundo de privilégios, aparências e excessos. Mas só quando um valioso anel de diamantes é encontrado num túnel antigo da cidade, mesmo por baixo do Palazzo, é que Francesca percebe a rede de mentiras que envolve Elena. A braços com o seu próprio passado tortuoso, Francesca é incapaz de ignorar a verdade, revelando um segredo antigo que pode mudar muitas vidas…

A vida inútil de José Homem, de Marlene Ferraz



Ficha técnica
TítuloA vida inútil de José Homem
Autora – Marlene Ferraz
Editora – Gradiva
Páginas – 172
Datas de leitura – de 11 a 14 de março de 2018

Opinião
Já comecei esta opinião várias vezes e dou comigo a apagar tudo o que vou escrevendo, porque nada do que escrevi até agora consegue refletir o quanto a obra de Marlene Ferraz ficou comigo.
Sabia, de um saber cá de dentro e que não se explica, que seria isso que iria acontecer mal retirasse a obra da estante e a deixasse fazer-me companhia. Sabia que, tal como aconteceu com a Márcia, que partilhou no seu Planeta o quanto se havia apaixonado pela história de José Homem, que o mesmo se passaria comigo. E não poderia estar mais certa. Demorei quatro dias a ler 172 páginas. Tantas horas para ler menos de 200 páginas, tantas horas para acercar-me de José Homem e saborear com um prazer indescritível a escrita da sua criadora. Tantas horas para perder-me numa narrativa curtinha, que me falou como se me conhecesse desde sempre e compreendesse, como muito poucas compreendem, aquilo que me desarma e me faz encontrar nos livros um lado doce e inesquecível de uma existência que tende a ser absorvida pelo corriqueiro, pelo banal e pelas obrigações. Tantas horas para confirmar o que já era certo ainda antes de retirar a obra da estante – que A vida inútil de José Homem ficaria comigo para sempre.
José Homem é um homem que prepara a sua morte, pois já não quer mais viver uma vida amputada de amor. Vai desfazendo-se dos bens materiais que ainda o poderiam ligar às memórias e recordações dessa existência amputada de amor até que conhece Antonino Salvador, criança que traz no corpo as lembranças de uma guerra que lhe levou uma perna e os familiares. Entre os dois nasce uma ligação que me comoveu até às lágrimas e me fez abrir o coração e amar um ancião que sempre procurou o amor, que poucas ou nenhumas vezes o encontrou e que foi, devagar, devagarinho, abrindo a porta de sua casa e da sua vida a um miúdo estrangeiro, também ele em busca de um lar, de um poiso.
É impossível não deixarmos que José Homem e Nino nos arrebatem. É igualmente impossível não sorrir perante a benévola teimosia do padre Delfim, a sua intrínseca bondade e os “pecados” que vai cometendo em prol de um bem maior. E é ainda impossível não nos deixarmos embalar pela suavidade e poesia que emanam da escrita e do estilo da autora. Tudo magistralmente interligado e que acaba por criar uma obra que nos toca no que nos é mais íntimo. A mim tocou. E suspeito que o fez e fará a todos que a leram e a possam vir a ler.
Não me apetece dizer muito mais. Talvez por questões meramente egoístas ou talvez porque José Homem, Nino e a sua criadora merecem que muitos mais leitores os queiram conhecer e perceber por si mesmos o quanto eles são especiais, únicos.
A mim resta-me dizer obrigada a ti, Márcia. Foste tu quem me impulsionou a querer conhecê-los. Agora que o fiz nunca mais os largarei.

NOTA – 10/10

Sinopse
As idas à grande cidade para se libertar da herança dum pai coronel verticalmente duro e duma mãe extravagante e desligada fazem com que José Homem se sinta no bom caminho para uma morte sem memórias nem saudade.
Descrente no governo de deus e, sim, das circunstâncias, é por mão do padre que se vê obrigado a relacionar-se com um dos rapazes estrangeiros recebidos no orfanato, Antonino, mutilado na guerra civil de Angola, o que vem despertar em si um sopro inesperado de amor e vontade.

