Por este mundo acima, de Patrícia Reis

Quinta-feira, 09 de março de 2012




Terminei o livro Por este mundo acima e, como sempre, dei comigo dividida por sentimentos contraditórios – qualquer livro de Patrícia Reis provoca-me uma vontade louca de o devorar e, por outro lado, sinto que tenho que saboreá-lo, lê-lo devagarinho, acariciar as suas páginas… E este que terminei não foi exceção, pelo contrário, é maravilhoso, tem passagens belíssimas e é uma homenagem aos livros e ao quanto eles são essenciais na nossa vida!!!
Sublinhei várias partes e amei um poema que aparece para o final do livro – e é claro que vou transcrevê-lo, bem como algumas dessas partes sublinhadas:


I
Primeiro, pensei comprar-te um postal.
Desses lamechas que dizem volta depressa.
Depois lembrei-me de um amuleto,
para proteger contra a ausência.
Preferi embrulhar-te em palavras,
daquelas, que, às vezes, não param em casa,
mas se enfeitam fora, nos livros, para levar como merenda.
Talvez assim as frases possam ter agasalho e mimo.
Ou falar-te ao peito em sussurros.
Deixa que estas palavras te levem.
Mas não as deixes ao frio.
Eu sinto.

II
A comida não me vai saber a nada, já sabes.
Posso tentar caprichar,
fazer de conta que os vapores anunciam pitéu de estalo.
Mas não vai saber a nada.
Não tenho o teatro de nós a cozinha,
a encenação deliciosa de tachos e avental.
Por estes dias,
vou ensaiar de novo a tragédia do meu refugo emocional,
meu monólogo até ao osso, minha vida sem sal.

III
E agora, com quem me aborreço?
Como abraço essa tua mania de passear pela vida,
desajeitando os dias?
Deixaste as luzes acesas.
As migalhas no chão.
A camisola amarrotada.
A toalha fora do sítio.
As minhas noites em desalinho.
As horas, vadias.
Anda.
Tenho saudades de arrumar o teu mundo.


Os livros têm essa magia, fazem viver as coisas. O leitor percorre as mesmas estradas que ele seguiu, encara realidades, redescobre um sentido de humanidade.

Os livros têm música lá dentro, quanto mais os lemos mais entramos neles, colam-se à nossa pele e fazem da voz o que querem.


Amanhã ataco a biblioteca da minha avó. No outro dia, encarei-a com tanto carinho, que me apeteceu ficar gigante, ter braços longos e elásticos para a envolver, ser devorado pela estante.

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