Volver a Canfranc, de Rosario Raro


Ficha técnica
TítuloVolver a Canfranc
Autora – Rosario Raro
Editora – Planeta
Páginas – 504
Datas de leitura – de 09 a 18 de janeiro de 2017

Opinião
Canfranc é com certeza um nome desconhecido para imensas pessoas. Também o era para mim. Mas se fizermos uma pesquisa no Google, rapidamente descobrimos que Canfranc é o nome de uma estação ferroviária que uniu até 1970 Espanha e França através de um túnel escavado nos Pirenéus. E rapidamente nos deslumbramos com as imagens que ilustram a grandiosidade e majestosidade do seu edifício com porte e silhueta de um palácio real.
Mas Canfranc não é apenas sinónimo de tudo isso ou de uma degradação que dói de ver e que é consequência do encerramento da via ferroviária internacional. É também sinónimo de uma via de escape para centenas ou milhares de judeus que durante a Segunda Grande Guerra fugiram ao jugo nazi. Entre eles nomes célebres como o do pintor bielorrusso Marc Chagall, Alma Mahler, uma das mulheres mais fascinantes do século XX, o irmão mais velho de Thomas Mann e a sua família e ainda a controversa e famosíssima Josephine Baker e o seu marido judeu. Famosos e anónimos cruzaram os Pirenéus e quando chegavam a Canfranc sabiam que estavam um pouco mais perto da ansiada liberdade, pois aí apanhariam um comboio que os levaria a atravessar a Península Ibérica até alcançarem Lisboa, onde embarcariam rumo a uma vida livre.
“Para muchos perseguidos por el régimen nazi, la esperanza se llamó Canfranc.” (pág. 11)
Este é a premissa, o ponto de partida para Volver a Canfranc, um romance que parte dos referidos factos históricos e aos quais a sua autora habilmente mistura a ficção e assim cria uma história que nos prende desde as páginas iniciais.
A estação de Canfranc, apesar de estar situada em terras aragonesas, ou seja, em solo espanhol, era uma estação internacional. Todos os seus serviços eram em duplicado – havia, por exemplo, um chefe de estação espanhol e francês e serviços aduaneiros de ambas as nacionalidades. O seu piso superior estava ocupado pelo Hotel Internacional. E é nestes serviços e instalações que se movimentam dois dos protagonistas da obra – Laurent Juste é o chefe francês dos serviços aduaneiros e Jana Belerma é criada do hotel. Para além desses mesteres, dedicam-se clandestinamente a ajudar de todas as formas possíveis os refugiados judeus que chegam a Canfranc escondidos em vagões ou que descem das montanhas que rodeiam este enclave ferroviário onde, desde o inverno de 1942, uma bandeira com a cruz suástica “acolhe” todos aqueles que por lá passam.
Laurent e Jana não trabalham sozinhos. A eles se juntam outras personagens de ambos os lados da fronteira, como Montlum, o companheiro de outras guerras de Laurent, Valentina, uma miúda de treze anos que ajuda Jana com as lides do hotel, um médico, o doutor Mallén, que em Zaragoza acolhe os refugiados que necessitem de cuidados clínicos, Didier, um trabalhador da ferrovia e Esteve Durandarte, contrabandista, cavaleiro enigmático que vive nas encostas das montanhas e que desassossega os corações femininos. Este punhado de personagens, armados de valentia e de um intrínseco sentido do dever e da justiça, põe todos os dias as suas vidas em risco para que a guerra possa terminar um pouco mais cedo e para que a liberdade seja um direito que assiste a todos.
Não é novidade nenhuma para quem me conhece e segue as minhas leituras aqui no blogue que sou obcecada por obras que abordem períodos bélicos, sobretudo aqueles que foram longos e atrozes. Sendo assim porque a cronologia assim o ditava, porque em janeiro se comemora o Dia Internacional da Lembrança do Holocausto e porque quis participar no projeto Leituras do Holocausto II no Goodreads, embarquei na leitura de Volver a Canfranc com algumas expectativas e aquele interesse que me percorre todinha quando tenho entre mãos um grande amontoado de páginas (504, para ser exata) que absorverá a minha atenção e mexerá comigo de uma forma inexplicavelmente boa.
Agora que já se passaram alguns dias desde que a terminei, posso afirmar que foi uma leitura muito saborosa, que ainda me habita e que por isso não desiludiu. Não foi uma leitura a que darei sem hesitar a pontuação máxima, talvez porque lhe falta alguma intensidade nos momentos mais dramáticos e na caracterização das personagens principais, mas foi uma leitura muito interessante, que me abriu caminho para confirmar que a Segunda Grande Guerra não se desenrolou apenas nos palcos principais e que me deixou com umas ganas tremendas de pisar in loco as vias e os espaços que compõem o soberbo espaço da estação de Canfranc, fechar os olhos e reconstruir na minha memória tudo o que de bom e vital para a humanidade se fez por lá há uns bons anos atrás.
Tenho muita pena que esta obra ainda não esteja traduzida e publicada no nosso país, pois sei que agradaria a muitos leitores e faria com que os mesmos soubessem onde fica Canfranc e por que razão esta estação foi sinónimo de esperança e liberdade para muitos judeus nos anos 40 e ainda continua a sê-lo para os seus descendentes.
Termino deixando-vos uma imagem que ilustra a grandiosidade do edifício da estação que dá nome à obra e que me faz tanto querer conhecê-la, senti-la – Hasta pronto, Canfranc.


