Segunda-feira, 10 de agosto de 2015
Opinião
Vim de férias com a família para
redescobrir mais uns cantinhos de Portugal e na bagagem trouxe quatro livros J, três em língua castelhana e um (de
um autor castelhano – Javier Marías) mas que felizmente já vem sendo traduzido
para português há algum tempo.
Os três livros castelhanos são de
autores de língua também ela castelhana e o que acabei de ler há algumas horas
é de tal forma precioso que tentei controlar a velocidade com que o li J Mesmo assim, não me refreei o
suficiente porque saboreei as suas 144 páginas em apenas três dias!...
Blanca
vuela mañana
foi escrito por Dulce Chacón, uma autora que me foi apresentada pela minha
querida Nancy, mas que a morte nos roubou demasiado cedo. Li-a pela primeira
vez com a sua obra mais conhecida, La
voz dormida, que aborda a apaixonante Guerra Civil espanhola na
perspetiva de um punhado de mulheres destemidas, inesquecíveis e que deixam no
leitor (e em mim em particular) uma marca profunda, que não se extingue
facilmente.
A narrativa, as personagens de Blanca vuela mañana e o estilo
intimista, sensível e intensamente conhecedor da alma feminina de Dulce Chacón
também permanecerão comigo por muito tempo, tal como me fizeram companhia, há
uns anos atrás, as valentes mulheres protagonistas de La voz dormida. São duas histórias distintas, duas épocas
distintas e protagonistas com uma bagagem de vivências também elas distintas.
Mas são duas obras que nos deliciam, que nos tocam daquela maneira muito
especial e que, ao mesmo tempo, nos apetece partilhar e guardar só para nós como um tesouro precioso.
“Hay
amores que se mantienen de los réditos, de los intereses de un tiempo feliz que
alimentan el deseo de recuperarlo. Es entonces cuando el amor no se vive: se
padece, pensaba Blanca.” (pág. 69)
Este fragmento que aqui transcrevo
reflete na perfeição o drama amoroso que assola a vida de Blanca – a sua
relação com Peter sobrevive a duras penas, já que onde devia imperar o amor e a
cumplicidade imperam momentos de um silêncio tenso e incómodo e discussões
amargas. Blanca tem plena consciência de que é uma relação que não tem futuro,
mas também sabe que, enquanto continuar a temer a solidão, irá agarrar-se a ela
como um condenado à morte se agarra a qualquer réstia de esperança.
Em pleno contraste com esta relação
temos a de Ulrike e de Heiner, dois alemães que tardiamente encontraram o amor.
Mas que encontraram um tipo de amor que traz a ansiada plenitude e que ofusca
os demais, sobretudo aqueles que sobrevivem através de recordações e do desejo
de recuperar um tempo feliz que não voltará.
Contudo, Blanca vuela mañana não é apenas a história de duas
histórias de amor. Oferece-nos igualmente momentos de cumplicidade e ternura
entre mãe e filhos, entre irmãs, bem como passagens que demonstram o quanto a
Segunda Guerra Mundial foi determinante para a vida e a moldagem da
personalidade de algumas das personagens de nacionalidade alemã. É ainda uma
obra com capítulos muito curtinhos, com uma linguagem pautada de frases também
elas curtinhas e de apontamentos deliciosamente poéticos que me “obrigaram” a
estar sempre com o lápis por perto para sublinhar inúmeras passagens que me
conquistaram.
Sendo assim, só posso recomendar
esta leitura e esperar com muita impaciência uma nova ida a Espanha para
comprar as outras obras que compõem La
trilogía de la huida da qual Blanca
vuela mañana faz parte – Algún
amor que no mate e Háblame
musa, de aquel varón.
Por fim, refiro que não dou nota
máxima a esta leitura porque 144 páginas são algo insuficientes (é como se nos
tirassem o doce da boca quando estávamos a lambuzar-nos de deleite) e porque o
seu final me deixou um pouquinho frustrada…
NOTA – 09/10
Sinopse
Blanca busca el amor, pero huye de él. Anhela encontrar
en su relación con Peter algo que no la destruya, que no le obligue a renunciar
a sí misma. Envidia el amor verdadero de Ulrike y Heiner, al que cree capaz de
sobrevivir a la muerte, pero construye una pasión falsa en su propia pareja,
dejándose engañar por los recuerdos. Blanca huye, luchando contra sus razones y
deseos; teme la soledad, pero no hace sino caminar a su encuentro.
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