Claraboia, de José Saramago

Segunda-feira, 18 de junho de 2012




Sinopse
A ação do romance localiza-se em Lisboa em meados do século XX. Num prédio existente numa zona popular não identificada de Lisboa vivem seis famílias: um sapateiro com a respetiva mulher e um caixeiro-viajante casado com uma galega e o respetivo filho - nos dois apartamentos do rés do chão; um empregado da tipografia de um jornal e a respetiva mulher e uma "mulher por conta" no 1º andar; uma família de quatro mulheres (duas irmãs e as duas filhas de uma delas) e, em frente, no 2º andar, um empregado de escritório a mulher e a respetiva filha no início da idade adulta.
O romance começa com uma conversa matinal entre o sapateiro do rés do chão, Silvestre, e a mulher, Mariana, sobre se lhes seria conveniente e útil alugar um quarto que têm livre para daí obter algum rendimento. A conversa decorre, o dia vai nascendo, a vida no prédio recomeça e o romance avança revelando ao leitor as vidas daquelas seis famílias da pequena burguesia lisboeta: os seus dramas pessoais e familiares, a estreiteza das suas vidas, as suas frustrações e pequenas misérias, materiais e morais.
O quarto do sapateiro acaba alugado a Abel Nogueira, personagem para o qual Saramago transpõe o seu debate - debate que 30 anos depois viria a ser o tema central do romance O Ano da Morte de Ricardo Reis - com Fernando Pessoa: Podemos manter-nos alheios ao mundo que nos rodeia? Não teremos o dever de intervir no mundo porque somos dele parte integrante?

Claraboia foi o primeiro e último livro póstumo (até ao momento) de Saramago e aquele que, segundo as suas palavras, “É uma história de um prédio com seis inquilinos sucessivamente envolvidos num enredo. Acho que o livro não está mal construído. Enfim, é um livro também ingénuo, mas que, tanto quanto me recordo, tem coisas que já têm que ver com o meu modo de ser”.

Lendo as primeiras frases, o que nos salta logo à vista é a diferença de estilo no que diz respeito à escrita – a pontuação, ou melhor dizendo, a ausência de sinais gráficos que indicam a presença de diálogo, marca inconfundível do estilo saramaguiano, ainda não havia surgido, tal como não a havíamos encontrado em Terra do Pecado. Mas se analisarmos todos os outros elementos, realmente temos que concordar com as palavras do autor transcritas acimas – a descrição dos espaços, a caracterização das personagens (sobretudo o que nos dá a conhecer da sua alma, dos pensamentos que vão partilhando com o leitor, das suas mágoas, segredos, esperanças, enfim, sobre a sua vida) e um narrador totalmente omnisciente que nos conduz pela narrativa e nos vai partilhando o que sabemos (nós os que “devoramos” e veneramos as obras do nosso genial Nobel) ser o que vai ao encontro do modo de ser e ver a vida de Saramago.

Não posso dizer que Claraboia tenha sido a obra que mais gostei de ler do meu querido Saramago (tal como não foi Terra do Pecado), mas tem passagens com as quais me identifiquei totalmente e que passo a transcrever:
 ”Aprendi a ver mais longe que a sola destes sapatos, aprendi que, por detrás desta vida desgraçada que os homens levam, há um grande ideal, uma grande esperança. Aprendi que a vida de cada um de nós deve ser orientada por essa esperança e por esse ideal. E que se há gente que não sente assim, é porque morreu antes de nascer”.

“Ter não é possuir. Pode ter-se aquilo que se não deseja. A posse é o ter e o desfrutar o que se tem.”

Como sempre, ler um romance de Saramago é uma experiência que deixa sempre marcas, que me faz, uma vez atrás da outra, sentir uma identificação única com aquele que, para mim, é o génio da nossa Literatura do século XX.

Saudades, meu Saramago!...

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