Ficha técnica
Título – Meridiano
28
Autor – Joel Neto
Editora – Cultura Editora
Páginas – 420
Datas de leitura – de 03 a 10 de setembro de 2018
Opinião
Apaixonei-me
por Joel Neto quando li Arquipélago.
Foi uma leitura sublime, onde tudo está magistralmente orquestrado e que
continuo a recomendar muitíssimo. A Arquipélago seguiu-se-lhe A vida no campo, num registo
distinto, de não-ficção e que me fez aumentar ainda mais a vontade, já de si
tremenda, de conhecer a ilha Terceira e de continuar a ler Joel Neto.
Quase
dois anos depois dessas duas leituras, voltei a ter Joel Neto nas minhas mãos.
Fui seguindo as pistas e indicações que o autor foi deixando nas redes sociais
e na imprensa sobre a publicação de Meridiano
28 e nem imaginam o meu contentamento e euforia quando, por fim, em
maio deste ano, comprei a obra (autografada e tudo) e a coloquei na minha
estante. Aqueles que estão a par da minha mania das leituras cronológicas devem
estar agora mesmo a questionar-se sobre como foi possível eu ter lido em
setembro uma obra que apenas havia comprado 3 meses antes. A culpa é de uma das
categorias da maratona Bookbingo,
que “me obrigou” a retirar da estante um livro que tivesse um número no título.
Meridiano 28 era a mais antiga
que morava cá em casa e que encaixava nessa categoria, por isso não tive outro
remédio que não lê-la antes da sua vez ;)
Meridiano
28 é o meridiano que atravessa o arquipélago dos Açores. Contudo, em termos
literários é isso e muito, muito mais. Centra-se, como é óbvio, nesses
torrõezinhos de terra que pertencem ao nosso país, sobretudo na ilha do Faial e
faz-nos viajar a uma época que, como sabem, me fascina desde sempre – a Segunda
Grande Guerra. Contudo, estaria a ser injusta se apenas dissesse isso sobre
esta obra que, confesso já, me arrebatou.
A
narrativa arranca em 2107. José Filemom Abke Marques (que nome maravilhosamente
sui generis) enterrou o seu tio há poucos dias e recebe uma estranha visita na
sua loja de informática. Não é a primeira vez que se encontra com aquele velhote
que parece ser gémeo do ator Morgan Freeman, mas tudo faz para não dar a
entender que o reconheceu. Tão-pouco se deixa tentar (pelo menos naquele dia)
pela caixa que o misterioso homem lhe entrega e que, segundo ele, contém
material relevante para que José termine o que prometeu fazer há mais de vinte
anos, na biblioteca de uma luxuosa mansão dos arredores de Nova Iorque.
Este é
o preâmbulo para uma trama que se molda com uma brilhante mistura de mistério,
suspense, momentos históricos, viagens entre vários pontos do mundo, um
equilíbrio perfeito entre presente e passado, dois homens protagonistas e
provenientes da mesma família, deliciosas personagens secundárias e os Açores,
esse arquipélago místico, mágico e que me atrai cada vez mais e mais.
Desengane-se
quem pega em Meridiano 28 e
espera encontrar nas suas 420 páginas uma narrativa de ritmo vertiginoso típica
de um thriller ou romance de ação. Desengane-se igualmente quem crê, perante a
lista gigantesca de personagens presente nas primeiras páginas, que se vai
baralhar e perder-se no meio de tanta gente. Por fim, desengane-se quem acha
que vai encontrar apenas uma narrativa de mistério ou apenas uma narrativa
histórica. Meridiano 28 é uma
amálgama brilhantemente urdida pelo autor e não defraudará nenhum leitor que
busca o imprevisível, que procura narrativas que vão deixando cair, pouco a
pouco, o pano e que são habitadas por personagens redondas, imperfeitas, algo
banais, mas que nos agarram e se mantêm connosco durante muito tempo.
