Ficha técnica
Título – Deixarás
a Terra
Autor – Renato Cisneros
Editora – Planeta
Páginas – 280
Datas de leitura – de 10 a 16 de fevereiro de 2019
Opinião
Entre o final de 2018 e o princípio de
2019, deambulando pelo Youtube, descobri uma booktuber mexicana (El librero de Valentina) e fiquei
rendida ao seu entusiasmo, à sua vivacidade e ao amor que transpira pelos
livros. O primeiro vídeo que vi seu foi, por casualidade, aquele onde ela
partilhava com os seus subscritores as melhores leituras do ano que estava ou
havia terminado há pouquinho tempo. Vários livros me chamaram a atenção, mas
houve um escritor peruano que se destacou e que vim a saber estar traduzido no
nosso país. Falo-vos, como é óbvio, de Renato Cisneros que é autor de La
distancia que nos separa e deste livro que terminei de ler há dias.
Quando me dei conta de que a editora
Planeta tinha publicado, em dezembro de 2017, Deixarás a Terra, decidi arriscar e enviei-lhes um e-mail a
pedir um exemplar da obra. Fiquei muito feliz quando eles acederam ao meu
pedido e planeei ler muito em breve a história que envolve um segredo que selou
durante duzentos anos o mistério de uma família.
Recebi o livro em meados de janeiro e
um mês depois li-o. Da correspondente leitura tenho que dizer, em primeiro
lugar, que pouco ou nada sabia da trama, a não ser que a mesmo se iria espraiar
até ao passado e que abordaria a história de uma família e um segredo que poderia
(ou não) ditar essa mesma história. Gosto muito de entrar às cegas nas
narrativas e com esta não foi exceção.
A trama está dividida em três partes e
vai saltitando do presente para vários momentos do passado que vão chegando até
nós cronologicamente. Recuamos até 1828 e de imediato entendemos qual o segredo
que “mancha” o destino da família Cisneros. Nos saltos que vamos dando ao
presente percebemos que o recuo nos leva até aos tetravós do narrador e que
este pretende finalizar aquilo que o seu tio Gustavo começou – pôr a nu esse
mesmo segredo e o quanto ele moldou, influenciou, aprisionou e embotou as ações
e carácter de todas as gerações seguintes.
Confesso-vos que a primeira parte da
obra estava a ser agradável, mas não mais do que isso. Foi necessário chegar
mais perto do presente, sair da anos iniciais do século XIX, entrar na parte
dois da narrativa para sentir o meu entusiasmo a crescer e para perguntar-me
algo que, até ao momento, não me tinha passado pela cabeça – será que esta
família Cisneros tem alguma coisa a ver com o autor, Renato Cisneros? E será
que estas pessoas, estas personagens masculinas existiram na realidade ou o
autor está a inventar uma família que, por coincidência, tem o mesmo apelido
que ele? Fiz estas mesmas perguntas ao “tio” Google e, para meu espanto, as
respostas foram afirmativas.
Ora, perante isto, entendem que a minha
perspetiva de leitura mudou, teve que mudar, pois estava a ler a obra como se
ela fosse inteiramente de ficção e, ao dar-me conta de que ela é, apesar de
romanceada (creio eu), não-ficção, a abordagem teria que ser diferente. Para
além disso, à medida que nos aproximávamos do presente, as histórias, as vidas
dos antepassados de Renato Cisneros foram tornando-se mais empolgantes e as
alternâncias com o presente muito mais complexas, com o narrador a abrir-se
mais e a explicar-nos no fundo o porquê de ter decidido partilhar com o mundo
os segredos e o lado menos bonito de uma família que sempre esteve associada à
História do Peru como país independente, às suas relações diplomáticas e
sobretudo às suas letras e literatura.
Renato Cisneros quis saber quem ele é
de verdade, de que forma o peso do passado, dos segredos familiares, de um
apelido ilustre moldam alguém e essa demanda foi aquilo que mais me prendeu e
agradou nesta leitura. “Acabou-se o
mistério”; “Invadiu-me então um
sentimento estéril. De triunfo e derrota simultâneos.”; “(…) senti ou soube que aquela seria a última
fronteira que teria que transpor em muito tempo.” (págs. 275, 276)
Não sou a leitora mais adequada ou mais
habilitada para livros de não-ficção simplesmente porque não são os meus
preferidos e porque não os leio com muita frequência. Porém, gostei muito de
ler este livro, gostei muito de percorrer alguns espaços do Peru, de saber mais
sobre a sua História, de conhecer algumas das suas personalidades influentes e
sobretudo de passagens onde o autor/narrador expõe aquilo que o levou a
escrever este livro e a querer conhecer-se através dos seus. Assim sendo tenho
que recomendar este livro aos amantes do género e àqueles que, como eu, sentem
aquele lado do mundo – América Latina – como um espaço que nos toca de forma
especial. Não se vão arrepender se derem uma oportunidade a esta obra e poderão
apreciá-la ainda mais do que eu.
Termino agradecendo – e muito – à editora
Planeta que gentilmente me enviou a obra em troca de uma opinião sincera.
NOTA – 09/10
Sinopse
Um
silêncio antigo selou durante 200 anos, o mistério de uma família muito
semelhante às tragédias e ambições do Peru. Este romance recorda-nos que as
famílias estão feitas de tudo o que escondem e que só uma prosa capaz de
atravessar o visível e o soterrado pode rastear o caudal a que chamamos
identidade. «As nossas famílias, como em qualquer sociedade conservadora e
tradicional, querem calar certos assuntos que não convém trazer à luz e fi-lo
[este livro] através de um romance como forma de não pôr em evidência a
família, mas de pôr em evidência todas as famílias.»