Os Pássaros de Seda, de Rosa Lobato Faria

Quinta-feira, 22 de janeiro de 2015




Sinopse
Graças à qualidade eterna do carácter de minha mãe e ao consequente travão que ela pôs à entrada do "progresso" naquela casa, a Pedra Moura guardou para sempre a sua transcendência de lugar mágico.
O reino dos contos de fadas e dos autos de Natal, o mundo dos antigos aromas e sabores, o sítio da infância, o refúgio ideal para nascer e para morrer.
Assim terminam as memórias de Mário, um dos protagonistas de Os Pássaros de Seda, um livro sobre a condição humana, que opõe os valores perenes da infância, do maravilhoso e do amor à precariedade das paixões e dos transes da fortuna.
Um magnífico romance que, depois de O Pranto de Lúcifer, confirma a sua autora como uma presença incontornável no panorama da nova ficção portuguesa.

Opinião
Antes de mais uma produtiva conversa literária com a minha querida Betinha, apenas conhecia Rosa Lobato Faria do mundo dos palcos e das telenovelas. Sabia que, para além da atuação, se dedicava à escrita de letras para canções do Festival RTP da Canção e que muita gente a apreciava como autora de um bom punhado de romances. Mas eu tenho que admitir que nunca me tinha atraído a ideia de conhecer esse outro lado de uma senhora cuja fisionomia me transmitia uma sensação de alguém distante e pouco carinhoso.
         Essa sensação foi sendo deixada para trás ao testemunhar o entusiasmo com que a Betinha me falou das suas experiências como leitora de alguns dos romances da autora. E tive que deixar-me contagiar! Apontei alguns títulos e, na primeira oportunidade, “vasculhei” estantes das mais variadas livrarias em busca de um título em particular – Os Pássaros de Seda. Mas nada consegui – ou me diziam que estava esgotado ou que poderia encomendá-lo mas sem garantias… Enfim, quase desisti… Até que me lembrei dos maravilhosos alfarrabistas que existem no Porto… No dia 31 de julho, saí da Rua do Bonjardim com um sorriso enorme, com o livro nas mãos e mais uma recomendação de que iria adorar entrar no mundo das obras da “Rosinha”.
         Os Pássaros de Seda é um romance muito feminino. É também um romance muito português, recheado de tradições, paisagens da fabulosa região do Alto Alentejo, cheiros, sabores e personagens que nos fazem viajar no tempo. Viajamos até um Portugal do antes de 25 de abril e entramos em casas de famílias abastadas, como a do doutor Proença, ou seguimos a jovem Margarida, grávida do seu filho, que é “adaptada” primeiro por um casal de ancianos simpatiquíssimo e depois pelo seu tio Zebra, para quem “Uma coisa é a lei, outra é a gente a falar e acredita que se a criança não se adaptar à família e a família à criança, não há lei que lhes valha.” (pág. 46).
         No universo desta obra reinam sobretudo as mulheres. Mulheres com uma personalidade forte, determinadas, que não tropeçam perante as adversidades e que conquistam o seu lugar e o direito a serem felizes.
Margarida constrói um lar, um “ninho” onde as suas crias sempre se sentiram e sentirão protegidas e acarinhadas. É um lugar mágico, vigiado pelo fantasma da moura encantada, o refúgio ideal para nascer, morrer e renascer quando tudo parece perdido.
Diamantina, a personagem principal, passa a sua infância nesse ninho, rodeada de amor, mimo, companheirismo e, não menos importante, ouvindo, noite após noite, as histórias fantásticas e encantatórias que lhe oferece o tio Zebra. Tudo isto lhe moldará a personalidade e representará um papel fundamental no seu crescimento enquanto mulher e enquanto criadora de bordados e pássaros de seda até aí nunca vistos – “Para mim, os pássaros de seda são assim as asas de quem tem um dom. E aquele cor-de-fogo, com as asas abertas e os olhos que veem muito para lá do horizonte, é o tio Zebra, com o seu condão das histórias e dos impossíveis.” (pág. 65)
Junto a estas mulheres, dando-lhes apoio, amando-as nos bons e maus momentos, protegendo-as e aconselhando-as vamos encontrando exemplos de homens que não nos deixam indiferentes, que não me deixaram indiferente. É o caso de Mário, em cujas memórias se baseia este romance e o já referido e maravilhoso tio Zebra, homem sem idade, dono de uma vida que parece não ter início nem fim e que nos oferece momentos de magia e encantamento com as suas pequenas mas belíssimas e riquíssimas histórias.
Aliada a esta mão cheia de personagens cativantes está a beleza da escrita desta autora. Uma escrita não muito elaborada, mas ao mesmo tempo poética, recheada de pormenores corriqueiros, mundanos e que nos fazem refletir sobre as relações e memórias que construímos com quem nos rodeia. Uma escrita que nos lembra a vida. E por isso uma escrita que me agarrou, que me prendeu. Uma escrita que me pede que vá à procura de mais obras desta autora J


NOTA – 8/10

2 comentários:

  1. Bem disse! É maravilhoso, não é? Doloroso, intenso.... simplesmente fascinante, até porque nos leva numa viagem alucinante, numa avalanche dos sentimentos mais ínfimos, que nem pressentimos na altura, mas que estão lá, numa amálgama de trágico e de delirante... eu adoro!! Que bom q gostaste...

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Obrigada, Betinha!!!! Valeu realmente a pena, sem dúvida!!! Que as nossas conversas continuem assim, frutíferas :)

      Eliminar