O
último mês do ano é sempre um mês esgotante e intenso a nível profissional e a
nível pessoal. Sinto-me constantemente atordoada pelo acumular de trabalho,
pelas listas de coisas a fazer que parecem não terminar nunca, por aquela
prenda que ainda falta comprar, pelo último detalhe para a ceia de Natal, pela
voz da consciência que me atormenta por não dedicar mais tempo aos meus, enfim,
por um turbilhão de afazeres e emoções que apenas começa a esvair-se após as
festividades natalícias.
Porém,
cada vez que sofro as agruras de meses tão penosos como dezembro ou, como referi
no balanço anterior, novembro, mais me refugio nas leituras e consigo, de forma
extraordinariamente contraditória, ler mais do que meio em meses mais
tranquilos. E este foi de novo prova disso, pois li sete obras, cinco “adultas”
e duas dirigidas ao público juvenil.
A
obra que iniciou dezembro é protagonizada por uma das personagens que mais me
apeteceu esbofetear nos últimos tempos. Que raça de homem convencido, emproado,
altivo e egocêntrico! Senti várias vezes vontade de abandonar a leitura, porque
tudo em mim se irritava e enfurecia perante tamanha sobranceria do
protagonista. Contudo, à medida que ia avançando na leitura, ia acalmando ao
ânimos, sobretudo porque ia entendendo por que razão a obra se intitula O últimos dos nossos e ia tirando
prazer e conhecimento de como os alemães foram resistindo ao estertor da
Segunda Grande Guerra; de que os cientistas que haviam estado por detrás da
invenção dos mísseis balísticos V2 foram e outros elementos do partido nazi
foram acolhidos pelos Estados Unidos logo após o final da guerra e de que os horrores
praticados em Auschwitz não se resumiram apenas ao envio massivo de judeus para
a morte nas câmaras de gás. Por tudo isto, considero que fiz bem em dar razão à
minha habitual resistência em abandonar leituras a meio e que a obra de
Adélaide de Clermont-Tonnerre abriu as portas para um mês de saborosas
leituras.
As
duas leituras que se seguiram vieram da biblioteca e às duas atribuí a nota
máxima. Como não atribuir o almejado dez a um conto do meu querido Saramago e a
uma obra que aponta o foco da Segunda Guerra Mundial para outros espaços que
não os recorrentemente abordados?
O conto da ilha
desconhecida lê
num sopro, mas aquilo que se retira das suas poucas páginas fica dentro de nós,
como um agasalho quentinho que nos conforta. Mordi as saudades de ti, Saramago,
apaziguei-as e propus-me reler-te mais vezes. E é o que farei em 2018!
Cidade de ladrões faz-nos recuar ao ano de 1941, quando
as tropas nazis cercaram a cidade de Estalinegrado e a apertaram durante quase
dois anos, levando a que os seus habitantes ou perecessem ou sobrevivessem em
condições atrozes. Dois desses habitantes são presos no mesmo dia e, se
quiserem recuperar a sua liberdade, terão que levar a cabo uma missão
impossível numa cidade cercada, constantemente bombardeada e que vive debaixo
de temperaturas geladas. Lev e Kolya não baixam os braços e percorrem as ruas
da sua cidade e espaços mais rurais em busca da resposta a essa missão e, no curto
espaço de tempo que têm para concretizá-la, deixam um rasto de conversas
inesquecíveis e hilariantes, de aventuras repletas de perigo, de artimanhas
fabulosas, de coragem misturada com medo e sobretudo de uma amizade que ninguém
conseguirá esquecer. David Benioff arquitetou uma obra sublime e é uma pena que
a mesma apenas possa ser adquirida em alfarrabistas ou encontrada como
bibliotecas, porque no mercado atual está esgotada…
A
quarta leitura resultou de mais uma parceria que tenho no blogue e foi extremamente
saborosa. Limões na madrugada
foi a segunda que li de Carla M. Soares e veio provar o quanto o estilo da
autora amadureceu se refinou. Inchei de orgulho ao comprovar que a narrativa
voltava a privilegiar espaços da Cidade Invicta (tal como havia acontecido com
a outra obra que li da autora – O
Cavalheiro Inglês), mas senti-me ainda mais satisfeita por estar
perante o testemunho de que se continua a escrever muito bem em português e que
Carla M. Soares está a ganhar por mérito próprio o seu lugar na literatura
nacional. A obra tem um toque muito feminino, mas extravasa-se para outros
campos – alia o lado mais íntimo, mais familiar, mais emotivo a acontecimentos
e ações muito reais e imperfeitas como todos nós somos.
As
três últimas leituras do mês e, consequentemente, do ano foram as menos
satisfatórias, mas ainda assim com ingredientes suficientes para entreter-me e facultar-me
momentos agradáveis.
Nove mil dias e uma
só noite, de
Jessica Brockmole tem a bonita particularidade de estar recheada de várias
trocas de cartas e de nos fazer sorrir e sonhar perante uma inesquecível
história de amor que ultrapassa barreiras geográficas, bélicas, temporais e
familiares.
Desnorte é uma coletânea de contos de Inês
Pedrosa e veio confirmar aquilo que já havia concluído aquando da leitura de Desamparo – um estilo limpo,
sereno, suave e que aborda dessa forma a realidade atual e o quanto as relações
e o que nos rodeia moldam o carácter das personagens e das pessoas.
A
sétima e última leitura foi partilhada com o meu filho. Foi consequência de
tarefa escola trazida para férias e não encantou nem a um nem a outro. Ao D.
foi muito difícil compreender as páginas iniciais de Missão Impossível e a mim, crédula por natureza e avessa a
narrativas com muita fantasia, foi sobretudo uma leitura sinónima de dever e
não de prazer. Mas, como referi, sou sempre parcial quando leio algo
fantasioso, pois, logo à partida, entro na narrativa desconfiada e pondo em
causa personagens, espaços ou ações que advenham do que não é real.
Dei-me
agora conta de que este balanço já está enorme. Por essa razão, vou fazer algo
que nunca fiz. Vou ficar por aqui e escrever outro texto, outro balanço onde
partilhe convosco que obras chegaram à estante em dezembro. Fica prometido que
o farei o mais breve possível.
Termino
deixando-vos os links para acederem à opinião completa das
obras lidas este mês:
E
vocês? Que leram para encerrar 2017? Fico à espera dos vossos comentários!
Assim não vale, pareces aquelas séries em que o episódio termina no momento de maior suspense!
ResponderEliminarEu acabei a ler algo que me desiludiu um pouco, não pela história que era bonita, mas pelo estilo muito seco, "As Nossas Almas na Noite" de Kent Haruf. É uma história muito curtinha sobre dois vizinhos velhotes, um viúvo e uma viúva, que decidem começar a passar as noites juntos para não estarem sós.
Paula
Ups... foi mesmo sem intenção! Para a próxima não o faço!
EliminarMal vi o título que mencionas, fui logo confirmar se o tinha na minha biblioteca municipal, mas infelizmente não o têm, porque parece bom, mesmo que o estilo seja seco. Terá que ficar registado no caderninho, pode ser que o encontre por aí!