Quinta-feira, 23 de outubro de 2014
Sinopse
O leitor vai encontrar a história
comovente do menino Zezé, de seis anos, um rapaz pobre, inteligente, sensível e
carente. Com a falta de afeto que não encontra na família, o endiabrado rapaz
vai pelas ruas fazendo mil travessuras. Zezé aprende tudo sozinho, é o
descobridor das coisas. Descobre a ternura e o carinho no amigo Portuga.
Inventa para si um mundo de fantasias em que o grande confidente é o Xururuca,
o pé de Laranja Lima. Mas a vida ensina-lhe tudo demasiado cedo, e Zezé
descobre o que é a dor e a saudade - Por que contam coisas às criancinhas?...
Opinião
Quinta-feira
à noite, já deitadinha na cama, acabei de ler Meu pé de laranja lima. E ao ler as últimas páginas deste
enternecedor romance não controlei o choro… As lágrimas correram-me pela cara
abaixo e, por muito que as tentasse controlar, não fui capaz… Nem consegui
controlar os soluços que tiveram o poder de abanar a cabeceira da cama e fazer
com que o meu maridinho interrompesse a sua leitura e me dirigisse a olhadela
habitual… a olhadela divertida e carinhosa que sempre me dirige quando choro “baba
e ranho” ao ler um livro, ao ver um filme, ao assistir a alguma reportagem “sensível”,
enfim… A seguir, fez-me a pergunta, a pergunta mil vezes repetida – “Se sabes
que te vai fazer chorar, por que é que lês esse género de livros?...” E eu dei-lhe
a resposta, a mil vezes repetida resposta – Porque essa alternativa não se põe,
não se pode pôr para alguém como eu, que sabes que vê a leitura como mais uma
porta para viver e entender a vida, a vida tal como ela é, com todas as suas
facetas, reais, alegres, entusiasmantes, intensas, apaixonadas, sensaboronas, rotineiras,
insignificantes, cruas, tristes, dolorosas… E se tiver que chorar ao ler um
livro, que assim seja, porque estou a sofrer as dores da personagem, estou a
relembrar dores minhas, a comparar a realidade com a ficção e, dessa forma, a
usufruir da vida, da minha e da dos outros, e a crescer como pessoa!... É essa a magia da literatura!
Meu pé de laranja lima é um
romance autobiográfico e conta-nos a infância de Zezé, um miúdo especial e ao
mesmo tempo traquinas, sonhador, inocente como é normalmente um miúdo de cinco,
seis anos. Provém de uma família pobre e numerosa, que sofre com o desemprego
do pai e a vida desalentada e cansada da mãe. Contudo, Zezé faz de tudo para
fugir a essa realidade negra e inventa para si, e para o seu irmão mais novo, um
mundo imaginário, onde o quintal e o galinheiro fazem parte de um Jardim
Zoológico, os galhos das árvores são selas de cavalos de cowboys e um pé de
laranja lima é o seu melhor amigo e confidente. Infelizmente, nem sempre o
imaginário é um escape perfeito e aí Zezé apanha surras monumentais, que o
levam a acreditar no que todos dizem dele – que é o afilhado do diabo e que por isso
nunca receberá prendas no Natal…
Por
tudo isto e por muito mais, é IMPOSSÍVEL não gostar, não sentir um carinho
enorme e não sofrer com Zezé… O meu coração ficou apertadinho quando li as
passagens que descreviam essas surras, no entanto maravilhou-se com as
passagens que testemunhavam a brilhante inteligência de um miúdo pobre,
carente, mas que aprende a ler sozinho, que é posto na escola aos cinco anos
para que a família pudesse descansar durante essas horas letivas, que se torna
no melhor aluno da sala, que rouba uma flor todos os dias para deixá-la na
jarra da secretária da professora (que nunca havia recebido tal miminho, talvez
por não ser bonita), que trabalha um dia inteiro de engraxador para poder
compensar o pai e comprar-lhe o maço de tabaco de que ele tanto gosta, que toma
conta “direitinho” do seu irmão mais novo e que FINALMENTE descobre o que é ser
amado e acarinhado (como um filho o deve ser por um pai) no momento em que se
torna amigo do “Portuga”, Manuel Valadares.
As
passagens que descrevem esta amizade são as mais belas e as mais dolorosas da
obra, talvez porque, tal como diz o autor nas dedicatórias e no último capítulo,
Manuel Valadares mostrou-lhe, aos seis anos de idade, o significado da ternura…
E como o fez! E fê-lo de uma forma singela, pura, mágica, como Zezé bem o
merecia…
Pelo que foi dito até aqui, é mais do que óbvio que esta obra (que me fez lê-la com sotaque brasileiro – era impossível
não o fazer, o texto “chegava” à minha cabeça com esse sotaque açucarado J)
ganhou um cantinho muito especial na minha estante e só posso recomendar
vivamente a sua leitura a todos que se queiram apaixonar pelo Zezé e assim
conhecer uma história intemporal e MUITO ENTERNECEDORA!!!
Tenho que agradecer à minha querida amiga
Beta que me recomendou a sua leitura (gracias, cariño) e aos meus compadres que
me ofereceram a obra!
“Você precisa saber que o coração da gente tem que ser
muito grande e caber tudo que a gente gosta.” (pág. 123)
“Agora sabia mesmo o que era a dor. Dor não era
apanhar até desmaiar. Não era cortar o pé com caco de vidro e levar pontos na
farmácia. Dor era aquilo que doía o coração todinho, que a gente tinha que
morrer com ela, sem poder contar para ninguém o segredo.” (pág.
174)