Sábado, 25 de abril de 2015
Opinião
Com a celebração do quadragésimo
primeiro aniversário da Revolução de Abril como pano de fundo, encerrei a
leitura de Recomeçar de María
Dueñas.
Sabia de antemão, por conversas
partilhadas com compinchas e amigas literárias, que esta segunda obra da autora
espanhola não me ia deslumbrar como a da sua estreia – a magnificamente
arrebatadora O Tempo entre costuras.
Na verdade, Recomeçar teria
que ser um romance quase perfeito, tal foi a sofreguidão com que li a história
do seu antecessor e me entreguei nas mãos da sua protagonista, seguindo-a como
uma sombra por terras marroquinas, espanholas e portuguesas e absorvendo a sua
fascinante história de vida.
Contudo, tentei pôr estas comparações
de lado e dar uma oportunidade o mais imparcial possível à narrativa que a
própria autora assim apresentou: «Três
anos depois da publicação de O
Tempo entre Costuras, volto a bater à porta dos leitores com a
história e a voz de uma mulher. Uma mulher contemporânea, cuja estabilidade,
aparentemente invulnerável, se desvaneceu no ar. Chama-se Blanca Perea e
decidiu fugir».
Com um ritmo muito mais desacelerado, Recomeçar está escrito
maioritariamente na primeira pessoa e transporta-nos para Madrid dos finais do
século, mais propriamente para o ano de 1999, mas em poucas páginas faz-nos
atravessar o oceano, os Estados Unidos e deixa-nos em Santa Cecília,
Califórnia, onde se desenrolará grande parte da sua ação. Será lá que aterrará
Blanca Perea, que, num impulso, aceita “uma missão universitária” a milhares de
quilómetros da sua cidade natal para fugir de uma vida matrimonial desfeita a
qual, num repente, a deixou sem chão e sem norte. Com um trabalho enfadonho,
entediante e desinteressante (ordenar e organizar o espólio de um professor
universitário, seu conterrâneo e já falecido) e enfiada num minúsculo gabinete,
quase sem comunicação com o exterior, Blanca tenta viver (ou talvez sobreviver)
dia após dia, fazer o que tem a fazer, não dar descanso ao corpo para que
depois possa deitar a cabeça na almofada e dormir para esquecer…
Contudo, por muito que lutemos contra
a vida, por muito que tentemos construir defesas que nos permitam não voltar a
sofrer, é impossível não trocar umas palavras com quem se cruza connosco todos
os dias, não apreciar a beleza de um magnífico dia de sol, não sorrir perante
uma turma de alunos entusiasmadíssimos por aprender mais sobre a língua e
culturas espanholas e não baixar a guarda perante um convite quase irrecusável
de uma colega que nos afaga com um sorriso e uns olhos cheios de compreensão.
Blanca é apenas humana e, pouco a pouco, deixa de sentir os seus dias
maioritariamente preenchidos por ressentimento, estupefação e dor e abre-os a
novas experiências, a novas amizades e à convivência com papéis, apontamentos e
textos que a fazem querer conhecer mais e melhor a vida pessoal e universitária
do seu conterrâneo, Andrés Fontana.
Neste ponto, parece-me importante
referir que, para mim, o referido ritmo mais desacelerado desta obra se coaduna
muito bem com o quanto custa recomeçar, deixar para trás o que era até então a
nossa vida e ter que reestruturarmo-nos e começar de novo. É um recomeço que é
sempre lento, doloroso e feito passo a passo, mais a mais quando a sua
protagonista é uma mulher madura, experiente, menos ingénua e menos otimista
face ao futuro.
Não deixo de concordar com algumas
críticas/opiniões que afirmam que Recomeçar falha como romance por ser um pouco
previsível, por pecar no pouco que nos oferece de mistério, de passagens
estimulantes e de um ritmo intrépido e por possuir fragmentos que podiam ser
eliminados. Contudo, também não posso deixar de contrabalançar esse lado menos
positivo e realçar o quanto gostei de acompanhar muito de pertinho o recomeçar
de Blanca e de seguir a evolução de outra personagem importante – Daniel Carter
– sobretudo o “largo recorrido” que realizou por uma Espanha em plena ditadura
franquista. Um “largo recorrido” que a ele o fez apaixonar-se ainda mais por
esse país e a mim me fez, mais uma vez, agradecer a liberdade que se comemora
no dia de hoje.
NOTA – 08/10
Sinopse
Recomeçar atravessa
fronteiras e épocas para nos falar de perdas, coragem, segundas oportunidades e
reconstrução. Uma história luminosa que desenrola intrigas imprevistas, amores
entrecruzados e personagens cheias de paixão e humanidade.
Blanca é professora, com uma carreira consolidada, dois filhos jovens. A braços com o fracasso do seu casamento, decide deixar a sua atual vida para trás e ruma a Santa Cecília, na Califórnia, com a missão de organizar o espólio deixado por Andrés Fontana à Universidade; fechada num sótão sombrio, Blanca vê- se a braços com uma tarefa aparentemente hercúlea e cinzenta, mas que acabaria por revelar-se uma empreitada emocionante.
Amores cruzados, certezas e interesses silenciados que acabam por vir à tona, viagens de ida e volta entre Espanha e EUA, entre o presente e o passado de duas línguas e dois mundos em permanente reencontro.
Blanca é professora, com uma carreira consolidada, dois filhos jovens. A braços com o fracasso do seu casamento, decide deixar a sua atual vida para trás e ruma a Santa Cecília, na Califórnia, com a missão de organizar o espólio deixado por Andrés Fontana à Universidade; fechada num sótão sombrio, Blanca vê- se a braços com uma tarefa aparentemente hercúlea e cinzenta, mas que acabaria por revelar-se uma empreitada emocionante.
Amores cruzados, certezas e interesses silenciados que acabam por vir à tona, viagens de ida e volta entre Espanha e EUA, entre o presente e o passado de duas línguas e dois mundos em permanente reencontro.