Milagrário pessoal, de José Eduardo Agualusa

Quinta-feira, 07 de fevereiro de 2013




Sinopse
Iara, jovem linguista portuguesa, faz uma incrível descoberta: alguém, ou alguma coisa, está a subverter a nossa língua, a nível global, de forma insidiosa, porém avassaladora e irremediável. Maravilhada, perplexa e assustada, a jovem procura a ajuda de um professor, um velho anarquista angolano, com um passado sombrio, e os dois partem em busca de uma coleção de misteriosas palavras, que, a acreditar num documento do século XVII, teriam sido roubadas à "língua dos pássaros". Milagrário Pessoal é um romance de amor e, ao mesmo tempo, uma viagem através da história da língua portuguesa, das suas origens à atualidade, percorrendo os diferentes territórios aos quais a mesma se vem afeiçoando.

Opinião
Estou oficialmente, de corpo e alma, rendida à escrita de Agualusa! Adorei este romance, a forma como o narrador, um velho anarquista angolano, fala com paixão da nossa língua, da evolução que ela sofre todos os dias, dos livros, e nos dá a conhecer momentos da História de Angola, do Brasil e da vida de ilustres como Camilo Castelo Branco ou de personagens anónimas, fictícias, mas emocionantes e que deixaram rendida! AMEI!
Considero que o que mais me fascinou neste pequeno romance foi o facto de centrar a sua narrativa na história e na evolução que a nossa belíssima língua tem vindo a sofrer todos os dias, desde que se formou como tal. Como fervorosa defensora da nossa língua materna e entusiasta de aprender mais sobre ela, não poderia deixar passar ao lado esta obra (como é que a deixei “intacta” tanto tempo na estante?!), porque o seu apelo, as suas palavras, variadíssimas passagens que assinalei são fantásticos e deixam-me ainda mais orgulhosa de ser portuguesa e falante desta extraordinária língua!

Transcrevo aqui algumas dessas passagens que sublinhei:

Assim como criamos as línguas, também as línguas nos criam a nós. Mesmo que não o façamos de forma deliberada, todos tendemos a selecionar palavras que utilizamos com maior frequência, e esse uso forma-nos ou deforma-nos, no corpo e no espírito.”

“(...) não custa atribuir a obstinada melancolia dos portugueses ao uso desregrado da palavra saudade, no fado, na poesia, no discurso dos filósofos e dos políticos. Seria interessante estudar o quanto o culto à saudade contrariou, vem contrariando, o esforço para desenvolver Portugal. Já a famosa arrogância e optimismo dos angolanos poderia dever-se à insistência em termos como bué («Angola kuia bué!»), futuro, esperança ou vitória. No que respeita à alegria dos brasileiros, poderíamos talvez imputá-la a duas ou três palavras fortes que acompanham desde há muito a construção e o crescimento do país: mulato/mulata, bunda, carnaval.”

“Esta noite sonhei com um verso de Sophia. Sonhei que o tinha escrito eu. Fiquei tão feliz que continuei a sorrir mesmo depois de acordar. “O senhor professor parece que viu Deus em toda a sua glória”, disse-me Gina enquanto me servia o café. Ter sido Sophia durante alguns segundos não anda muito longe, parece-me, da glória de ver Deus.”


“Aprendi há muito tempo que uma mulher bonita não se distingue de uma bomba – no meu tempo, aliás, eram sinónimos – a não ser pela natureza do impacto.”

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