História de quem vai e de quem fica, de Elena Ferrante


Ficha técnica
Título – História de quem vai e de quem fica
Autora – Elena Ferrante
Coleção – Tetralogia de Nápoles – terceiro volume
Editora – Relógio D’Água Editores
Páginas – 325
Datas de leitura – de 05 a 11 de fevereiro de 2016


Opinião
“… continuava a ser uma subalterna dela [de Lila]. Senti que nunca conseguiria libertar-me dessa subalternidade, o que me pareceu insuportável. (…)
Desde então, durante anos, não voltámos a ver-nos, falámos só por telefone. Tornámo-nos, uma para a outra, fragmentos de voz, sem nenhum controlo do olhar. Mas o desejo de que ela morresse ficou escondido a um canto, enxotava-o, mas ele não se ia embora.” (págs. 174/5)

Eu queria vir a ser, embora nunca tivesse sabido o quê. E viera a ser, isso era verdade, mas sem um objetivo, sem uma verdadeira paixão, sem uma ambição determinada. Quisera vir a ser qualquer coisa – é essa a questão – só porque receava que Lila viesse a ser sabe-se lá o quem e eu lhe ficasse atrás. O meu vir a ser era vir a ser na esteira dela. Tinha de querer de novo vir a ser, mas por mim, como adulta, apartada dela.” (pág. 267)

Elena, a Lenú gordinha, estudiosa, calada, filha de um bairro pobre napolitano é agora uma mulher adulta e bem-sucedida. Com um diploma na mão, um romance publicado, um noivo proveniente de uma família abastada e respeitada nos círculos culturais, a amiga de Lina/Lila triunfou, tal como tanto almejava. Obteve aquilo por que tanto lutou.
Contudo, tal como é bem patente pelos excertos com que abri a opinião, essa ambição, esse querer vir a ser alguém foram visceralmente movidos por um instinto apenas – ser melhor do que Lina, suplantá-la, enxotar a sua sombra asfixiante e mostrar-lhe que esse doentio fio umbilical que as unia podia ser quebrado.
No início deste terceiro volume, Lina vive em condições muito precárias. Abandonou o seu bairro de sempre, abandonou o marido, levando o filho consigo, mas fê-lo na companhia de Enzo, que não hesitou em acompanhá-la. Os três vivem num apartamento miserável e Lina vê-se obrigada a trabalhar arduamente numa fábrica de enchidos pertencente a Bruno Soccavo, um jovem que havia conhecido durante as férias que passara em Ischia. Os seus dias são passados em condições horríveis, mal tem tempo para dedicar-se ao filho (que já é o menino doce e bem-comportado de antes) e à noite, derreada pelo cansaço, senta-se ao lado de Enzo e ajuda-o com os seus estudos. É aí que a faísca volta momentaneamente a acender-se, mas não é suficiente para abafar uma existência amarga, dura e sem perspetivas.
Por seu lado, Lenú vive a vida que sempre almejou. O seu romance é bem-sucedido, o que a leva a saltitar por ambientes culturais, fervilhantes de ideias, ideais e projetos entusiasmantes e travar conhecimento com homens e mulheres que estão na vanguarda literária, política e intelectual do país.
Sendo assim, as duas amigas vivem vidas completamente opostas, cujos caminhos só se voltam a cruzar quando Enzo contacta Lena e lhe pede que ajude Lina. E é aí que furtivamente os dados rolam. E o rumo da história das duas se inverte. E a amálgama de sentimentos que as une retorna. E volta a assustar-nos. E a entranhar-se em nós, como algo repulsivo, que queremos a toda a força escorraçar, mas que simultaneamente nos atrai.
Já afirmei e repito-o mais uma vez – a trama, as personagens, a contextualização espacial e temporal desta tetralogia é dolorosa, é crua, é, por que não, repulsiva, nada nem ninguém escapa à mordacidade da autora. Mas é vibrantemente real e, como tal, não há como escapar à leitura dos volumes que compõem a tetralogia de Nápoles. Este que acabo de ler é genial como os outros, a irmandade não se rompe, o interesse não esmorece e cria tantas ou mais expetativas como os seus antecessores. Contudo, não me arrebatou como o segundo – História do novo nome (ver opinião completa aqui) – talvez porque (e quem leu os três entenderá) este centra-se mais em Lina, por quem tendencialmente sinto mais afinidades, enquanto História de quem vai e de quem fica narra com mais pormenor a vida adulta de Lena e oferece-nos a sua perspetiva dos acontecimentos.
Não quero terminar esta opinião sem referir que no meio de tantas personagens “defeituosas”, destaco Enzo Scanno, homem íntegro, sisudo, trabalhador, dedicado e que, apesar de não ter tanto protagonismo, ganhou um lugar especial no meu cantinho de personagens cativantes e que espero consiga o seu quinhão de felicidade e justiça no quarto e último volume, que entretanto já foi publicado e se encontra nas livrarias. Maridinho, de que estás à espera? Há que trazê-lo para a nossa estante J

NOTA – 09/10

Sinopse
Elena e Lila, as duas amigas que os leitores já conhecem de A Amiga Genial e História do Novo Nome, tornaram-se mulheres. E isso aconteceu muito depressa.

Navegam agora ao ritmo agitado a que Elena Ferrante nos habituou, no mar alto dos anos 70, num cenário de esperança e incerteza, tensões e desafios até então impensáveis, unidas sempre com um vínculo fortíssimo, ambivalente, umas vezes subterrâneo, outras visível, com episódios violentos e reencontros que abrem perspetivas inesperadas.

4 comentários:

  1. Sabe onde posso comprar a versao e-book? Obrigada

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  2. Olá e bem-vinda! Infelizmente, não consigo responder-lhe porque nunca li em formato e-book e, como tal, não sei onde se comprar nem como se usa.
    Beijinhos e volte sempre!

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  3. Olá
    Não acho em nenhuma livraria.Pode me ajudar? Gostaria desse e o vol 4.
    Obrigada
    Neuza

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    Respostas
    1. Olá! Acho que não a posso ajudar, já que vivo em Portugal...
      Mas envio o link de um site português que vende livros para o estrangeiro. Pode ser que vendam também para o Brasil!
      http://www.wook.pt/
      Beijinhos e volte sempre!

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