O miúdo que pregava pregos numa tábua, de Manuel Alegre

Segunda, 08 de julho de 2013





Sinopse
Entretanto o miúdo cresceu, quer seja o que pregava pregos muito direitos numa tábua, quer o que engoliu os comprimidos do avô, quer o que se rebelou contra a humilhação das mangas curtas, quer os outros todos ou eu próprio, que não sei se fui cada um deles menos um, este que conta e tem tendência ora a efabular ora a querer ser tão verdadeiro que põe em dúvida o que de facto foi e até de si mesmo suspeita. Seja ele quem for, o certo é que o miúdo cresceu. E agora está aqui (mas ainda será ele?) a ver se consegue escrever um livro, sem saber o quê nem como. Pois que outro livro pode escrever-se? Vida de tantas vidas na tão curta vida.

Opinião
Li num ápice este livrinho de Manuel Alegre que me encantou – o estilo efabulatório, a simplicidade e o permitir-me saber um pouco mais da vida do autor, já que o livro tem todos os rasgos de uma autobiografia.

Transcrevo algumas passagens que sublinhei:
À noite, no cinema, é ele que passa a mão pela mão de Ela. Os dedos entrelaçam-se, Ela faz-lhe uma festa na cara. Apetece ficar assim para sempre, mas o miúdo que gosta de caçar narcejas ainda não sabe que não há outra eternidade senão esse instante a escorregar-lhe por entre os dedos.” (pág. 57)

Mas ainda falta acrescentar que o miúdo que tocava piano sobre a mesa viu Miguel Torga no hospital segurando o caderno e a caneta como quem, no campo de batalha, ferido de morte, não larga as suas armas. Eram já poucas as forças, mas a mão mantinha-se firme na caneta e no caderno. Não queria ser apanhado desprevenido (ou desarmado) se uma vez mais lhe aparecesse aquele primeiro verso, que sempre nos é dado, como costumava dizer.” (pág. 85)

O miúdo aperta a mão do pai, dá-lhe um beijo na testa e sente a terra ferida a respirar pela boca dele.” (pág. 106)

Estou aqui a esconder-me e a mostrar-me, como o neto no armário e o outro atrás da porta. O melhor é contar até vinte enquanto eles correm a esconder-se, ansiosos por serem descobertos. Como eu.” (pág. 111)


Ummm, fiquei com aquela vontade de ler mais Manuel Alegre, mais propriamente de reler Cão como nós!...

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