A contadora de histórias, de Jodi Picoult



Ficha técnica
TítuloA contadora de histórias
Autora – Jodi Picoult
Editora – Bertrand Editora
Páginas – 516
Datas de leitura – de 03 a 10 de março de 2018

Opinião
Este é apenas o segundo livro de Jodi Picoult que leio. O primeiro li-o há anos (já não sei bem quando) e não me deixou boas memórias. Refiro-me a O décimo círculo e ainda hoje acho que foi uma leitura banal, sem nada que a destacasse de outras leituras banais.
Sempre associei a autora a histórias carregadas de dramatismo, de escolhas quase impossíveis. Confesso que não consigo deixar de fazer um paralelismo entre as suas narrativas e as notícias que inundam os nossos telejornais daquilo que se passa nos Estados Unidos e parece que não se passa em mais lado nenhum do planeta. Sei que estou a ser parcial e até preconceituosa, mas não o consigo evitar, é uma associação imediata e inconsciente.
Ora, como devem calcular, foi com algum espanto e muita curiosidade que constatei que A contadora de histórias ocultava um segredo a que apenas tive acesso lendo algumas críticas e opiniões que leitores e leitoras foram deixando em blogues e no Goodreads – nada na sua capa e na sua sinopse o indicam, mas a trama desta obra centra-se, e muito, na Segunda Guerra Mundial e no Holocausto. Sendo assim, e porque queria dar outra oportunidade a Jodi Picoult e porque sabia que seria uma ótima leitura para o maridinho, ofereci-lhe A contadora de histórias no Dia do Pai do ano passado.
A cronologia das minhas leituras ditou que lesse a obra em março, mês que estou a dedicar às leituras no feminino e quase um ano depois de a mesma ter aterrado na estante cá de casa. Li-a a uma velocidade considerável, já que apenas levei sete dias a ler mais de quinhentas páginas num mês sufocante, com o período escolar a terminar e a pilha de trabalho a aumentar para números angustiantes. Mas adiante.
A contadora de histórias é uma narrativa protagonizada no feminino e que deambula de forma muito entusiasmante entre o passado e o presente. Nos dias de hoje conhecemos Sage Singer, uma jovem que carrega um peso de culpa dentro de si e que o tenta aliviar amassando e fazendo pão das mais variadas formas e sabores numa padaria da sua localidade. Tem uma vida de quase reclusa e as suas idas e vindas da padaria para casa são só quebradas com as sessões que frequenta num grupo de apoio a pessoas que não consegue lidar com o luto. Será nesse grupo que fará amizade com um idoso (que se apresenta como Josef Weber) e que acabará por fazer-lhe uma confissão e um pedido que abalroarão a sua existência de eremita solitária. Joseph admite a Sage um segredo guardado há mais de cinquenta anos – ele é um ex-nazi e quer que ela o ajude a morrer.
Esta confissão cai como uma bomba na vida da protagonista e será o elemento desencadeador do desenvolvimento da narrativa. Esta começará a fragmentar-se em capítulos que saltam do presente para o passado e isso permitir-nos-á conhecer mais a fundo outras personagens – o próprio Josef enquanto oficial nazi, a sua família, sobretudo o seu irmão Franz, e a avó de Sage, Minka, uma sobrevivente do Holocausto e de Auschwitz.
Quem me conhece minimamente sabe que sou obcecada por tramas que abordam a Segunda Grande Guerra e que vibro com histórias que me absorvem com o seu ritmo vivo e com um crescendo no desvendar de pormenores que culminam num desenlace estrondoso. A contadora de histórias esteve realmente à altura desses parâmetros, partilhando comigo o passado de Minka como criança judia e polaca, a sua juventude passada no gueto de Lotz, a sua deportação para Auschwitz e a sua sobrevivência a esse local infernal. Para além disso, gostei muito da alternância entre passado e presente, que me manteve suspensa, à espera de mais detalhes e desenvolvimentos que me permitissem conhecer melhor Sage, Josef, Darija (a melhor amiga de Minka) e Franz e gostei igualmente da mensagem sub-reptícia que atravessa a obra e que nos comprova que nada na vida é linear, que nada é preto e branco e que por detrás de uma pessoa que parece não fazer mal a uma mosca pode estar o mais hediondo assassino.
Por tudo o que referi até aqui, podem concluir que a leitura desta obra foi muito boa e que derrubou alguns preconceitos que eu tinha acerca da sua autora. No entanto, para mim o desenlace de A contadora de histórias não foi o mais bem conseguido. Defraudou-me o final que Jodi Picoult reservou para Sage e tão-pouco me foi difícil desvendar a reviravolta que se dá nas últimas páginas. Porém, mesmo tendo em conta estes pormenores, não dou como perdido o tempo que passei com a obra nas mãos. De modo nenhum. Recomendo-a e muito, sobretudo para aqueles que partilham a minha obsessão pelo Holocausto e a Segunda Grande Guerra, já que é preciso respirar fundo e engolir a dor e o horror perante algumas passagens que Minka nos conta da sua vida enquanto sobrevivente do inferno na Terra.
Termino, dizendo que, como podem adivinhar, ganhei um carinho muito especial por Minka (para mim a verdadeira protagonista desta obra) e que esse carinho é antitético, pois a sua história apoderou-se de mim de tal forma que me pediu e ainda me pede que faça um interregno de algum tempo em leituras do Holocausto. Acho que está na altura, para bem da minha sanidade mental e emocional. Mas será que vou ser capaz de cumpri-lo?...
Esta foi a segunda leitura feminina que fiz este mês. Segue-se A vida inútil de José Homem, de Marlene Ferraz, que já está há demasiado tempo à minha espera na estante.

