Ruínas, de Hugo Lourenço


Ficha técnica
TítuloRuínas
Autor – Hugo Lourenço
Editora – Esfera do Caos
Páginas – 168
Data de leitura – de 06 a 12 de novembro de 2017

Opinião
No início do mês de outubro, o autor Hugo Lourenço contactou-me perguntando-me se estaria interessada em ler a sua obra e em fazer a correspondente crítica. É óbvio que fiquei muito contente com o pedido e acedi de imediato ao mesmo.
Confesso que o autor me era completamente desconhecido até àquele momento e, como nos últimos tempos tento fugir às tentações, não pondo os pés em muitas livrarias, não havia tropeçado ainda em Ruínas, a sua obra de estreia.
Terminei de lê-la há alguns dias e há conclusões que são óbvias. Apesar de ser muito jovem, Hugo Lourenço possui já uma bagagem cultural e literária considerável. A mesma está presente em constantes referências bibliográficas, em assertivas comparações de personagens, situações e contextos e em opiniões que o autor esboça, fundamentando-as com citações ou passagens de uma obra consagrada, como a Bíblia. É igualmente claro que muito do que está presente na obra provém do lado mais pessoal e mais biográfico do seu autor. A personagem principal é um jovem desiludido com as escassas oportunidades que tem tido na vida, um jovem que tem que passar um infindável número de horas por trás de um balcão, vendendo bilhetes de cinema e pipocas, porque tem que buscar a sua subsistência, tem que pagar as contas ao final do dia e porque o curso superior que tirou não dá dinheiro, como sempre lhe repetiu o pai. É ainda fácil de constatar que a referida escassez de oportunidades que afeta o protagonista e o autor deixa transparecer uma amargura que caracteriza a juventude dos dias de hoje – uma juventude envenenada pela precariedade de um futuro onde os sonhos não se cumprem, onde os jovens não conseguem cumprir-se profissionalmente.
Ruínas é assim uma obra onde habita muita amargura, muita desilusão. Porém não é apenas isso. É também uma obra que retrata a amizade de três rapazes que se conhecem desde os tempos de primária, três rapazes com personalidades e modos de ver a vida antagónicos. Daniel é o explosivo, o problemático, o que vive no limite. Ricardo é o menino de bem, nascido numa família de posses, que almeja a perfeição, a beleza, a luz. O narrador/protagonista é o inseguro, o tranquilo, o que tenta equilibrar o lado solar e o lado lunar de Ricardo e Daniel. Juntos criam uma amizade que à partida seria pouco provável de acontecer entre os três. Juntos vão conhecendo a vida, apesar de esta os ir separando à medida que vão crescendo. Juntos entabulam conversas que abordam o corriqueiro, o banal e abordam os sonhos, os medos, as angústias, a vida e a morte. Juntos representam três lados de uma realidade que poderá ser a nossa ou uma muito próxima de nós. Uma realidade de mundos díspares, que a amizade pode aproximar por breves instantes, mas que a amargura, a falta de oportunidades, a inveja, a solidão, o berço pode fragmentar e levar a um desfecho previsível, mas muito real.
Pessoalmente consegui identificar-me com o protagonista e com Daniel. Um é o resultado da já referida precariedade e da desilusão de muitas portas que se fecharam. O outro nasceu para ser o saco de porrada do pai, o menino a quem a mãe nunca defendeu da violência do pai, o rapaz que não conhece outra realidade que não essa, que busca um escape nas drogas. Com o Ricardo não consegui, porém, criar laços. É uma personagem esquiva, que vive num mundo muito seu, repleto de ideais inatingíveis e que soçobra quando a realidade, a imperfeição e a sujidade da vida lhe estraçalham as quimeras que sempre defendeu. O seu final pareceu-me pouco conseguido e também não fui capaz de engolir o “final paralelo” que o narrador imaginou, engendrou na sua cabeça, enquanto dava um passeio pela baixa lisboeta, tentando assim perdoar-se por não ter estado mais presente na vida de Ricardo e mesmo na de Daniel. Soou-me a forçado, a demasiado irrealista, ingénuo, contraditório face ao pendor amargurado do resto da obra.
Por tudo o que referi até ao momento, acho que tanto o autor como todos os que lerem esta opinião irão compreender-me quando digo que Ruínas me proporcionou uma leitura muito interessante, com trechos muito bem conseguidos, nomeadamente aqueles que, por um lado, aludem à triste realidade dos jovens portugueses a quem a vida, o país não oferecem as oportunidades necessárias para se realizarem profissionalmente e aqueles que, por outro, veiculam e pedem para que se comece a dar mais valor à arte, à arte como mote de mudança, de resistência ao cinzentismo que abafa sonhos, projetos, vontades. Espero que também me compreendam quando afirmo que a obra transparece o quanto o autor estava desejoso de se mostrar ao mundo enquanto criador, enquanto dono de uma voz, de uma opinião, de um saber a partilhar e que essa ânsia, esse desejo por vezes tornam confusos e repetitivos alguns momentos da obra. Por fim, espero que todos os que lerem esta opinião vejam o potencial que está por detrás da escrita de Hugo Lourenço, arrisquem a ler Ruínas e lhe desejem, como eu, um futuro brilhante, onde a escrita continue a aprimorar-se e lhe traga o sucesso que merece.
Termino agradecendo, e muito, ao autor por me ter disponibilizado um exemplar da obra e reiterando os meus votos de muito sucesso. Eu cá estarei para seguir com muita atenção o que vier a publicar no futuro. Continua o bom trabalho, Hugo!

NOTA – 07/10

Sinopse

A precariedade laboral e os empregos rotineiros. Uma juventude desiludida e assolada por falsas promessas. As frustrações de um jovem adulto, inteligente e bem preparado, que, num país em crise, não encontra mais que trabalhos mal pagos e incapazes de o fazerem sentir-se realizado. 

8 comentários:

  1. Também li este, também a convite do autor. Concordo bastante com a opinião :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá, Bárbara!
      Obrigada! Ainda bem que concordamos :)
      Onde posso ler a tua opinião?

      Eliminar
    2. obrigada pelo interesse, Ana! a minha opinião está aqui: http://barbarareviewsbooks.blogspot.pt/2017/09/ruinas.html

      PS: já reparaste que agora a amazon espanhola envia para Portugal com oferta de portes? :)

      Eliminar
    3. Bárbara, já li e já comentei!
      Não, não sabia, mas isso são notícias maravilhosas!
      Obrigada!

      Eliminar
  2. Olá Ana,
    Tenho visto este livro pela blogosfera. Parece interessante. Foi simpático o autor ter-te enviado o livro ;)
    Um beijinho e boas leituras

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá!
      Sim, é uma obra interessante e um autor a ter em consideração! Senti-me muito elogiada por ter recebido o seu convite para uma leitura da sua obra! :) Que venham mais!
      Beijinhos!

      Eliminar
  3. Obrigado pela leitura atenta do meu livro, Ana. Fico contente por saber que, na generalidade, gostaste do meu romance e vou ter atenção para o que apontaste como sendo os pontos fracos da mesma.

    Tratei de partilhar a tua opinião na minha página de Facebook, já há uns dias: https://www.facebook.com/hugolourenco060792/

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Hugo, eu é que agradeço pelo envio do livro! E agradeço a partilha na tua página de Facebook!
      Fico à espera de novidades e que estas sejam sinónimo de ainda mais sucesso!

      Eliminar