Ficha técnica
Título – Uma
vida à sua frente / La vida ante sí
Autor – Romain Gary
Editora – Versão Epub
Páginas – 180
Datas de leitura – de 14 a 17 de maio de 2017
Opinião
Esta
opinião já devia ter sido escrita. Não o foi porque o tempo continua a ser
escasso e porque o calor dos últimos tempos apodera-se do meu corpo na forma de
uma moleza e languidez que me arrastam até ao sofá e fazem com que cole uma
limitada atenção a tudo o que qualquer canal esteja a passar no momento.
Já passam vários minutos das nove da noite e
de hoje não passa – tenho que lutar contra a referida moleza e uma vontade
tremenda de me esticar no sofá para avançar umas páginas na leitura que me
acompanha. Sendo assim, aqui vai.
Uma vida à sua frente chegou-me às mãos como mais uma oferta
maravilhosa de uma das seguidoras do blogue. Foi a terceira leitura digital que
fiz e todas elas se devem à generosidade de Cristina Tista, que há uns tempos
atrás, “inundou” o mail do blogue com mais de dez e-books cujos títulos faziam
parte da minha wishlist.
À
partida, tendo em consideração a correspondente sinopse, esta obra do polémico
Romain Gary encaixaria na perfeição naquilo que sempre busco numa leitura
desafiante e compensadora. Sabia que o seu protagonista era um menino
muçulmano, órfão e que vivia com uma ex-prostituta judia, sobrevivente de
Auschwitz. Sabia por este ou aquele comentário lido que seria extremamente
difícil conter-me e não querer a todo o custo adotar Momo, não sentir uma
necessidade absoluta de dar-lhe colo. Sabia que seria um teste ao meu lado
maternal para o qual é inconcebível viver um dia sem a partilha de mimos entre
mãe e filho.
Como
tal, estava preparada para um turbilhão de emoções e para a dor entrelaçada com
ternura e comoção. Contudo, o embate, o choque não foram de proporções
gigantescas, já que Momo desarma-nos com a sua inocência, a sua precocidade e o
desenrasque típico de um órfão que interiormente sabe que apenas pode contar
consigo mesmo. Filho de uma prostituta e de um pai do qual não se recorda,
diz-nos cruamente que ele e os outros miúdos que vão sendo depositados em casa
da Senhora Rosa são “chiquillos que no
habían podido abortarse a tiempo y que no eran necesarios”. Veste no seu
dia-a-dia a pele de um miúdo corajoso, desenrascado e quase isento de sentimentos,
mas de vez em quando desintegra-se e confessa os seus medos, sendo que o
principal era ficar sozinho no mundo – “Cada
vez se cansaba más la señora Rosa (…) y yo me sentía más pequeño y tenía más
miedo.”
Momo é,
como podem comprovar por estes fragmentos e por muitos outros que fui anotando
no meu caderninho, um protagonista, um narrador e um menino que iluminam e
enchem a narrativa de uma luz brilhante e redentora. Quase não necessitamos de
nada mais para ficarmos encantados e rendidos. Contudo, Uma vida à sua frente está preenchida de outras personagens
não menos cativantes como a já referida senhora Rosa (que transporta às costas um
passado ainda mais pesado do que os seus quase cem quilos); o doutor Katz que
tem um consultório onde atende todos os que necessitam de ajuda, nem que seja
apenas uma carícia na cabeça, como Momo; o senhor Hamil que, mesmo estando
cego, não se separa nunca do seu exemplar de Os miseráveis, de Victor Hugo; ou
a senhora Lola, um travesti senegalês com um coração do tamanho do mundo.
Aliado
a um narrador/protagonista inesquecível e a um leque de personagens com as
quais criamos laços fortes, está o facto de a obra estar realmente muito bem
escrita, de o autor a ter dotado de um estilo que junta o lado cru da vida com
o seu lado mais doce, mais ternurento e mais positivo. Tudo se perdoa, tudo se
esquece quando há amor, há atenção, há carinho e alguém se senta ao nosso lado,
nos escuta e nos segura na mão, quando alguém põe de lado o nojo e limpa as
partes íntimas de uma velha, gorda e doente, quando alguém faz o possível e o
impossível para que a vida se mantenha digna e os olhos moribundos de uma velha
sejam capazes de brilhar novamente.