NOTA – 09/10

Sinopse

Marzo de 1943. Agazapados dentro de una habitación secreta, varias personas contienen la respiración mientras aguardan a que el sonido de las botas reforzadas con metal de los soldados alemanes se aleje. En la estación internacional de Canfranc, en el Pirineo, la esvástica ondea sobre la playa de vías. En medio de la oscuridad, Laurent Juste, jefe de la aduana, Jana Belerma, camarera del hotel, y el bandolero Esteve Durandarte arriesgan sus vidas para devolverles la libertad. Volver a Canfranc es su historia. Jana y Esteve, armados tan solo con la valentía que da el amor, lucharon porque miles de ciudadanos judíos consiguieran atravesar esta estación mítica. Además de ellos, otras personas guiadas por la generosidad decidieron enfrentar el terror y ayudarlos. Para miles de perseguidos por el régimen nazi la esperanza se llamó Canfranc.

6 comentários:

  1. Fiquei com vontade de ler...Só bons ingredientes, muito bem apresentados por ti!

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    1. Obrigada, Sofia!
      Arrisca, porque vale a pena. Quem sabe se a leitura não te abre caminho para uma nova experiência na tua cartografia pessoal?...
      Beijinhos

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  2. Olá Ana,
    Desconhecia por completo este livro! Aliás o que mais adoro no teu cantinho é isso. As sugestões que dás :) Nunca ouvi falar no livro, mas sobretudo nesse local. Ler é aprender e viver!! Adoro!! É por isto que adoro a leitura.
    já ficou na minha "Mira" :)
    Beijinhos e boas leituras

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    1. Obrigada, querida Isa, pelas palavras carinhosas!
      O que realmente de melhor retirei desta obra foram novas luzes sobre esse período negro mas tão apaixonante da nossa História e a vontade louca com que fiquei de ir a Canfranc!
      Beijinhos e mais leituras saborosas como esta!

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  3. Se estivesse traduzido, iria de certeza para a minha lista. Há tantos livros sobre os campos de concentração e os bombardeamentos de Londres (e não lhes tiro a importância, claro!), mas a Segunda Guerra foi muito mais do que isso.
    E esse edifício, mesmo com esse ar de abandono, deve ser majestoso!
    Paula

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    1. Pois... infelizmente não está traduzido...
      Eu adoro descobrir "coisas" novas sobre a Segunda Guerra Mundial - ainda torna a minha obsessão mais obcecante!
      E sim, concordo contigo - o edifício é de nos deixar extasiados!

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