E o vosso março? Como vai de leituras? Já leram Jodi Picoult? Recomendam-me alguma das suas obras?

NOTA – 09/10

Sinopse
Sage Singer é padeira de profissão. Trabalha de noite, a preparar o pão e os bolos para o dia seguinte, tentando fugir a uma realidade de solidão, a más memórias e à sombra da morte da mãe. Quando Josef Weber, um velhote que faz parte do grupo de apoio de Sage, começa a passar pela padaria, os dois forjam uma amizade improvável. Apesar das diferenças, veem um no outro as cicatrizes que mais ninguém consegue ver.
Tudo muda no dia em que Josef confessa um segredo vergonhoso há muito escondido e pede a Sage um favor extraordinário. Se ela disser que sim, irá enfrentar não só as repercussões morais do seu ato, como também potenciais repercussões legais. Agora que a integridade do amigo mais chegado que alguma vez teve está envolta numa névoa, Sage começa a questionar os seus pressupostos e as expectativas em torno da sua vida e da sua família. 
Um romance profundamente honesto, em que Jodi Picoult explora graciosamente até onde podemos ir para impedir que o passado dite o nosso futuro.

O retorno, de Dulce Maria Cardoso



Ficha técnica
TítuloO retorno
Autora – Dulce Maria Cardoso
Editora – Tinta-da-China
Páginas – 272
Datas de releitura – de 26 de fevereiro a 02 de março de 2018