Acho
que não preciso de dizer nada mais. Momo merece que o conheçam e queiram desesperadamente
que ele não sofra nem mais um dia. Obra, por isso, recomendadíssima!
NOTA –
09/10
Sinopse
Uma Vida à Sua Frente é narrado por Mohammed,
um rapaz árabe de 14 anos, órfão, que vive no bairro pobre de Belleville com
Madame Rosa, prostituta reformada e sobrevivente de Auschwitz.
Publicado em 1975, o livro teve
êxito imediato: vendeu milhões de exemplares em todo o mundo, foi traduzido em
mais de vinte línguas e adaptado para o cinema num filme com Simone Signoret.
Nesse mesmo ano, recebeu o Prémio Goncourt.
Olá querida Ana,
ResponderEliminarTambém tenho este livro em e-book para ler. Tenho muita curiosidade em o ler. E agora com a tua opinião ainda mais :) Haja tempo que livros para ler não faltam!
Não vens à Feira do Livro de Lisboa?
Beijinhos e boas leituras
Olá, Isa!
EliminarFinalmente arranjei tempo para dar atenção a este meu cantinho :)
Este livro vale a pena, sobretudo pelo seu protagonista, pela ternura que sentimos por ele e pelas emoções que sentimos ao longo da obra!
Quanto à Feira do Livro, já sabes a resposta ;) Mas quem me dera poder ir lá outra vez, nem que fosse só por mais umas horinhas!
Beijinhos e leituras muito saborosas!
Estou triste porque tinha tanta expectativa em relação a este livro, de quem tanta gente diz maravilhas, e acabou por ser uma desilusão. Eu devia ter previsto isto, porque não consigo estabelecer a mesma ligação com a história, por mais comovente e terrível que seja, quando o narrador é uma criança ou um jovem, mas este teve a agravante de a escrita me irritar profundamente. Como é suposto ser uma criança a falar, claro que a linguagem tem de ser mais simples e coloquial, mas depois há umas expressões grosseiras à mistura em que ele já parecia mais precoce do que inocente. Acho que comigo resultaria melhor a história contada na terceira pessoa.
ResponderEliminarBom fim de semana cheio de livros, Ana!
Olá!
Eliminar(És tu, Paula?)
Sim, não posso dizer que quando o narrador é uma criança, não sinta o meu lado mais crédulo a fazer "de advogado do diabo" e a insinuar constantemente que aquele comportamento e sobretudo aquele ou este comentário sejam demasiado "crescidos" ou "deslocados" para terem sido feitos ou proferidos por alguém tão novo ou inexperiente... Também não consigo acreditar plenamente, mas acho que a leitura que fiz valeu sobretudo pelo contexto e pela força de todas as personagens.
Como estou a responder ao teu comentário a um fim de semana, também te desejo o mesmo, ou seja, que esteja a ser repleto de boas leituras!
Beijinhos e leituras muito saborosas!
Oh, bem me parecia que não tinha assinado, mas como os comentários só aparecem depois da aprovação, fiquei este tempo todo na dúvida. Acho que já reconheces o meu estilo!
EliminarVi que estás a reler o Vir ao Mundo. Não sei como consegues... Eu no outro dia, a organizar a estante para arranjar espaço para os livros da Feira, reli a primeira página e comecei logo a sentir o coração a apertar.
Paula
Sim, já te reconheço!
EliminarEstou a reler Vir ao mundo desde o dia 28 de maio e desde aí que tenho um nó na garganta... Mas esta obra já me pedia há muito que a relesse, por um milhão de razões, porque é uma das obras da minha vida, sem qualquer dúvida!
Não me faltam muitas páginas para terminá-la e o nó cada vez se aperta mais... Mas não há sensação igual... Depois partilho tudo!
Este livro tem excelentes referências, gostava de o ler.
ResponderEliminarArrisca, Márcia, acho que vale a pena!
EliminarTenho de tratar disso. Mas são tantos!
ResponderEliminarI know what you mean ;) Mas desconfio que tu sabe-lo ainda melhor do que eu!
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