O apocalipse dos trabalhadores, de Valter Hugo Mãe

Domingo, 02 de março de 2014




Sinopse
A resistência de Maria da Graça e de Quitéria, duas mulheres-a-dias e carpideiras profissionais que, a braços com desilusões e desconfianças várias acerca dos homens, acabam por cair de amores quando menos esperam. Com isso, mudam radicalmente o que pensam e querem da vida.
Este é um romance sobre a força do amor e como ela se impõe igual a uma inteligência para salvar as personagens das suas condições de desfavor social e laboral.
Passado na recôndita cidade de Bragança, este livro é um elogio à força dos que sobrevivem, dos que trabalham no limiar da dignidade e, ainda assim, descobrem caminhos menos óbvios para a mais pura felicidade.

Opinião
Terminei de ler esta obra em frente à lareira e enroscada numa manta J Tão bom!!!
É o terceiro livro que leio de Valter Hugo Mãe. E, como seria de esperar, não me desiludiu. Não o considero tão bom como o meu favorito até agora, O Filho de mil homens. Mas, mesmo assim, muito recomendável, sobretudo para quem já se rendeu à escrita deste prometedor escritor ou para quem ainda não teve o prazer de o descobrir.
Em O apocalipse dos trabalhadores reina a realidade de gente comum, anónima, trabalhadora e sofredora. E reina a mestria da escrita do seu autor, que transforma a vida de duas mulheres-a-dias, nos faz entrar em suas casas, nas suas rotinas e sobretudo nos seus sonhos, nos seus medos, nos seus desafios, nas suas desilusões e na cumplicidade que as une e que as faz não soçobrar.
Maria da Graça e Quitéria são as personagens principais. Vivem das limpezas que fazem em casa de outras pessoas e ganham um dinheirinho extra como “carpideiras” de velórios onde faltam familiares e amigos que chorem pelo defunto. Apesar de a vida ter sido pouco solidária com estas mulheres, não deixam de sonhar com uma vida melhor e principalmente com a força de um amor que as faça sentir realizadas e completas. Maria da Graça está presa a um casamento e vai iludindo o coração com uma relação sexual pseudo-forçada que mantém com o Sr. Ferreira. Por sua vez, Quitéria encontra o amor num imigrante ucraniano, mais novo do que ela e que a princípio não sabe uma palavra da língua lusa.
São principalmente as duas personagens femininas e  a do ucraniano que nos acompanham, preenchem uma narrativa que nos faz tomar mais uma vez consciência da precariedade do trabalho, do quanto o interior de Portugal sofre com a pouquíssima oferta laboral e do quanto, paradoxalmente, ainda há quem imigre para o nosso país porque o seu próprio país está em piores condições.
Com tudo isto, poderíamos assumir que este romance é triste e amargurado. Sim, é-o, mas a tristeza e a amargura são muitas vezes camufladas, abafadas por momentos que provocam o riso, como aqueles que Maria da Graça e Quitéria protagonizam em noites que passam a velar defuntos desconhecidos em locais isolados ou em conversas cúmplices que aquecem as suas vidas sofridas e maltratadas.

É, por fim, um romance, tal como nos diz a sinopse, que elogia a força interior e exterior dos trabalhadores, dos que labutam sem descanso e que sonham com a força do amor, que pode aparecer quando menos se espera e de quem menos se espera. E é, por que não, um retrato do nosso Portugal mais genuíno e castiço.

2 comentários:

  1. Também li este livro e gostei bastante. Concordo com tudo o que escreveste. Queria também dizer que sou um apaixonado pelo teu blog, que adoro os teus comentários e espero que continues, por muitos e muitos anos, a deliciar-nos com a beleza e o encanto da tua escrita.

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    1. Muito obrigada, meu querido! Tu, melhor do que ninguém, sabes o quanto este blogue é apaixonante para mim!
      Obrigada também por seres o "meu revisor oficial" :)

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