Opinião
A primeira coisa que se destaca nesta obra é a sua edição, que sendo de bolso, é lindíssima, de cantos arredondados e com uma qualidade superior, face a outros exemplos de edições de bolso. A outra é a imagem que compõe a sua capa e que, de imediato, nos transporta para vidas empacotadas, embaladas. Vidas que deixam sempre algo para trás, que se veem, de um dia para o outro, obrigadas a caber num punhado de malas, caixotes e sacos.
Estamos em 1975, numa Angola recém-independente. A família de Rui, o nosso narrador protagonista, tal como muitas e muitas outras, tem que deixar a casa, grande parte dos seus pertences e uma vida de mais de quinze anos naquela terra onde os brancos são o inimigo a abater. Terá que retornar para a metrópole e para um futuro sem casa, sem pertences, sem uma vida. Pai, mãe e dois filhos não têm quem os acolha. Não têm para onde ir. Os mais jovens apenas conhecem a metrópole das imagens que povoam os seus livros escolares. Os mais velhos partiram de lá há anos infinitos. Será um retorno sem raízes, um retorno que todos eles sabem que não terá volta, que não terá retorno.
Rui tem apenas 15 anos e vê a sua vida dar uma volta sem retorno num curtíssimo espaço de tempo. Perde os seus amigos, a sua casa, o seu país e ruma para uma Lisboa que não conhece e que se vê a braços com um fluxo interminável de retornados que não têm para onde ir. Durante mais de um ano viverá com a mãe e a irmã num quarto de um hotel de cinco estrelas. Sentir-se-á todos os dias um pária, um jovem que não pertence a nenhum lado, que já não pertence ao país que o viu nascer e muito menos pertence àquele que, constantemente, lhe relembra que é apenas um retornado a viver às custas daqueles que nunca explorariam nem maltratariam os colonos.
Com um estilo que me sorriu através das muitas semelhanças que tem com o do meu querido Saramago, a autora criou uma narrativa dura, crua, que, servindo-se dos pensamentos, sentimentos, reflexões, monólogos de Rui, reflete mais do que tudo essa sensação de não-pertença, de desamparo, de não ser dono de si mesmo, do seu passado, do seu presente e, principalmente, do seu futuro. É uma sensação que se cola ao leitor, que nos bloqueia e nos faz compreender ainda melhor o quanto é imprescindível, para sermos pessoas, para nos sentirmos gente, termos um chão ao qual chamamos lar, pátria. Pode ser apenas um cantinho de terra, um casebre. Mas é nosso, é lá que temos as nossas raízes, é a esse naco de espaço que pertencemos.
Rui tem, como já disse, apenas 15 anos quando deixa uma vida para trás. Essa perda traz revolta, traz desespero, traz uma vontade irrefreável de explodir, de pontapear, de quebrar e traz um crescimento não desejado, um crescimento que o força a deixar de lado o egoísmo típico de um adolescente e a responsabilizar-se por si e pelos seus. Sem o pai presente, tem que ser ele o homem da família. Mas que sabe um puto de 15 anos de ser o homem da família? Que sabe disso um puto que apenas quer ter a sua vida de volta, que apenas quer que a sua irmã lhe volte a chamar de estúpido, como fazia antes? Não sabe nada. E nem quer saber. Quer somente a sua vida, não ser o retornado, ser um rapaz que faz as coisas típicas de rapaz e que sabe que, ao final do dia, tem para onde ir.
Gostei mesmo muito de ler esta obra, mas faltou-lhe qualquer coisa para ser perfeita. Não sei nem consigo explicar o que lhe faltou, porém há um pequeno vazio que não me permite que lhe atribua a pontuação máxima. Talvez o motivo seja a maior exigência que ponho “em cima dos ombros” dos bons escritores. Talvez seja o facto de a narrativa estar centrada apenas na perspetiva do Rui e não nos possibilitar conhecer, por exemplo, o ponto de vista do seu pai. Talvez seja por ser narrada pelo protagonista que nunca é tão omnisciente como um narrador heterodiegético. O que é certo é que esse pequeno vazio existe exclusivamente por culpa minha, ou seja, foi a minha leitura, a minha visão da mesma e não a qualidade do estilo, da trama ou das personagens que me levam a apenas atribuir um nove e não um dez a esta leitura. Sendo assim, não quero, de maneira nenhuma, influenciar pela negativa leitores que futuramente queiram desfrutar de O retorno. Pelo contrário. Quero que leiam a obra e que me façam ver o quanto estava enganada ao não dar-lhe a pontuação máxima, a pontuação que ela talvez verdadeiramente merece.
Esta foi a minha estreia com a autora. Uma estreia mais do que auspiciosa e que quero que me leve rapidamente ao encontro de mais obras suas. Por isso, se alguém já tiver lido outros romances de Dulce Maria Cardoso, por favor digam e recomendem-me qual deverei ler a seguir!

