Ficha técnica
Título – A
história de um casamento
Autor – Andrew Sean Greer
Editora – Civilização
Páginas – 202
Datas de leitura – 11 a 15 de julho de 2018
Opinião
“Julgamos conhecer aqueles que amamos e,
apesar de não devermos ficar surpreendidos por descobrirmos que não conhecemos,
isso não deixa de nos destroçar o coração. É o mais doloroso tipo de
conhecimento, não só acerca do outro, mas também de nós mesmos. Vermos as
nossas vidas como uma ficção que escrevemos e na qual acreditámos.” (pág.
47)
Esta
leitura teve vários sabores, mas aquele que mais se destacou e que ficou comigo
foi o de ter sido a primeira leitura em conjunto contigo, Paula, que estás
sempre desse lado. A experiência foi mesmo muito boa e tem que ser repetida,
por todas as razões, principalmente por causa dos nossos gostos em comum e do
desafiador que é constatarmos que, apesar de sermos “bookbuddies”, há obras que
nos tocam e agarram de forma diferente.
Esta
obra abre com uma frase que nunca mais largará o leitor e que se repetirá com
frequência – “Julgamos conhecer aqueles que amamos.” Em mim, teve o condão de
acionar todos os sentidos e levou-me a vê-la como um convite para uma leitura
introspetiva, daquelas que abriria portas para o lado mais íntimo, mais
escondido e mais nebuloso do ser humano. Não me enganei.
Não vai
ser fácil escrever esta opinião sem dar a conhecer demasiado da história que
compõe esta “história de um casamento”. Estamos em 1953, na cidade de São
Francisco, costa do Pacífico. Pearlie está casada com Holland, um homem mesmo
muito bonito, têm um filho e vivem numa casinha junto ao mar. Ele trabalha, ela
é dona de casa e todos os dias, sem exceção, ele dá-lhe um beijo antes de sair
de casa e outro quando regressa do trabalho enquanto Pearlie tenta protegê-lo
das amarguras e vicissitudes do mundo fazendo, com uma tesoura, censura às
notícias menos boas do jornal. Porém, ninguém poderá fazer o mesmo por ela
quando uma bomba, aparentemente inofensiva, aterra na soleira da sua porta.
Essa
bomba não só ameaça destruir os alicerces que sustentavam a rotina e o
equilíbrio da existência tranquila de Pearlie. Também traz consigo o elemento
vital para que a narrativa agite e nos faça agarrar-nos ainda mais a ela.
Aconteceu isso comigo, com a Paula e, calculo, com todos os leitores. Contudo,
e falando da minha experiência de leitura, esse abanão que a referida bomba
provocou no ritmo da narrativa não foi complementado com aquilo que sempre
quero encontrar numa obra – personagens com as quais crio laços, personagens
que mexem comigo, que me fazem adorá-las, detestá-las, sentir raiva, piedade, ternura,
dor, enfim, personagens que são o suporte vital da trama, que a fazem avançar
ou recuar, que lhe dão a cor necessária para que a leitura seja memorável.
Não fui
capaz de criar laços significativos com nenhuma das personagens, nem mesmo com
Pearlie, a protagonista. Achei que ela se rendeu demasiado cedo, que não lutou
pelo que era seu, por tudo aquilo que sempre quis que fosse seu. Baixou os
braços, permitiu-se acreditar nas palavras de um desconhecido e deixou que este
a manobrasse a ela e aos outros a seu bel-prazer. É certo que Pearlie é uma
mulher algo sofrida, muito consciente da sua “diminuta” importância numa
sociedade envolvida numa caça às bruxas sem precedentes, onde impera a
hipocrisia e uma busca implacável que recorda os tempos da Inquisição. Mas,
mesmo assim, eu (e reitero, eu) precisava que ela tivesse mais amor-próprio,
mais atitude, mais orgulho.
Lendo
aquilo que escrevi até ao momento, pode parecer que ler A história de um casamento foi uma experiência algo dececionante.
