Terça-feira, 11 de outubro de 2011
(RELEITURA)
"«É a obra mais polémica de José Saramago e aquela que, indiretamente, o levou a sair de Portugal e a refugiar-se na ilha espanhola de Lanzarote. Ficou para a história o desentendimento com o então subsecretário de estado da Cultura Sousa Lara, que considerou o livro ofensivo para a tradição católica portuguesa e o retirou da lista do Prémio Europeu de Literatura. Com um José destroçado por ter fugido e deixado as crianças de Belém nas mãos dos assassinos de Herodes; com uma Maria dobrada e descrita, logo no início do livro, em pleno ato de conhecer homem; com um Jesus temeroso, um Judas generoso, uma Madalena voluptuosa, um Deus vingativo e um Diabo simpático, não era de esperar outra reacção das almas mais sensíveis e mais devotas do catolicismo português. E verdadeiramente viperinas são as várias páginas onde o escritor português se entretém a descrever minuciosamente os nomes e a forma como morreram os mártires dos primeiros séculos do cristianismo. Assim se escreveram os heréticos Evangelhos segundo Saramago, para irritação de muitos e prazer de alguns. Como convém.» (Diário de Notícias, 9 de Outubro de 1998)"
Sou uma admiradora incondicional de José
Saramago, disso nunca houve nem haverá dúvida. Para mim, o nosso Nobel é genial
e encontro essa genialidade em toda a sua obra, que já me acompanha desde os
meus 17/18 anos e que marcou como leitora como nenhuma outra!
Contudo, havia uma falha imperdoável na
minha coleção saramaguiana – faltava lá o livro que ficou célebre por razões
tudo menos literárias, pela estupidez e tacanhez de políticos cuja mentalidade,
infelizmente, ainda reina lá para as bandas de “São Bento”…
Li O
Evangelho segundo Jesus Cristo pela primeira vez há mais de 15 anos,
emprestado por um amigo, e agora, já com um exemplar “todinho meu”, voltei a
lê-lo, com mais maturidade, mais prazer (se isso é possível) e, que posso
dizer?... É Saramago em todo o seu esplendor, é um exemplo mais da sua
genialidade e da inegável qualidade literária da sua escrita!
Tal como acontece em outras obras de
Saramago, esta não é exceção no que diz respeito à homenagem que o autor faz
aos sofredores, àqueles que vivem uma vida sofrida e que não são bafejados por
nenhuma sorte. No meio deles, encontramos um Jesus Cristo humanizado, que nos
aparece como um joguete nas mãos de um Deus implacável, castigador, apaixonado
por Maria Magdala (que bem que José Saramago constrói as personagens femininas –
faz-me sempre sentir ainda mais orgulho em ser mulher J) e
que tenta viver a sua vida e ajudar os outros através da sua inquestionável
bondade, à revelia do seu “pai”.
Concluindo, como alguém que não acredita
em religiões e que questiona como é que esse Deus castigador, cruel, implacável
possa ser aquele que, segundo a religião católica, criou o Homem à sua imagem e
semelhança e o colocou na Terra para sofrer, não posso deixar de me associar à
mensagem desta obra de Saramago – religião não pode nem deve estar relacionada
com culpa, com remorsos e com um eterno medo do castigo divino.
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