Ficha técnica
Título – La voz dormida
Autora –
Dulce Chacón
Editora –
DeBolsillo
Páginas –
432
Datas
de leitura – de 24 a 28 de abril de 2018
Opinião
Se não
me lembro como “tropecei” com a obra que li antes desta, o mesmo não posso
dizer de La voz dormida, já
que quem ma apresentou (e emprestou) foi a minha querida e muito amiga Nancy!
Li-a
pela primeira vez há muitos anos, ainda o meu espanhol gatinhava e precisava
constantemente de um andarilho chamado dicionário! Contudo, esses conhecimentos
rudimentares da língua espanhola não me impediram de entrar na obra e de me apaixonar
pela sua narrativa e pelas suas personagens.
La voz dormida está habitada por mulheres e por
alguns homens, mas são elas que tomam as rédeas da trama. Regressei (uma vez
mais) à Madrid dos anos quarenta e à prisão feminina de Ventas, aquela que albergou
um número infindável de mulheres condenadas frequentemente à morte apenas
porque acreditaram nos ideais de igualdade e liberdade proclamados pelos
partidos que lideraram a República espanhola dos anos 30. Esta não foi, como é
óbvio, a primeira vez que franqueei os portões da famigerada prisão da qual
hoje em dia não resta nada, absolutamente nada. Fi-lo pela última vez com a
obra Si a los tres años no he vuelto
e sei que não me ficarei por aqui, tal é a minha (mais do que conhecida)
obsessão pela Guerra Civil espanhola e pelos anos tortuosos que lhe seguiram.
A
referida obsessão tem-me dotado de uma bagagem considerável que, por sua vez,
me obriga a ser cada vez mais exigente com as leituras que abordam o tema. Assim
sendo e comparando, por exemplo, La
voz dormida com a que se lhe antecedeu, tenho que destacar a obra de
Dulce Chacón e reconhecer que, quando uma narrativa é emocional, quando as suas
personagens nos agarram de forma quase visceral, isso é prova mais do que
evidentes de que a bagagem ocupa um lugar secundário e que eu me arrepio e me
comovo como o fiz quando li, pela primeira vez, uma obra lindíssima sobre esses
anos que mancharam a História recente de Espanha.
Hortensia,
Elvira, Reme, Tomasa partilham um espaço diminuto de uma sala a abarrotar de
mulheres presas. Hortensia está grávida de oito meses, Elvira é a mais nova do
grupo, Reme a mais velha e Tomasa a mais revoltada, a que não verga e se recusa
a fazer o que seja de trabalhos manuais que venham a ser vendidos ou a ajudar o
inimigo. Do lado de fora dos portões, vamos acompanhando Pepita, irmã de
Hortensia, Javier, avô de Elvira, Doña Celia, dona da pensão onde mora Pepita,
Paulino, irmão de Elvira e Felipe, marido de Hortensia. A vida de todos está
umbilicalmente ligada a Ventas e à tentativa de continuar a lutar contra uma
ditadura nacionalista e fascista que abafa da forma mais hedionda possível
qualquer tentativa de rebelião. Todos comungam da vontade de ter uma vida
digna, livre e justa, seja ela associada ao partido comunista ou não.
“La mujer que iba a
morir se llamaba Hortensia”. Esta
frase dramática abre a narrativa e a mim abriu-me uma torrente de emoções –
sofrimento, incredulidade, terror e, ao mesmo tempo, orgulho. Orgulho e até
vaidade de ser mulher, de comprovar o quanto as mulheres são tenazes, são
estoicas e merecedoras da mais absoluta admiração. Hortensia, Reme, Elvira,
Tomasa, Pepita e Doña Celia são mulheres simples, trabalhadoras, honestas.
Viram as suas vidas perder o norte, perderam pais, filhos, cônjuges e até famílias
inteiras, estão a perder anos encarceradas física ou psicologicamente, mas não
desistem, apoiam-se mutuamente, tratam umas das outras e dos seus familiares e
sobretudo deixam um testemunho crucial – lutar pela vida, pela liberdade e pela
justiça. Agora e sempre. Porque as suas vozes podem ser silenciadas, podem ser
amordaçadas, mas a liberdade que agora lhes é negada não está morta, está
apenas adormecida e voltará a acordar se todos lutarem por isso.
