Segunda-feira, 22 de junho de 2015
Opinião
Manuel Rivas é um
escritor galego cuja obra “¿Qué me
quieres amor?” já me faz companhia desde que comecei a dar aulas de
espanhol, desde que tive o privilégio de partilhar com os meus alunos o filme “La lengua de las mariposas”, cujo
argumento é uma extraordinária e tocante adaptação dos vários contos que
compõem a referida obra.
A beleza e intensidade
dramática do filme não deixam ninguém indiferente e a emoção que sempre sinto
quando assisto ao desabrochar da maravilhosa amizade entre Moncho e Don
Gregorio impulsionaram-me a saber mais sobre Manuel Rivas e as obras que já
publicou e consequentemente a comprar uma delas.
Comprei El Lápiz del Carpintero numa das
frequentes viagens que faço à Galiza. Achei que fazia todo o sentido, sendo
Manuel Rivas galego, comprar algo escrito por ele na sua comunidade natal J
“He aprendido
más de la guerra civil española leyendo El Lápiz del Carpintero, de
Manuel Rivas, que en todos los libros de Historia.”
Günter
Grass
O tema central da obra
é realmente a guerra civil. Mais uma vez este conflito põe de um lado os ditos
“rojos”, defensores da segunda república espanhola, e do outro os que se
afiguram como representantes da máquina ditatorial encabeçada por “El
Caudillo”. Voltamos a entrar em alguns estabelecimentos prisionais onde os
inimigos do “Generalísimo” e de uma Espanha devota e católica esperam por uma
morte certa ou por uma vida inteira atrás das grades. Voltamos a contactar com
guardas que tudo escutam, que se movimentam como sombras, que sentem prazer em
torturar e matar homens com quem possivelmente conviveram em crianças ou em
outras idades. Voltamos a contactar com homens que, por defenderem ideologias
que não vão ao encontro das dos que têm armas mais poderosas, se veem
confinados atrás das grades, tentando não perder a autoestima, a dignidade, o
brio, aquilo que os diferenciam dos simples animais.
Herbal é um desses
guardas. Homem simples, quase analfabeto, proveniente de uma família de poucas
posses vê-se, com a vitória do general Franco, numa posição de poder que lhe
possibilita vigiar, espiar, atemorizar, torturar e inclusive matar quem está do
outro lado das grades. Fá-lo com Francisco Miguel, “El pintor” e com o doutor
Daniel Da Barca. Ao primeiro, mata-o num dos muito frequentes fuzilamentos que
caracterizaram o pós-guerra. Ao segundo, espia e vigia não só porque Da Barca é
considerado um inimigo muito perigoso mas também porque é aquele por quem
Marisa Mallo se perdeu de amores, aquele por quem a mulher que Herbal ama desde
sempre está decidida a esperar, passe ele o tempo que passe na prisão.
Francisco Miguel e
Daniel Da Barca são dois desses “rojos” que, por defenderem as suas ideologias
políticas, caíram nas mãos de guardas como Herbal e perderam a vida ou muitos
anos de vida atrás de grades. “El pintor” tem um desenlace trágico, mas deixa
para trás um lápis de carpinteiro que sempre mantinha preso na orelha. Um lápis
de carpinteiro que passará a ser usado por Herbal. Um lápis de carpinteiro que
todas as vezes que esteja preso na orelha do guarda lhe possibilitará “conversar”
com “el pintor” e travará os ataques de ansiedade que o acometem
frequentemente. Um lápis de carpinteiro que simboliza o seu lado mais humano, a
sua consciência. Um lápis de carpinteiro que Herbal manterá anos e anos até que
“el pintor” ou a sua consciência ou o seu lado mais humano o aconselham a
oferecer a alguém mais jovem e carente de uma vida melhor.
El
lápiz del carpintero
é também a história de um grande amor. Um amor que sobrevive a dias infinitos
de separação, de vidas sofridas, de obstáculos quase intransponíveis e que apenas
perece quando a morte vem e leva um dos seus protagonistas. É ainda um hino à
Galiza, ao seu tempo húmido, chuvoso, ao seu idioma, aos seus mitos e superstições
e ao seu acercamento ao norte do nosso país, a uma zona com características tão
similares às suas e da qual apenas está separada por uma fronteira meramente política.
Por fim, El lápiz del carpintero é uma
obra que me encantou em fragmentos de grande beleza literária e ao mesmo tempo
me dececionou um pouco noutros. Os constantes diálogos entre Herbal e a voz
fantasma de “El pintor” buliram com o meu lado cético e considero que o
capítulo inicial parece estar desajustado em relação aos restantes já que
apenas serviu para contextualizar a grande analepse que suporta a trama da obra
e nada mais, ou seja, o jornalista que vai entrevistar Daniel Da Barca nas
primeiras páginas apenas será mencionado novamente no final da obra, de forma
muito vaga e sem alusão alguma à referida entrevista.
É assim uma obra que
recomendo, mas que não recomendo como aquela que mais ensine sobre a guerra
civil espanhola. As de Almudena Grandes são muito mais didáticas e prendem-nos
por esses motivos e muitos mais J
Termino esta opinião
da mesma maneira que a comecei – com o trailer (em inglês...) desse filme magnífico que é La lengua de las mariposas e que
me faz querer ainda ler a obra de Manuel Rivas da qual se adaptou o seu
argumento J
NOTA – 08/10
Sinopse
En la
cárcel de Santiago de Compostela, en plena Guerra Civil, un pintor dibuja el
Pórtico de la Gloria con un lápiz de carpintero, reflejando los rostros... y
aún más, la desesperación de sus compañeros de presidio. Un guardián su futuro
asesino., lo observa todo. A partir de esta escena, el Lápiz de Manuel Rivas
hilvana una historia donde el amor logra vencer a la desesperación.
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