Ficha técnica
Título
– Uma escuridão bonita
Autor
– Ondjaki
Editora
– Editorial Caminho
Páginas
– 112
Data de leitura – 15 de novembro de 2016
Opinião
Olhei a capa e reparei em dois pares
de pés virados um para o outro. Folheei as páginas e encantei-me com o negro
das mesmas em contraste com um punhado de palavras e ilustrações que as
iluminavam. E soube de imediato, com aquela certeza tão certeira que de vez em
quando me inunda, que teria que mergulhar nesta escuridão bonita debaixo dos
cobertores, com apenas um ponto de luz e rodeada de negrura e silêncio. Porque
sabia que ia ser deliciosamente arrepiante dividir a escuridão com esta pequena
estória, “em concha e aconchego, como se
dois mundos, nessas gotas de negrume, fossem um só.” (pág. 25)
E assim foi. Em menos de uma hora
embalei-me com a magia, a poesia e a doçura de palavras e imagens. Bebi o
encantamento que transpira de uma estória recheada de inocência, de ansiedade, de
desejos, de tremuras e de uma previsibilidade que em nada “amarga” o sabor
inesquecível e perene que nos marca o travo durante e após termos chegado ao
seu fim. Tive que combater constantes tentações de sublinhar passagem atrás de
passagem, porque trouxe Uma escuridão
bonita da última visita à biblioteca municipal da terrinha. Fui
remediando essa tentação dizendo para mim mesma que semelhante preciosidade é
motivo mais do que suficiente para um próximo gasto monetário numa livraria
qualquer.
De uma realidade que é a realidade de todos
os dias de uma Luanda parca de rendimentos, chega-nos uma noite banal,
quotidiana, onde mais uma vez a luz foi abaixo. Os olhos adaptam-se a uma
escuridão forçada e penetram numa beleza mais palpável, mais audível, mais
cheirada. Disfarçam-se defeitos, medos, anseios, vontades e permite-se que os
sonhos ganhem asas e até se cumpram. Como o sonho de partilhar um beijo com
alguém de quem apenas vislumbramos sombras e brilhos.
Não sei mais que diga. Talvez não seja
preciso dizer mais nada. Apenas partilhar algumas das muitas passagens que me
arrebataram e me fazem querer ler tudo aquilo a que possa deitar a mão de um
autor que terá que habitar com lugar de destaque na minha estante:
“Afinal
uma pessoa também pode dizer coisas sem ser com voz de falar. Foi a primeira
descoberta assim estranha que eu fiz nessa noite duma bendita, bonita, falta de
luz.” (pág. 16)
“O
silêncio é uma esteira onde nos podemos deitar.” (pág. 18)
“A
mão dela estava perto da minha. Senti uma comichão de ausência na proximidade
daquele calor, sabia que os dedos dela estavam ali, e continuava a falar para
não saber, no coração, que todo o meu corpo pedia uma carícia calada.”
(pág. 18)
“Um
dia perguntaram à minha avó Dezanove o que era poesia. Primeiro ela ficou muito
tempo calada, então pensaram que ela não tinha resposta. Mas ela depois falou:
a poesia não é a chuva, é o barulho da chuva.” (pág. 62)
“Depois
das mãos e dos lábios, os nossos corações acelerados eram um único chuvisco de
contenteza. Até acreditei que dentro de nós havia um cheiro de terra depois de
chover.” (pág. 103)
Completamente deslumbrada e ainda em
estado de encantamento, peço-vos que leiam e descubram Ondjaki. É um pecado dos
mais escabrosos se não o fizerem!
NOTA – 10/10
Sinopse
"O
palco sagrado das conversas eram dois: na varanda ou no quintal. Testemunhas:
os mosquitos e os morcegos. Banda sonora: alguma televisão com som alto a dar
bonecos ou telenovela.
Se não houvesse luz? Brincadeira gritada de Cinema Bu, todos contra todos, nas vozes de descrever os filmes que ainda nem tínhamos visto."
Se não houvesse luz? Brincadeira gritada de Cinema Bu, todos contra todos, nas vozes de descrever os filmes que ainda nem tínhamos visto."
Uma Escuridão Bonita é,
talvez, a simples estória de um beijo.
Olá Ana,
ResponderEliminarQue bom! Ainda só li um livro do Ondjaki e adorei a sua escrita. Quero ler muito mais.
Este vai direitinha para a lista :)
Beijinhos e boas leituras
Olá, Isa!
EliminarEu também quero lê-los todinhos!!!! Adorei este e mal posso esperar pelo seguinte!!!
Beijinhos e leituras muito saborosas!
Adoro ler Ondjaki e adorei ler a forma como leste este seu livro ☺️ Ainda não o li, mas fiquei com vontade �� Até à próxima página!!!
ResponderEliminarObrigada, querida Sofia! Ondjaki é realmente fabuloso!
EliminarBeijinhos e até próxima página recheadinha de viagens inesquecíveis!
É sublime!
ResponderEliminarDeliciosamente maravilhoso!!!!
EliminarBem, com essa veemência toda, vou já pôr na lista! Com tantos livros publicados, é realmente uma falha minha nunca lhe ter pegado, sobretudo, gostando tanto de Mia Couto e Agualusa. Só com o Pepetela é que não engraço...
ResponderEliminarBom domingo!
Paula
Paula, eu também só agora o descobri, também demorei muito tempo, mas vamos sempre a tempo! A África com cheirinho luso rebenta de talento e gosto de todos eles, sobretudo deste Ondjaki, que só agora chegou mas que me arrebatou, e de Mia Couto. Confesso que engraço com Pepetela, com a sua suavidade, mas entendo a tua opinião ;) Não é tão emocional como os outros, pois não?
EliminarBeijinhos e leituras muito saborosas!
Estou completamente apaixonada por esse escritor angolano.
ResponderEliminarConheci recentemente e estou arrebatada.
Beijocas
Olá e bem-vinda!
EliminarTambém eu, também eu! Espero ler em breve "Os transparentes e voltar a ficar arrebatada! Depois digo-te ;)
Beijocas e volta sempre!!!
Que lindo, Ana :) obrigada por esta opinião! A ver se o roubo da estante do meu namorado em breve!
ResponderEliminarObrigada, Bárbara!
EliminarRouba-o o quanto antes!!!
Já li o livro e adorei achei o seu comentario um pouco excessivo em adjetivos, podia ser mais direto, mas obrigado por mostrar a sua opiniao.
ResponderEliminarAceito o seu comentário, mas nada do que está na opinião foi pensado em demasia - aliás foi escrita a "quente", com as emoções à flor da pele - talvez por isso o leve a dizer que exagerei nos adjetivos.
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