Sexta-feira, 21 de agosto de 2015
Opinião
Tal como no ano passado, a minha
Almudena Grandes deixou a sua marca no meu mês de agosto, colorindo alguns dias
das minhas férias com uma história poderosa e intensa. Não tão estupendamente
fantástica como a de Las tres bodas de
Manolita, mas, mesmo assim, uma narrativa que me proporcionou muito
bons momentos, com personagens muito bem construídas (bem ao estilo da autora)
e com um emaranhado de histórias dentro da história principal, que nos permite
saltar repentinamente do presente para o passado e ir conhecendo a forma de
pensar e todo o mundo interior das personagens principais.
Te
llamaré viernes
é uma das obras dos primórdios da carreira de Almudena e tem determinadas
características que apontam para tal – oferece-nos uma história densa, de
leitura nada fácil, com permanentes e recorrentes saltos no tempo, com uma
escrita carregada, onde imperam uma linguagem de adjetivos, de divagações, de
pensamentos, recordações, devaneios e, não menos importante, descrições pouco
pudicas e, como já ouvi alguém dizer, algo pornográficas J Mas não se fica por aqui, pelo
contrário. É, como qualquer obra desta magnífica autora espanhola, seja de anos
mais passados ou mais recente, um romance que nos cativa, que nos derrete e que
nos comove desde as suas páginas iniciais (onde, por exemplo, Benito, o
protagonista, recorda uma passagem banal e ao mesmo tempo fundamental da sua
infância e que nos faz compreender de imediato a ligação umbilical que existia
entre ele e a mãe) até às que encerram a narrativa e nos abrem o coração e nos
levam a estender uma mão carinhosa a Manuela.
Benito e Manuela são as personagens
principais de uma história que se desenrola numa Madrid onde ainda circulam as
pesetas. São duas almas solitárias que deambulam pelas ruas da capital
espanhola, sem qualquer objetivo concreto, fechadas cada uma no seu mundo
cinzento, cheio de inseguranças, desilusões constantes e sonhos patéticos.
Nenhum dos dois foi tão pouco agraciado fisicamente. Ele é enfezado, feio e tem
o osso do peito muito saliente. Ela é gorda, dona de um rosto com feições pouco
atrativas e revela pouco gosto na forma de vestir-se. Encontram-se casualmente,
mas a sua história nada terá de vulgar nem de bonito.
Benito, homem perto dos quarenta,
que sempre sofreu com o amor que dedicou às mulheres da sua vida, que apenas
conheceu o fracasso, a desilusão, o desengano, o desamor, continua no entanto
em busca da sua princesa, da sua história de encantar, mas fá-lo de uma forma
patética e desoladora, acreditando que pode ter o seu final feliz com uma
adolescente, filha da porteira de um prédio vizinho, com mulheres anónimas que
respondem a anúncios que põe em revistas cor-de-rosa ou com Teresa, uma antiga
paixão. Quando tropeça em Manuela, sente crescer em si dois sentimentos
antagónicos – por um lado, sente repulsa perante o seu aspeto físico, por outro
não resiste à sua espontaneidade, à sua rudeza de jovem nascida num meio rural
e sobretudo ao seu poder encantatório de contar fábulas e contos de fada. E
será assim dividido que Benito inicia uma relação de amor-repulsa, de
poder-servidão com a sua Manuela, a quem ocasionalmente chamará de “Viernes”,
transformando-se ele em Robinson Crusoe, perdido numa Madrid habitada por
milhões de habitantes, amo e senhor de alguém que parece não pertencer àquele
mundo urbano e cosmopolita, que se submete às normas do seu senhor, que possui
uma inocência que nos desarma e que devagarinho vai ganhando o seu espaço no
coração empedernido e dorido de Benito.
Para além de Benito e Manuela, Te llamaré Viernes está povoado
de outras personagens sofridas, nada abonadas fisicamente, pouco carismáticas,
mas que, com as suas vidas tristes, patéticas, dececionantes, nos tocam e
ganham a nossa ternura. É impossível ficar indiferente à mágoa, ressentimento e
saudades de momentos mágicos que caracterizam a relação de Benito com a sua
mãe, à simplicidade saloia de Manuela, à intelectualidade e inteligência que
Polibio “desperdiça” atrás de um balcão de um bar decrépito ou à vida perdida
de Paquita. Por tudo isto e porque Almudena é genial na construção de histórias
densas, carregadas de sentimentos e de realidades, rotinas e sonhos que se
acercam aos do nosso dia-a-dia, tenho que dizer que Te llamaré viernes é uma
obra marcante e que deixará saudades. Pode não ser a obra de Almudena que mais
me tenha agradado, mas vale a pena, ai isso vale J
NOTA – 08/10
Sinopse
¿Cómo condensar en pocas líneas toda la complejidad
de esta difícil historia de amor, que genera a su vez tantas otras que nos
hacen pensar y sentir la abrumadora soledad en la que intentan sobrevivir estos
personajes feos y huraños, crecidos en el desamor, conmovedores en medio de
tanta dureza y tanta ternura? En un Madrid sin alma, Benito ata los cabos de su
accidentada existencia gris, hecha para estrellarse una y otra vez «con la
miseria del héroe», hasta el día en que, cual un nuevo y desesperado Robinson
urbano, encuentra a su Viernes en Manuela, con quien la Naturaleza no fue
benigna pero a quien sí dotó del extraordinario don de fabular. Consuelan su
tortuoso y tenue deseo de vida y amor el recuerdo insistente de las chinelas
azul celeste de una madre infiel y los delirios filosóficos de Polibio,
intelectual venido a menos, dueño del bar más cutre de la ciudad. A su
alrededor, los demás, el jodido mundo que es como una isla desierta cuando no
hay un maldito Viernes que te cuente un cuento.
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