NOTA – 09/10

Sinopse
1975. Luanda. A descolonização instiga ódios e guerras. Os brancos debandam e em poucos meses chegam a Portugal mais de meio milhão de pessoas. O processo revolucionário está no seu auge e os retornados são recebidos com desconfiança e hostilidade. Muitos não têm para onde ir nem do que viver. Rui tem quinze anos e é um deles.
1975. Lisboa. Durante mais de um ano, Rui e a família vivem num quarto de um hotel de 5 estrelas a abarrotar de retornados — um improvável purgatório sem salvação garantida que se degrada de dia para dia. A adolescência torna­-se uma espera assustada pela idade adulta: aprender o desespero e a raiva, reaprender o amor, inventar a esperança. África sempre presente mas cada vez mais longe.

Balanço mensal - livros lidos e recebidos em fevereiro



No mês mais pequeno do ano, li apenas quatro livros, mas um deles deveria contar por três, já que tem mais de 800 páginas!!! Estou obviamente a referir-me a O labirinto dos espíritos, de Carlos Ruiz Zafón, que encerra a saga de O cemitério dos livros esquecidos e fá-lo de forma primorosa!
Comecei a lê-lo no final de janeiro e devorei-o em apenas doze dias, tal era a minha ânsia de obter respostas a muitas perguntas que foram sendo deixadas pelos volumes anteriores e de saber, por exemplo, quem foi na verdade Isabel Sempere. E, como já disse na correspondente opinião, a saga encerrou da melhor forma possível, saciou-me e ainda me permitiu conhecer a magnífica e tortuosa Alicia Gris. Dei-lhe, como não poderia deixar de ser, a pontuação máxima e o meu entusiasmo foi tão contagiante que conseguiu aquilo que, à partida, parecia muito pouco provável – desviar a atenção do maridinho dos novos elementos da estante e levá-lo a reler toda a saga!
O segundo livro que li em fevereiro foi uma desilusão que me abalou. Tinha grandes expectativas em relação a Os Malaquias, não só por causa do prémio que obteve – Prémio literário José Saramago – como também pela sua premissa e pelas suas páginas iniciais, que, aquando da sua compra, me haviam deixado em polvorosa. Contudo, à medida que ia avançando na leitura, fui sentindo esse entusiasmo a evaporar-se, tal era a inércia das personagens, a falta de vida que os habitava e exemplos de um realismo que de mágico pouco ou nada tinham. Gostei muito do estilo de escrita da autora, do tom açucarado que tem, mas não chegou para concordar com o prémio que lhe foi atribuído nem para preencher as minhas expectativas. Mal terminei a sua leitura, pu-lo de imediato na estante, não sem ter pensado que talvez não o venha a doar, num futuro próximo, à biblioteca municipal.
Continuei em latitudes mais quentes com a terceira leitura do mês. Tenho noção, sobretudo pelas pesquisas que vou fazendo na blogosfera e noutras plataformas, que O pecado de Porto Negro não é uma obra muito conhecida e muito lida, o que é uma pena, pois tem todos os ingredientes para agarrar os leitores que apreciam uma narrativa pulsante, prenhe de vida e de emoções fortes. As suas personagens estão muito bem construídas e nenhuma delas nos deixa indiferentes – ou sentimos carinho, amor e desejamos fortemente que a vida lhes sorria ou cerramos os dentes e só nos apetece enfiar-lhe um murro na cara, mesmo tendo noção de que são apenas assim porque talvez não foram capazes de lutar contra um nascimento já amaldiçoado. O estilo do autor é também muito bom, pois molda todos os ingredientes já referidos e transforma-os numa história mesmo muito boa, que não leva a pontuação máxima apenas porque, na minha opinião, o clímax da mesma foi demasiado precoce.
Em fevereiro, terminei ainda Marcada para morrer, obra que gentilmente me foi oferecida pela editora Clube do Autor. Volto a referir que não sou, de perto nem de longe, uma leitora assídua de policiais ou de thrillers, mas não quis deixar passar a oportunidade que me foi dada com o envio da obra e lancei-me a ela. Sabia de antemão que este era um volume de uma saga protagonizada pelo detetive Roy Grace e que, como tal, haveria aspetos da sua vida que apenas poderia conhecer melhor se já tivesse lido os volumes anteriores. Porém, essa falta de informação não prejudicou a leitura de Marcada para morrer, pelo contrário, fez-me ter mais vontade de continuar a ler e de esperar com alguma ansiedade o volume que ainda há-de ser publicado (espero bem que sim) num futuro breve. Quanto à intriga em si, Marcada para morrer debruça-se sobre o raptos de jovens mulheres perpetrados por um assassino em série que, como tudo indica, voltou a atacar passados mais de trinta anos e cabe à equipa de Roy Grace atar os fios que unem esse lapso temporal e resolver o caso. É uma leitura interessante, com uma escrita direta e limpa, mas peca pela demasiada informação técnica e forense e por um número exagerado de personagens que, se fossem reduzidas para metade, faria com que a leitura fosse mais fluída.