Para
além de tudo isto que já referi, a obra agradou-me e conquistou-me pelo seu
lado histórico e geográfico. Tenho, como já mencionei vezes se conta, um
fascínio enorme pela Segunda Grande Guerra, mas até ter lido Meridiano 28, não tinha a mais
pálida ideia de como este conflito tinha chegado às ilhas açorianos e de que forma
tinha marcado as suas terras e os seus habitantes. Foi, assim, maravilhoso
descobrir que na pequena ilha do Faial ingleses e alemães conviveram em paz
durante os primeiros três anos da Guerra e que na Horta estavam instaladas
importantes bases de uma das mais importantes redes de comunicação da época – a
da telegrafia. Para além disso, através das deambulações dos dois protagonistas
da obra – o já referido José Filemom e o seu tio, Hansi – pude conhecer a baía,
ruas e outros locais da cidade da Horta e pude percorrer espaços da ilha como o
Porto Pim, o Capelo e apreciar a beleza estonteante de um torrãozinho plantado
em pleno Atlântico, sempre de olhos postos no Pico e na sua majestosidade. Por
fim, pude experimentar o lado vulcânico da ilha, os seus tremores de terra e as
suas erupções de grandes proporções.
Não
quero terminar esta opinião (que já está gigante) sem abordar aquilo que acho
ser o ponto fulcral de uma boa narrativa. Falo das suas personagens e nesta, na
de Meridiano 28, as
personagens, todas elas, estão muito bem construídas e é impossível ficar
indiferente a José Filemom, à sua orfandade de emoções, à sua demanda de saber
quem foi na verdade o seu tio Hansi (e saber igualmente quem é ele próprio) e
ao desfecho que lhe reserva o autor. Aliás, o epílogo da obra é brutal e quando
digo brutal não significa que nos deixe estarrecidos. É brutal, porque traz
respostas, traz apaziguamento e fecha muitas portas que precisavam de ser
fechadas. Gostei muito da personagem do José, comunguei da sua satisfação
quando deu aquelas bofetadas (de luva branca) nas derradeiras páginas da obra,
gostei imenso da Alice, do Fernando/Carlos Ponta-Garça e nutri um carinho que
foi gradualmente crescendo por Hansi, pelo jovem e não menos jovem Hansi.
Termino
(agora sim) dizendo que valeu a pena esperar dois anos por esta nova obra de
Joel Neto. Está madura, consistente e muito bem conseguida. Recomendo-a
vivamente, tal como o faço para as outras obras que já li do autor!
Esta
foi a décima quinta leitura que fiz para a maratona literária Bookbingo – Leituras ao sol 2 – e foi
para a categoria Livro com um número no
título.
NOTA – 9,5/10
(apenas porque continuo a gostar um bocadinho mais de Arquipélago)
Sinopse
Em 1939, o mundo entrou em
guerra. Foi o conflito mais mortífero da história da humanidade. Mas, na
pequena ilha açoriana do Faial, ingleses e alemães conviveram em paz durante
mais três anos. Eram os loucos dos cabos telegráficos.
Do mar em frente emergiam os
periscópios de Hitler. Dezenas de navios britânicos eram afundados todos os
meses. Já em terra, as crianças inglesas continuavam a aprender na escola
alemã, dividindo as carteiras com meninos adornados de suásticas. As famílias
juntavam-se para bailes e piqueniques.
Os hidroaviões da Pan American
faziam desembarcar estrelas do cinema e da música, estadistas e campeões de
boxe. Recolhiam-se autógrafos. Jogava-se ao ténis e ao croquet. Dançava-se o
jazz. Viviam-se as mais arrebatadoras histórias de amor.
Poderia um agente nazi ter-se
escondido nos Açores, consumada a derrota de Hitler? Quem foi Hansi Abke? Que
sombra lança hoje sobre o destino de José Filemom Marques, o sobrinho criado no
Brasil?
Um romance que vai de Lisboa a
Nova Iorque, de Friburgo a Praga, de Bristol a Porto Alegre e às ilhas
açorianas, onde todos são descobertos e ninguém pode ser apanhado. Um
reencontro entre dois homens de tempos distintos e que talvez tenham mais em
comum do que aquilo em que gostariam de acreditar. Uma memória das mulheres que
amaram e talvez não tenham sabido fazê-lo.