Foi,
por tudo o que disse (e muito mais poderia dizer), uma leitura muito especial. Senti
ainda mais orgulho em ser mulher, gostei imenso de regressar às letras de Dulce
Chacón e adorei todas as emoções que vivenciei. Despeço-me dela sorrindo
novamente para a sua capa e para a jovem mulher que me retribui o sorriso e que
transmite no olhar o quanto devemos defender a felicidade de sermos livres.
Termino
fazendo uma referência incontornável a um grupo de mulheres, conhecidas como as
“13 rosas” e que no dia 05 de agosto de 1939 foram barbaramente executadas.
Mais de metade delas eram menores de 21 anos e nenhuma delas havia cometido
nenhum delito grave. Apenas estavam ou filiadas no Partido Comunista ou haviam
ajudado algum elemento do referido partido. São várias vezes referidas em La voz dormida e comparadas às
personagens femininas que, tal como elas, perdem a vida ou muitos anos atrás
das grades apenas porque defenderam ideais.
¡Una
novela imprescindible!
NOTA – 9,5/10
(Faltou-lhe um pouquinho de força no final)
Sinopse
Un grupo
de mujeres, encarceladas en la madrileña prisión de Ventas, enarbola la bandera
de la dignidad y el coraje como única arma posible para enfrentarse a la
humillación, la tortura y la muerte.
Pocas
novelas podemos calificar como imprescindibles. La voz dormida es una de
ellas porque nos ayuda a bucear en el papel que las mujeres jugaron durante
unos años decisivos para la historia de España. Relegadas al ámbito doméstico,
decidieron asumir el protagonismo que la tradición les negaba para luchar por
un mundo más justo. Unas en la retaguardia y las más osadas en la vanguardia
armada de la guerrilla, donde dejaron la evidencia de su valentía y sacrificio.
Como é que consegues escrever um texto tão grande e tão bem articulado sem revelar demasiado? Fiquei logo interessada quando vi este livro nas tuas futuras leituras e depois fui ler a sinopse, mas tua emotiva descrição destas mulheres que me parecem fascinantes foi a cereja no topo do bolo. E sabes o melhor? Há a versão portuguesa na minha biblioteca. Maravilha!
ResponderEliminarBeijinhos
Paula
:) :) :) A tua biblioteca já cresceu na minha consideração!!! Que bom que vais poder ler Dulce Chacón e em português!
EliminarEsta obra é-me muito querida e que bem que sabem os teus elogios! É sinal de missão bem cumprida!
Fico à espera da tua leitura e correspondente opinião!
Beijinhos de uma mãe para outra!
Olá Ana,
ResponderEliminarBom...escusado será dizer que não conhecia esta autora e este livro. Mas quero...por tua culpa! Vou ver se encontro em PT.
Um beijinho e boas leituras
:) Oxalá que o encontres, porque ele foi traduzidos há uns anos para português! Pode ser que o encontres na tua biblioteca! Oxalá que sim, porque é uma obra maravilhosa!
EliminarBeijinhos e leituras muito saborosas!
Infelizmente, não o encontrei na "biblioteca da minha terrinha" como tu tão carinhosamente te referes à tua, tive mesmo de me inscrever na rede de bibliotecas da nossa capital para satisfazer a minha voracidade. Quando entrei na do Palácio Galveias, parecia uma miúda na loja de doces, com a vantagem de todos eles serem de graça. Queria trazer tudo! Ah! Ah!
ResponderEliminarA ver se poupo uns dinheiritos... ;-)
Paula
Ahaha, eu conheço muito bem essa sensação de êxtase puro perante tanta oferta daquilo que nos adoça a vida, e ainda por cima grátis!!! Também já estive muito tentada em inscrever-me na biblioteca do Porto, mas tenho que refrear essa vontadinha, pois "seria" obrigada a deslocar-me com muito mais frequência ao centro da cidade e seria mais uma forma de tornar a minha vidinha ainda mais caótica... Por isso, para já, fico-me pela intenção ;)
EliminarBeijinhos!