Aproveito este balanço, antes de passar para os livros novos que chegaram em fevereiro, para inchar outra vez de orgulho e relembrar que, pela primeira vez, publiquei no blogue um texto da autoria do meu filho sobre uma das suas leituras. Falo da obra Gato Galáctico – a minha vida animada e da tremenda gulodice com que o D. a devorou e na consequente e espontânea vontade com que ele se dirigiu a mim e me disse que tinha que publicar um texto no blogue sobre a sua leitura. E assim foi. Sentei-me ao computador e escrevi aquilo que ele me foi ditando, sempre com um sorriso nos lábios, pois percebi nele todos as emoções que também eu sinto quando uma leitura me deveras preenche. Sou mesmo uma mãe babada!

Quanto aos habitantes novos da estante, eles são apenas três e todos eles foram ofertas. Continuo firme na minha decisão de controlar gastos, de resistir estoicamente às tentações e, por isso, não gastei um tostão com leituras para mim. Da editora Clube do Autor, recebi Deixa-me odiar-te, de Anna Premoli. Para comemorar uma data muito especial para nós, o maridinho ofereceu-nos aos dois Os loucos da Rua Mazur, de João Pinto Coelho. Por fim, da avó, o D. recebeu a obra que já leu e devorou – Gato Galáctico, a minha vida animada, de Ronaldo de Azevedo. Mês pequenino, ofertas também elas em número pequenino, mas quantidade muitas vezes não é sinónimo de qualidade, não é verdade?

Remato este balanço referindo que vou copiar a ideia de algumas bloggers e fazer de março um mês apenas dedicado a leituras de obras escritas por autoras, ou seja, leituras no feminino. Pretendo ler as seguintes obras:
§  O retorno, de Dulce Maria Cardoso (já lido)
§  A contadora de histórias, de Jodi Picoult (a ler)
§  A vida inútil de José Homem, de Marlene Ferraz
§  A herdeira dos olhos tristes, de Karen Swan
§  Jane Eyre, de Charlotte Brontë
§  Tanta gente, Mariana, de Maria Judite de Carvalho
Se o trabalho não tomar demasiado conta dos meus dias, talvez leve este projeto a bom porto. A ver vamos!

Por fim, como é normal, deixo-vos os links para acederem à opinião completa das obras lidas em fevereiro:
§  O labirinto dos espíritos, de Carlos Ruiz Zafón
§  Os Malaquias, de Andréa del Fuego
§  O pecado de Porto Negro, de Norberto Morais
§  Marcada para morrer, de Peter James
§  Gato Galáctico – a minha vida animada, de Ronaldo de Azevedo

E vocês, que leram? E que pretendem ler em março? Fico à espera das vossas respostas!