Mas não o foi. A escrita e o estilo do autor são francamente bons, fartei-me de
sublinhar, destacar passagens com as quais me identifiquei e a contextualização
histórica revela conhecimentos notáveis de uma época recém-saída de um conflito
mundial e que pareceu nada retirar da loucura e megalomania que estiveram por
detrás da Segunda Grande Guerra. O autor conseguiu ainda fazer-me sentir em São
Francisco, visualizar os espaços desta cidade icónica e sentir muito de perto a
segregação racial, política, social e ideológica. Todos estes elementos engrandeceram
a narrativa, tornaram-na mais rica, mas não impediram que eu a sentisse algo
incompleta, pois as personagens não estiveram à altura dessa riqueza
estilística e epocal. Não me agradou a sensação que nunca me abandonou e que sempre
me sussurrava que Pearlie, Holland, Buzz ou Alice eram um acessório ao enredo,
que a sua presença no desenrolar da história serviu “apenas” para dar
visibilidade aos temas que o autor queria abordar. Não sei se me estou a explicar
da melhor forma, também não sei se concordas comigo, Paula, (talvez não), mas é
essa primazia dada aos temas em detrimento das personagens que, ainda agora, ao
escrever este texto, me impossibilita dar a esta leitura uma nota superior a um
8.
Remato
a opinião regressando ao que disse no início. O sabor mais doce desta leitura
foi o facto de ter sido feita em conjunto e de ter dado o tiro de partida para
uma experiência que repetiremos com frequência, não é assim, Paula? Acrescento
ainda que esta história, que, como diz o autor, não é apenas de um casamento,
poderá não agradar da mesma forma a todos (basta ver o que aconteceu com a
leitura em conjunto), mas merece que aqueles que gostam de uma escrita
maravilhosamente apurada e de uma contextualização muito cuidada peguem nela e
a conheçam.
Esta
foi a quinta leitura para a maratona literária – Bookbingo – Leituras ao sol 2 – e encaixa na categoria – Livro cujo título tenha as letras que
componham a palavra MAR.
NOTA –
08/10
Sinopse
“Julgamos conhecer aqueles que
amamos.”
É assim que Pearlie Cook inicia a sua exploração indirecta e devastadora do mistério que está no centro de todos os relacionamentos: como é que alguma vez poderemos conhecer verdadeiramente outra pessoa?
É assim que Pearlie Cook inicia a sua exploração indirecta e devastadora do mistério que está no centro de todos os relacionamentos: como é que alguma vez poderemos conhecer verdadeiramente outra pessoa?
Estamos em 1953 e Pearlie, uma
dona de casa dedicada, vive no Sunset District, em São Francisco, tratando não
apenas do marido de saúde frágil, mas também do filho, que sofre de
poliomielite. Então, num sábado de manhã, um estranho aparece à sua porta e
tudo muda. Todas as certezas com as quais Pearlie sempre viveu são postas em
causa enquanto luta por compreender o mundo à sua volta, especialmente o
marido, Holland.
A História de Um Casamento
retrata três pessoas encurraladas nas limitações da sua época, bem como as
medidas desesperadas que estão prontas a tomar para escaparem.
Olá Ana.
ResponderEliminarNão conheço o livro, nem o autor. A premissa parece interessante. E tenho muita curiosidade com a cidade de São Francisco, por isso um dia talve lhe dê uma hipótese.
Um beijinho e boas leituras
Se puderes, lê-o, pode ser que te preencha mais do que me fez a mim!
EliminarBeijinhos e bom fim de semana!
E não é que me surpreendeste mesmo? Porque consegues contornar o grande segredo, e todos as outras surpresas que recheiam esta obra também, porque isto é um livro cheio de "plot twists", como dizem os estrangeiros.
ResponderEliminarComo eu te disse, a única falha, mínima, que lhe apontaria é ser ambicioso de mais nos temas abordados, parecendo quase que queria pôr todas as controvérsias e hipocrisias em tão poucas páginas. Daí que compreenda que aches as personagens talvez mais simbólicas do que de carne e osso e não te tenhas prendido a elas.
Eu dar-lhe-ia um 10, mas 8 para mim é excelente. Quem me dera que todas as minhas leituras fossem assim!
Espero que seja a primeira de muitas leituras em conjunto, desde que não sejam sobre o Holocausto, claro. Sorry!!!! E agradeço-te por teres pegado neste livro agora, porque de outra forma talvez só chegasse a ele daqui a muitos anos. E o desperdício que isso seria para mim!
E lá vou eu à procura de mais Andrew Sean Greer!
Paula
:) Obrigada, como sempre tentei não desvendar demasiado, porque não quero tirar o prazer da descoberta a ninguém!
EliminarFico mesmo feliz por ter-te "proporcionado" uma leitura de 10! Venham mais e que possamos fazê-las em conjunto! Já sei que vais procurar mais livros do autor e peço-te que me digas quais são!
Quando despachar o Holocausto, digo-te! Don't worry!
Chamámos ambas Green ao senhor que é Greer?!
ResponderEliminarPaula
"Balha-nos", ou melhor "Balha-me"! Já emendei o erro "escandaloso"! Thanks :)
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