As histórias que não se contam, de Susana Piedade


Ficha técnica
TítuloAs histórias que não se contam
Autora – Susana Piedade
Editora – Oficina do Livro
Páginas – 342
Datas de leitura – de 30 de agosto a 03 de setembro de 2017

Opinião
Três mulheres. Três experiências traumáticas. Três dores imensuráveis e incomparáveis. Ana perde o noivo que morre inesperadamente, vítima de um AVC. Um atropelamento mortal rouba a luz da vida de Isabel, deixando-a amputada, deixando-a órfã do seu filho. Marta volta a ser vítima de violência doméstica. Depois de ter sido agredida física e verbalmente pela sua mãe, enquanto adulta volta a ser violentada, desta vez pelo seu namorado. Três histórias que nos atarantam, que nos desorientam e paradoxalmente nos centram porque nos põe ante experiências que nos podem tocar a todos.
Comprei esta obra após ter lido a opinião correspondente que a Márcia publicou no seu “Planeta”. Uma obra que ela recomendava muito. Uma obra recheada da dor que procuro de forma quase doentia. Uma obra finalista do prémio Leya. Uma obra com uma escrita aprimorada, que conduz o leitor ao lado mais íntimo, mais nu de cada uma das protagonistas e que vai abrindo brechas nesse novelo de dor que as compõe. Uma obra que, tal como a Márcia, recomendo muito.
Não é difícil compadecer-nos da Ana, da Isabel ou da Marta. Senti o coração apertado ao longo de toda a leitura, mas talvez porque sou mãe, senti-o ainda mais apertado com a dor e a perda de Isabel. A perda de um filho é algo que não consigo imaginar, só a perspetiva de, só o pensar em me deixa completamente transtornada e, por isso, amparei a dor dela, o seu sofrimento, a sua loucura, não questionei as suas atitudes. Li, absorvi ao mesmo tempo que repelia o que absorvia e chorei. Chorei muito. Com as outras protagonistas não criei uma ligação tão umbilical, porém não deixei de sofrer por ambas, de, por um lado, me alegrar com os pequenos passos que Ana vai dando para espantar a dor, para buscar consolo na amizade que se forma entre as três e, por outro, de abanar a cabeça de incredulidade sempre que Marta, uma jovem doce e genuinamente boa, se vergava e aceitava como merecida a violência que lhe caía em cima.
Esta obra foi a obra de estreia de Susana Piedade, mas desengane-se quem crê que nela irá encontrar indícios de inexperiência ou pouca maturidade. Pelo contrário. Para além do já referido estilo cuidado e aprimorado, a narrativa cativa ao leitor, leva-o a lê-la a um ritmo quase sôfrego, a querer entrar nas histórias destas três mulheres e a penetrar em dores, em fantasmas e em sofrimentos que não se partilham, que se escondem, que se enterram no cantinho mais recôndito talvez porque são dores, fantasmas e sofrimentos que se acha que mais ninguém vai entender ou que lados de uma vida que envergonham, que estigmatizam.
As histórias que compõem esta narrativa recomendam-se por tudo o que referi. Se tropeçarem nelas não deixem de as agarrar e de as conhecer. Não se arrependerão.

NOTA – 09/10


Sinopse

Ana pergunta-se como seria hoje o seu dia-a-dia se tivesse sabido detetar no namorado os indícios da doença que o levou inesperadamente. Isabel, seis meses depois da tragédia que lhe virou a vida do avesso, ainda se sente culpada por não ter chegado a horas ao infantário naquela tarde de chuva. Marta, que ousou abandonar, ainda adolescente, uma casa onde era maltratada, não tem agora a coragem de confessar que o amor em que apostou tudo está longe de ser um mar de rosas. São três mulheres jovens, com a vida inteira pela frente, mas para quem o presente se tornou um fardo difícil de carregar e o futuro um tempo sem qualquer esperança. Quem poderia entender a sua dor incomparável? Para quê, então, contarem as suas histórias?

6 comentários:

  1. Olá Ana,
    Já está anotado. Há muito que vejo este livro "por aqui", mas nunca lhe dei a devida importância. Está prometido. Parece bom.
    Beijinhos e boas leituras

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    1. Acho que vais gostar, Isa! Se o encontrares numa biblioteca por aí, não hesites! É muito bom!
      Beijinhos e leituras muito saborosas!

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  2. Sabes que também sou como tu, adoro dramalhões, e livro que me faça chorar sobe logo uns pontinhos, mas sou mais mariquinhas do que tu, não salto de tão alto! Combinar violência doméstica e perda de um filho numa mesma obra acho que passa para lá do meu limite de resistência.
    Paula

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    1. Pois... são precisas umas doses substanciais de anestesia para suportar tanta dor e tanta violência. Busco tanto a dor que de vez em quando a encontro em doses industriais, mas esta obra não a espreme em demasia, sentes o punhal espetado no peito, mas há partes que fazem com que o aperto relaxe. Não te tira o chão, como o faz a Mazzantini, por exemplo.

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