Marcada para morrer, de Peter James



Ficha técnica
TítuloMarcada para morrer
Autor – Peter James
Editora – Clube do Autor
Páginas – 472
Datas de leitura – de 19 a 25 de fevereiro de 2018

Opinião
Segunda leitura de um romance policial em menos de quatro meses. Feito considerável para alguém que não é a maior apreciadora do género. E tudo por causa da extrema generosidade da editora Clube do Autor, que me vai enviando este género de romances e assim me vai espicaçando e levando à sua leitura.
Após ter lido O bibliotecário de Paris e este Marcada para morrer tenho que afirmar que continuo a não ser a maior apreciadora de policiais e thrillers. Mas também tenho que afirmar que começo a constatar que ler este tipo de romances permite-me fazer um parêntesis em leituras mais densas, complexas, pesadas e dessa forma continuar a alimentar o meu vício com narrativas mais leves, mais diretas e que me entretêm sem se tornarem enfadonhas.
Já conhecia este autor através do que vou “cuscando” nos blogues que vou seguindo com dedicação. Sabia que Marcada para morrer faz parte de uma saga protagonizada por Roy Grace, detetive principal da polícia de Sussex e que, por muito que os casos que o mesmo investiga sejam diferentes, o facto de estar apenas a conhecê-lo no volume onze da saga não me iria permitir saber muito da sua vida. E comprovei-o à medida que ia lendo a obra, pois fiquei ao corrente de que Roy está casado pela segunda vez, tem um filho bebé, mas ainda sente que está acorrentado ao seu primeiro casamento, à sua primeira mulher, Sandy, que desapareceu sem deixar rasto. Ora, como devem compreender, fiquei algo desapontada por não ter como saber o que aconteceu a Sandy, por que razão desapareceu ou como Roy refez a sua vida, se apaixonou por Cleo e quer pôr para trás uma vida que crê estar completamente terminada com o desaparecimento de anos da sua primeira mulher.
É óbvio que, sendo como sou, não fui capaz de pôr de parte esse pequenino descontentamento. No entanto, tentei que o mesmo não prejudicasse o que de verdade compõe a narrativa de Marcada para morrer – o caso de um assassino em série, que rapta mulheres jovens, as marca com a expressão “Quero-te morta”, as mata e as vai largando em vários locais. E acho que o consegui, porque fui seguindo com bastante interesse os passos da polícia e do próprio assassino, acumulando dados e tentando, eu própria, descobrir quem seria na verdade o homem que estava por detrás do rapto, tortura e morte de um leque de jovens bonitas. E sim, acho que fui mais rápida que Roy Grace, pois as minhas desconfianças iniciais revelaram-se certeiras. Para quem é inexperiente nestas andanças policiais, até que não me estou a sair nada mal!
Sem querer revelar muito mais, digo que, no geral, gostei bastante desta leitura, sobretudo de Roy Grace, do seu passado (que adoraria conhecer melhor), da sua personalidade cativante e do interesse e empenho que coloca na resolução dos casos. Acho, porém, que a narrativa seria mais fluída e captaria ainda melhor a atenção do leitor se o seu ritmo não fosse, como é, prejudicado pela minuciosidade na descrição dos procedimentos policiais e pela quantidade algo exagerada de personagens que a povoam. São realmente muitas, sobretudo as secundárias, e é muito difícil conseguirmos recordar-nos de todas e saber quem é quem.
Remato esta opinião dizendo que gostaria muito de ler o próximo volume (que seguramente será escrito), já que fiquei curiosa sobre como será o futuro de Roy Grace face aos acontecimentos e revelações que encerram esta obra.
Agradeço, uma vez mais, à editora Clube do Autor que me enviou esta obra em troca de uma opinião sincera.

NOTA – 07/10

Sinopse
Escutou-a a gritar. Um grito aterrador. Depois instalou-se o silêncio.
Primeiro, há uma mulher raptada. Depois, surgem os corpos assassinados, uns no passado e outros no presente. No final, a perversidade por trás destes crimes vai surpreendê-lo e arrepiá-lo.
Até que ponto um passado tortuoso é capaz de gerar uma mente monstruosa e vingativa? O que fazer quando o pior mal existe naqueles em quem mais confiamos?