Sexta-feira, 26 de dezembro de 2014
Sinopse
Um jovem decide deixar a casa da sua
infância, o irmão autista, o pai octogenário e as paisagens familiares de
campos de lava cobertos de musgo, em busca de um futuro desconhecido.
Pouco antes da sua partida recebe um
terrível telefonema: a mãe falecera num acidente de carro. As suas últimas
palavras tinham sido de doce conselho ao filho, incitando-o a continuar o
trabalho que partilhavam na estufa, mais especificamente o cultivo de uma
variedade de rosa rara, a Rosa Candida.
Antes da morte da mãe, naquela mesma
estufa, vivera um breve encontro de amor. Foi quando já preparava a sua partida
que soube que, nessa noite, concebera inocentemente uma criança. Atordoado com
todos estes súbitos acontecimentos, procura refúgio, recolhendo-se num
majestoso jardim abandonado de um antigo mosteiro europeu. É aí que se vai
dedicar a fazer florescer aquela rosa rara de oito pétalas. Ao concentrar a sua
energia no seu cultivo, aprende também, sem dar por isso, a cultivar o amor.
Rosa
Candida é
a história de um jovem que assume o papel de pai ao mesmo tempo que se torna
homem. Uma história de amadurecimento, sobre a beleza da vida e a forma como
pequenas e simples experiências podem muitas vezes transformar a realidade numa
extraordinária e incomum vida. Um livro impressionante que nos faz perceber que
mudar, por vezes, é tudo o que precisamos...
Opinião
Rosa Candida não foi o primeiro
livro desta autora (de nome “impossível” de dizer – e de escrever!) que me “piscou
o olho”! Uma vez mais, numa das muito frequentes visitas que faço aos sítios
das “minhas editoras”, “tropecei” na sinopse da última obra publicada pela
autora – La excepción,
considerada o seu melhor romance até à data. Contudo, como podem perceber pelo
título, o referido romance ainda não está traduzido para português… Sendo
assim, prossegui as minhas nada penosas deambulações pelos habituais sítios e
felizmente descobri que a editora Marcador havia publicado outro romance desta
autora islandesa, que não só me seduziu pela sua capa lindíssima como também
pela sinopse e pelo facto de haver sido traduzido e recomendado por João Tordo!
Aproveitei
uma das recorrentes promoções da Betrand (que são sempre bem-vindasJ) como
desculpa para adquirir Rosa Candida,
mas a ordem cronológica que “ordena” as minhas leituras apenas me permitiu que
o lesse nesta época natalícia.
A
viagem que nos oferece a narrativa deste livro começa na ilha natal da autora,
onde conhecemos o protagonista (também ele dono de um nome impronunciável, mas
tratado carinhosamente pelo pai de Lobbi), o qual nos põe a par da sua história,
passada, presente e do único projeto que quer concretizar – sair de casa dos
pais para ir viver durante uma temporada numa povoação, perdida num país que
não sabemos qual é, e assim poder pôr em prática o sonho que partilhava com a
mãe – cultivar uma variedade de rosa rara, a Rosa Candida, no considerado mais belo jardim de rosas do mundo.
Não
é de forma inconsciente que afirmo que a obra nos dá a possibilidade de
acompanhar a viagem de Lobbi, a viagem da sua vida, uma viagem física, que o
leva para longe do seu país, da sua casa, do seu ninho (onde já não mora a sua
mãe, o coração daquele lar, a quem Lobbi era mais chegado), mas também uma
viagem espiritual e de crescimento, que transformará o nosso protagonista, que
o fará deixar de ser uma criança grande para tornar-se um adulto capaz de tomar
decisões por si mesmo, de tomar conta de si, de ser independente e de responsabilizar-se
pelas suas ações.
Como
leitora, fui compreendendo que, através de uma linguagem muito simples, sem
artifícios, aliada a um rol de acontecimentos que sacodem inesperadamente as
vidas de Lobbi e dos que o rodeiam, este romance parece querer mostrar-nos que
não devemos fugir, que não devemos desistir, que devemos retirar uma lição de
tudo o que de bom e mau nos acontece, que a vida é tão delicada e rara como uma
rosa de oito pétalas, que pode não florescer numa terra vulcânica e agreste
como a Islândia, mas que, se for transportada com carinho e amor, pode
sobreviver aos tumultos de uma viagem e encontrar o seu jardim, o seu futuro, a
sua razão de existir longe de tudo o que nos é familiar, num terreno abandonado
e maltratado, mas que ainda possui no seu âmago o que necessita para renascer.
Ainda
como leitora, posso acrescentar que gostei de ler este livro. Gostei, tal como
já referi, da evolução que se vai dando, ao longo da narrativa, na vida de
Lobbi; da relação especial que ele teve com a mãe, de como ela influencia e
guia as suas ações e pensamentos, mesmo já não estando viva; da forma
paternalista como trata o pai; da delicadeza com que ele trata os pés de rosa
que transporta consigo durante a viagem; e do tumulto de emoções que sente
aquando do nascimento da sua filha, Flóra Sól. Gostei sobretudo da maneira atabalhoada
(e posteriormente quase perfeita) como Lobbi trata de Flóra Sol e da mãe desta
e como a ideia de família começa a encaixar-se na sua vida de até há bem pouco
tempo filho da mamã e do papá, sem mais preocupações que as de um amante de
rosas.
Rosa Candida é
assim um livro que se lê com gosto, que nos entretém, que nos faz espreitar
(como se fosse pelo buraco de uma fechadura) para um país que, pelo menos para
mim, é quase desconhecido e que nos envolve como um ternurento e delicado conto
de fadas. Tem alguns aspetos de que não gostei tanto, principalmente aqueles
associados a alguma irrealidade que mexe com o meu lado cético – por exemplo, a
ausência de referências que localizem geograficamente os locais da viagem de
Lobbi. No entanto, consigo entender que essa irrealidade talvez seja
propositada, que queira combater, como nos diz João Tordo, o realismo demasiado
cru da literatura a que estou mais acostumada…
Por
fim, e tal como já é habitual, deixo aqui algumas das passagens que fui
sublinhando:
“Sempre
que queria estar sozinho com a minha mãe, ia ter com ela à estufa ou ao jardim.
Era aí que podíamos falar. Por vezes ela parecia distraída e eu perguntava-lhe
em que estava a pensar, ela dizia: Sim, sim, gosto do que dizes. E depois
oferecia-me um sorriso encorajante de aprovação.” (Pág.
20)
“Ter um filho dá-te a certeza de que um dia
irás morrer”. (pág. 126)
“Os nossos corpos tocam-se, mas, por mais
próximos que estejamos na cama, há um mar imenso que nos separa na solidão de
cada. Sinto que a estou a perder, como perdi a minha mãe ao telefone (…)”
(pág. 335)
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