No limiar da eternidade, de Ken Follett

Quinta-feira, 09 de julho de 2015




   
Opinião
         Em dez dias “papei” as 1022 páginas de No limiar da Eternidade, o terceiro volume da trilogia O Século. E a velocidade com que o li (com uma média de 100 páginas por dia) só vem confirmar que é bastante difícil para qualquer leitor que sinta especial predileção por romances históricos ficar indiferente a esta descomunal saga que abarca um século tão estimulante como foi o século XX.
         Continuo a ter consciência de que não sou uma admiradora ferrenha de Ken Follett. Continuo a achar que é um autor com um estilo bastante prosaico, que a construção das suas personagens não varia muito de obra para obra, que poderia trabalhá-las mais, dar-lhes mais profundidade psicológica e que há contextos e momentos que são abordados com muito detalhe enquanto outros são pouco ou nada mencionados. A guerra que os Estados Unidos combateram em terras vietnamitas é um exemplo do que, no meu ponto de vista, foi abordado, neste volume que encerra a trilogia, muito ao de leve e de uma forma desajustada, ou seja, pareceu-me que o autor, ciente da importância desse conflito, sabia que tinha que abordá-lo, mas fê-lo muito superficialmente e, apetece-me dizê-lo, “ao despacha”.
Contudo, os aspetos positivos que caracterizam No Limiar da Eternidade suplantam consideravelmente os negativos – a narrativa é rápida, os capítulos são pouco extensos, os acontecimentos que os vão preenchendo não nos deixam indiferentes, espicaçam a nossa curiosidade e é impossível não querermos seguir as vidas das personagens que tão de perto e de forma tão íntima estiveram presentes em acontecimentos como a passagem dos irmãos Kennedy pela Casa Branca e pelos comandos políticos do considerado país mais poderoso do mundo; os seus assassinatos; a luta dos negros americanos pelos direitos civis mais básicos (como poder frequentar a mesma casa de banho pública, os mesmos restaurantes, os mesmos espaços sociais que os brancos); os inesquecíveis discursos de Martin Luther King; o declínio do comunismo soviético e da Cortina de Ferro; a queda do muro de Berlim e os intermináveis anos da chamada Guerra Fria.
Tal como sucede com as obras antecessoras, em No Limiar da Eternidade voltamos a acompanhar as famílias que já conhecemos desde A Queda dos Gigantes e que nos fazem viajar desde a União Soviética, a Alemanha de Leste, Inglaterra até aos Estados Unidos, com breves passagens por outros países como Cuba, Vietname, Polónia ou Hungria. Voltamos igualmente a sentir que o autor não permite que olhemos para mais um conflito (a Guerra Fria) como uma luta entre os bons e os maus. Tanto encontramos gente sem escrúpulos, que não olha a meios para atingir os seus fins do lado comunista como do lado capitalista. Aliás, a ambição, a mentira, a hipocrisia, a dissimulação de dar a entender que o interesse de uma nação está acima dos interesses pessoais estão bem mais presentes nas personagens americanas, sobretudo nas que verdadeiramente moldaram a História dos Estados Unidos, como Nixon, Reagan ou Bush pai.
Esta opinião não ficaria completa se não fizesse alusão aos outros aspetos que tanto representaram a segunda metade do século XX – a luta pela igualdade entre raças e sexos; a emancipação da mulher; a defesa do “amor livre, sem barreiras”; a descrição da roupa que foi caracterizando os anos sessenta, setenta e oitenta (de tão mau gosto… J) e sobretudo a música, o poder da música como linguagem universal, como arma de revolta, como símbolo de liberdade e que nenhum muro de betão ou de arame farpado, nenhuma ideologia pôde travar. Dave, Walli, Karolin, Lili são jovens que acreditam que a música poderá não só dar aquele sentido às suas vidas pessoais como conseguirá fazer do mundo em que vivem um mundo melhor, onde imperará o amor, o respeito e a liberdade. E têm razão, porque a arte, em qualquer das suas componentes tem esse poder, como já inúmeras vezes o comprovou ao longo da História.
Em jeito de conclusão, digo que ler esta obra não foi um desperdício de tempo. Pelo contrário. Ajudou-me imenso a conhecer melhor uma época entusiasmante da História mundial que nunca abordei convenientemente na escola e da qual tinha um conhecimento muito limitado. É uma obra que, além desse lado informativo e didático, é um bom exemplo de entretenimento e de prazer e que, como tal, vale a pena ler.
Recomendo aos leitores que ainda não leram nenhum dos volumes que o façam de uma assentada só, isto é, que adquiram ou peçam emprestados os três volumes e que os leiam um a seguir ao outro. Não perdem tanto “o fio à meada” como eu, por exemplo, que tive que estar à espera do lançamento de cada um deles e que entre a leitura do volume I, do II ou do III tive que fazer um interregno de pelo menos um ano. É certo que as personagens não são as mesmas, mas estamos a falar de famílias cujas vidas estão intimamente entrelaçadas, por isso o leitor fica a ganhar se não houver um salto temporal grande entre a leitura de cada volume.

Por fim, deixo-vos uma canção de que gosto muito e que considero ser a banda sonora perfeita para ler qualquer livro que aborde a Guerra Civil:

NOTA – 07/10

Sinopse
Enquanto as decisões tomadas nos corredores do poder ameaçam extremar os antagonismos e originar uma guerra nuclear, as cinco famílias de diferentes nacionalidades que têm estado no centro desta trilogia O Século voltam a entrecruzar-se numa inesquecível narrativa de paixões e conflitos durante a Guerra Fria.
Quando Rebecca Hoffmann, uma professora que vive na Alemanha de Leste, descobre que anda a ser seguida pela polícia secreta, conclui que toda a sua vida é uma mentira. O seu irmão mais novo, Walli, entretanto, anseia por conseguir transpor o Muro de Berlim e ir para Londres, uma cidade onde uma nova vaga de bandas musicais está a contagiar as novas gerações. Nos Estados Unidos, Georges Jakes, um jovem advogado da administração Kennedy, é um ativo defensor do movimento dos Direitos Civis, tal como a jovem por quem está apaixonado, Verena, que colabora com Martin Luther King. Juntos partem de Washington num autocarro em direção ao Sul, numa arriscada viagem de protesto contra a discriminação racial. Na Rússia, a ativista Tania Dvornik escapa milagrosamente à prisão por distribuir um jornal ilegal. Enquanto estas arriscadas ações decorrem, o irmão, Dimka Dvornik, torna-se uma figura em ascensão no seio do Partido Comunista, no Kremlin.
Nesta saga empolgante que agora se conclui, Ken Follett conduz-nos, em No Limiar da Eternidade, através de um mundo que pensávamos conhecer, mas que agora nunca mais nos parecerá o mesmo.

Sem comentários:

Enviar um comentário